Em análise sobre a edição esvaziada de grandes players em Lisboa, o colunista Marcus Rocha aborda o impacto do boicote a quem buscava investimentos e novidades – e a onipresença da AI no conteúdo. Na foto, o estande sustentável do Brasil.
[17.11.2023]
Por Marcus Rocha, gerente de Startups do Sebrae/SC e colunista do SC Inova, direto de Lisboa
O WebSummit 2023 Lisboa encerrou nesta semana em Lisboa sob o impacto das declarações do CEO Paddy Cosgrave sobre a guerra Israel-Hamas (leia mais aqui), que esquentou o clima e levou ao boicote das bigh techs e de grandes fundos – alguns até mais radicais, indicando que cancelariam negócios com parceiros que mantivessem presença no evento. Uma situação que não foi revertida nem com a troca de CEO no WebSummit, agora capitaneado pela executiva Katherine Maher.
Mas se faltaram as grandes corporações e os fundos, chamou atenção a quantidade de espaços de países e regiões no evento – destaque para o estande da Alemanha, que apresentou um lounge de startups muito grande, e com um palco próprio; além das comitivas árabes (Dubai e Qatar, que terá edição regional do evento em 2024). O Brasil, que tradicionalmente leva a maior delegação de estrangeiros, também foi bem, com um belo estande com pegada sustentável, construído com caixas de feira amarelas e uma declaração de que esses objetos seriam doados a feirantes de Portugal.
Sobre negócios, as startups brasileiras com as quais conversei disseram que a ausência dos grandes fundos foi bastante sentida durante o evento – poucas foram abordadas. Em comparação com anos anteriores, algumas relatavam ter conversado com até 10 diferentes fundos – neste ano, essa conexão mal chegava a 2 ou 3 fundos. Mas também houve outras oportunidades de negócios, me contaram os empreendedores. De qualquer maneira, é importante salientar a diferença entre gerar a oportunidade num WebSummit e outra é efetivamente fazer negócios internacionais. Esperamos que haja um follow-up nos próximos meses gerando resultados.
Uma empreendedora catarinese brilhou no palco do WebSummit 2023: Fabiele Nunes, fundadora da Startup Mundi foi palestrante e também mestre de cerimônias no palco Ventures. Ela falou sobre o impacto que soluções como game experience no engajamento e desenvolvimento de times inovadores.
“Um dos maiores desafios de inovação aberta nas grandes empresas é trazer esse mindset de empreendedorismo, de ESG, para dentro da cultura organizacional. E hoje, dentro do ambiente de ventures, o grande chamariz é a inteligência artificial, embora outras áreas como deep tech também estejam no radar dos investidores”, comentou a representante do ecossistema de SC.
IA ONIPRESENTE NOS DEBATES: DE SOLUÇÕES PARA O CLIMA ÀS RELAÇÕES PESSOAIS
Em termos de conteúdo, se todo o ano há um hype, o de 2023 sem dúvida foi o uso de inteligência artificial nas mais diversas aplicações. Especialmente nas relações pessoais. Alex Pasykov, CEO Taimi – app de relacionamentos LGBTQ+ – afirmou que hoje a principal questão é a segurança dos usuários das plataformas de encontros. Garantir que os perfis são reais, que não haja abusos e evitar golpes nessas plataformas são as prioridades das empresas do setor e dos algoritmos.
“É fundamental encontrar um equilíbrio entre a segurança das plataformas e a liberdade dos usuários, algo bastante difícil de se obter. Um ponto mais ou menos pacífico entre todas as plataformas é evitar censura prévia”, comentou, no painel Love, Sex and Robots: Dating in 2023. A inteligência artificial já está sendo utilizada para melhorar a qualidade dos matches, com base nas preferências e do histórico de uso de cada usuário. Outro ponto importante é a melhoria da usabilidade das plataformas, especialmente considerando os diferentes dispositivos disponíveis hoje e no futuro próximo.
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Há também o impacto na natureza. Em 2023, a recorrência de eventos climáticos extremos (como o que estamos vendo nesse momento, com diferentes consequências, em diversas partes do Brasil, só para usarmos um exemplo próximo) elevou a preocupação global com o futuro do clima. O desafio atual é alcançar operações “net zero” especialmente relacionadas à geração e consumo de energia. Este foi o ponto de partida de palestra da CSO da Microsoft, Melanie Nakagawa, que mostrou casos práticos de inovações sustentáveis, como tecnologias com IA que têm detectado vazamentos de água em cidades a partir de sensores acústicos e soluções que têm melhorado os sistemas de geração de energia, aumentando a eficiência em até 60% em alguns casos.
A agricultura também pode se beneficiar do uso de IA, para produzir alimentos com melhor uso do solo e menos defensivos. Softwares conectados a sensores, drones, câmeras e satélites podem ser utilizados para medir, predizer e otimizar a produção; acelerar soluções e empoderar a força de trabalho. A palestra, porém, acabou tendo um foco excessivo nas soluções da Microsoft (o famoso “jabá”, na gíria brasileira).
Já outros temas que apareciam bastante em outras edições, como metaverso, blockchain e crypto praticamente sumiram dos grandes debates. Essas tecnologias hoje aparecem mais incorporadas no dia a dia e, se forem somadas ao uso de AI, podem trazer novas revoluções. O metaverso mesmo parece uma página virada.
Em resumo, dada a tendência global de menos dinheiro disponível para capital de risco, juros altos e outras ameaças macroeconômicas, resta saber se as big techs e os grandes fundos vão voltar ou não ao evento em 2024 e se essa lacuna não vai prejudicar de maneira significativa o impacto do WebSummit no mercado global de tecnologia e inovação. É ver, e vir, para conferir.
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