[OPINIÃO] Como avaliar a maturidade e a competitividade para desenvolver Ecossistemas de Inovação

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[OPINIÃO] Como avaliar a maturidade e a competitividade para desenvolver Ecossistemas de Inovação

A partir de três metodologias diferentes, é possível entender os pontos-chave para que ambientes inovem e gerem oportunidades de negócio

A partir de três metodologias diferentes, é possível entender os pontos-chave para que ambientes sejam efetivamente inovadores e gerem oportunidades – e conexões – para criação de novos negócios. / Foto:  Afif Ramdhasuma (Unsplash


[06.06.2023]

Por Marcus Rocha, especialista em Ecossistemas e Habitats de Inovação e Gerente de Inovação e Startups do Sebrae/SC. Escreve quinzenalmente sobre o tema no SC Inova. 

Recentemente foi publicada a edição de 2023 do “Global Startup Ecosystem Index da StartupBlink, que analisou e elaborou um ranking considerando 1.000 cidades de 100 países diferentes. Como este, há outros estudos, índices e rankings que orbitam o assunto da competitividade entre os territórios que promovem o empreendedorismo inovador, com destaque para o Startup Genome, cuja edição de 2023 do “Global Startup Ecosystem Report será lançada no próximo dia 15 de Junho.

Importante destacar que esses estudos consideram um enfoque específico das dinâmicas do ambiente e dos atores de cada local no estímulo ao desenvolvimento de startups, que são um tipo específico de empreendimentos inovadores, conforme já foi abordado nesta coluna, que possuem alto grau de inovação (e risco) junto a modelos de negócio altamente escaláveis.

Portanto, as startups são muito importantes para os ecossistemas locais de empreendedorismo inovador, ou ecossistema de iInovação, mas não são os únicos tipos de negócios baseados em inovação que existirão nos territórios. Outras empresas não tão inovadoras e com modelos de negócio não tão escaláveis também surgem quando há um bom ecossistema, e nem por isso deixam de ser menos importantes para o desenvolvimento local.

Uma questão comum levantada por lideranças dos ecossistemas, principalmente aqueles em fase de estruturação, diz respeito a quais são as frentes de trabalho que precisam ser priorizadas. Com o devido andamento desse esforço, também surge o questionamento sobre como avaliar se os trabalhos estão ou não sendo bem-sucedidos. Para ambos os casos, os métodos de avaliação de ecossistemas, sejam aqueles mais focados em startups ou outros mais abrangentes, são guias a serem observados.

Inicialmente, vale destacar um modelo brasileiro, desenvolvido pelo Sebrae em parceria com a Fundação CERTI, hoje presente em quase 200 municípios do país. A metodologia ELI (que significa “Ecossistemas Locais de Inovação”) é pautada em um mapeamento inicial dos atores do ecossistema, seguida da definição de setores tecnológicos estratégicos e da avaliação da maturidade do ecossistema, para então realizar dinâmicas de planejamento estratégico dos trabalhos a serem realizados e assim desenvolver um ambiente melhor para incentivar o empreendedorismo inovador. 

No que tange a avaliação da maturidade, a metodologia ELI considera 5 dimensões:

  • Ambientes de Inovação: considera como os ambientes de inovação presentes no território promovem a efetividade e integração de serviços tais como pré-incubadoras, incubadoras, aceleradoras, espaço maker, entre outros; 
  • Programas e Ações: expressa o grau de efetividade e integração do conjunto de programas e ações para a promoção da inovação realizados pelos integrantes do ecossistema de inovação que foram mapeados;
  • Instituições de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICTI): avalia o grau de atuação e de integração das instituições de ensino e pesquisa com os demais atores do ecossistema, e com foco nos setores tecnológicos estratégicos do território;
  • Políticas Públicas: considera a abrangência e a efetividade dos mecanismos que compõem as políticas públicas para o desenvolvimento do ecossistema de inovação;
  • Capital: avalia o conjunto das organizações que disponibilizam capital nos diversos estágios de desenvolvimento de empreendimentos inovadores, bem como o volume de capital disponível e que efetivamente foi aplicado;
  • Governança: contempla o nível de organização e integração da governança existente e sua capacidade de transformar estratégias em ações, com foco nos setores tecnológicos estratégicos e nos atores do ecossistema como um todo.
Ágora Tech Park, em Joinville, um dos centros de inovação do ecossistema catarinense. / Foto: Divulgação

Já o modelo proposto pela StartupBlink, com enfoque específico nas startups, trabalha com as seguintes dimensões:

  • Score de Quantidade: avalia o nível de atividade do ecossistema pelo total de startups com sede no território, de ambientes que incentivam o desenvolvimento de startups (coworkings, aceleradoras, incubadoras, etc.), de número de investidores, e de eventos realizados no local.
  • Score de Qualidade: a partir de bases de terceiros tais como Crunchbase, SEMrush e Brightdata, busca avaliar o grau de movimentação econômica gerada pelas startups desenvolvidas no território, por meio de indicadores como o total de investimento realizado em startups, quantidade de empregos gerados pelas startups, número de unicórnios, operações de compra ou fusão (M&A) de startups, presença de setores estratégicos ou centros de pesquisa de grandes empresas nacionais ou internacionais, eventos internacionais para startups promovidos, entre outros.
  • Ambiente de negócios para startups: considera a qualidade de fatores de base para o empreendedorismo inovador tais como infraestrutura, ambiente de negócios, barreiras regulatórias, a partir de indicadores relacionados à oferta e qualidade de conexão com a internet, investimentos em pesquisa e desenvolvimento, nível de proficiência em idiomas estrangeiros (inglês, principalmente), carga tributária, legislação trabalhista, qualidade das universidades, etc.

Por fim, o modelo do Startup Genome utiliza os seguintes critérios:

  • Desempenho do ecossistema: expressa o potencial de geração de valor do ecossistema, a partir de movimentos da análise de fatores como operações de liquidez, compra ou fusão (M&A) das startups, o ‘valor do ecossistema’ (soma aproximada dos valuations das startups do ecossistema), e o total de registros de captação de investimentos pelas startups estabelecidas no território;
  • Financiamento para startups: mede a disponibilidade de recursos financeiros para as startups, quanto ao acesso, a qualidade (diversidade de opções, garantias exigidas, juros, burocracia, etc.) e o nível de atividade dos investidores nas startups locais;
  • Alcance mercadológico: busca avaliar o sucesso das startups nos mercados, iniciando pela capacidade do mercado local em comprar das startups do próprio território, seguido da identificação de startups com alcance nacional e global, junto com a avaliação da qualidade das soluções inovadoras ofertadas pelas startups;
  • Conectividade: avalia a qualidade e a velocidade da conectividade com a internet, junto com a infraestrutura disponível para telecomunicações no território;
  • Talentos: mede inicialmente a oferta de talentos técnicos, com indicadores relacionados ao custo salarial, a qualidade e a disponibilidade dos profissionais disponíveis para as startups locais em áreas como STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia, Matemática) e Ciências da Vida, e também dos talentos no empreendedorismo, a partir da avaliação da escalabilidade das startups e do crescimento do valor de mercado dessas empresas;
  • Conhecimento: avalia a transformação do conhecimento em inovação que possa ser transformada em geração efetiva de valor, por meio de indicadores relacionados aos registros de patentes e ao volume de atividades de pesquisa e desenvolvimento realizadas;
  • Infraestrutura: considera aspectos que proporcionam a geração, a atração e a retenção de startups e de talentos no território, analisando indicadores relacionados à qualidade de vida (saúde, saneamento, educação, energia, mobilidade urbana, etc.) e a qualidade dos ambientes de suporte ao empreendedorismo (hubs de inovação, por exemplo).

Observando-se esses três métodos diferentes, nota-se alguns pontos em comum. Primeiramente, o município precisa dispor de um bom ambiente para viver e para empreender, pois as startups precisam de talentos e de processos que favoreçam o desenvolvimento dos seus negócios, com burocracia mínima e tributação adequada. Além disso, o município precisa oferecer conectividade à internet em qualidade e altas velocidades, o que no Brasil ainda é uma barreira a ser vencida e que também já foi tema de artigo desta coluna. 

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Tudo isso deve fazer parte de um conjunto de políticas públicas que favoreçam o empreendedorismo em geral, priorizando também a geração de novas empresas inovadoras tais como as startups. Importante lembrar que a principal fonte geradora de tributos que financiam as organizações públicas são gerados pelas empresas, então trabalhar políticas que incentivem o desenvolvimento de negócios sustentáveis (equilibrando as dimensões econômica, social e ambiental) é algo a ser priorizado nos municípios.

Em seguida, é importante avaliar o nível de integração entre os atores do ecossistema local. Lembrando do modelo da quádrupla hélice, empresas, organizações da academia (universidades, escolas técnicas, centros de pesquisa), o poder público (executivo e legislativo municipal) e a sociedade civil organizada (principalmente entidades empresariais e sociais) precisam se organizar para a promoção do empreendedorismo inovador.

Ecossistemas de inovação de sucesso buscam essa organização de forma setorial, criando clusters econômicos para a inovação, priorizando o desenvolvimento de soluções inovadoras para os desafios das empresas estabelecidas no território, que são aquelas que mais precisam inovar, pois estão expostas à competitividade que hoje ocorre em nível mundial em todos os setores. Isso deve se traduzir no apoio financeiro e econômico coletivo, de todos esses atores, a diferentes ações de inovação aberta, desde linhas de P&D para o desenvolvimento de novas tecnologias, quando a eventos, oficinas de ideação, pré-incubadoras, incubadoras, aceleradoras, entre outros.

Para facilitar a integração entre os atores dos ecossistemas, é recomendável dispor de locais que proporcionem a realização de eventos e de serviços de suporte ao empreendedorismo inovador, tais como hubs ou centros de inovação, que preferencialmente devem surgir para atender as necessidades de inovação de cada cluster econômico estabelecido no território. Esses espaços devem surgir naturalmente, à medida em que os eventos e serviços de apoio ao empreendedorismo se estabelecem e amadurecem, provocando uma necessidade de proximidade para melhor sinergia que favoreça a geração de startups.

Outro ponto importante é a oferta de capital para as startups. Como todo negócio novo, essas empresas precisam investir recursos financeiros e econômicos para que possam desenvolver suas soluções e, caso sejam bem sucedidas, amadurecer e ampliar seus negócios e operações. Os atores do ecossistema precisam criar uma espécie de pacto socioeconômico, para estabelecer algumas diretrizes e responsabilidades básicas para garantir os recursos necessários para a criação e o desenvolvimento de startups em todas as suas etapas (ideação, prototipação, início das operações, crescimento, etc.) e de diferentes formas tais como subvenções, subsídios, crédito, venture capital, etc.

Por fim, tudo isso precisa se traduzir em geração de valor. O trabalho bem-sucedido em todas essas frentes precisa gerar empresas estabelecidas mais competitivas, junto com startups e outras empresas inovadoras bem sucedidas, com suas soluções sendo compradas pelo mercado local e expandidas rapidamente para outros locais, nacional e internacionalmente. Isso pode ser medido de diferentes formas, como a arrecadação tributária, geração de empregos, valorização do valor de mercado das empresas, eventos de liquidez, entre outros indicadores. É essa geração de valor e de riqueza que, em ecossistemas de inovação de sucesso, se traduz em um movimento sustentado de desenvolvimento econômico, social, urbano e ambiental, com benefícios para todos os atores do próprio ecossistema, e também para as pessoas que vivem no território.

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