Fundadores de startups como CataCompany, Involves, WeGov, Exact Sales, SocialBase e Axado dão dicas para quem quer começar a empreender
“Se você quer ganhar dinheiro, vire executivo, não vá empreender”, foi o recado que Victor Levy, fundador da CataCompany, deixou aos mais de 200 participantes do evento promovido pela Acate Startups, núcleo da Associação Catarinense de Tecnologia voltado aos novos negócios no estado, em Florianópolis (SC). Assim como Victor, outros cinco empreendedores que hoje são responsáveis por algumas das mais destacadas empresas do ecossistema de inovação da Grande Florianópolis compartilharam casos de fracasso, dificuldades e exemplos de superação, uma maneira de “dar a real” para quem quer fundar uma startup (ou já deu o primeiro passo).
Antes de se tornar o CEO da empresa de pequeno porte que mais cresceu no Brasil (4.500% entre 2014 e 2016), segundo estudo da Deloitte/Exame, Victor Levy encarou uma série de contratempos, criou e vendeu empresas fora do Brasil, voltou a ser executivo e largou tudo para empreender novamente a partir de um insight no café de um aeroporto.
O SC Inova acompanhou o evento e selecionou algumas das histórias e dicas dos empreendedores. Confira:
#1 “Para empreender, a experiência de vida vale muito mais do que qualquer currículo acadêmico” – Victor Levy, CEO da CataCompany
“Em 1999 eu tinha largado a carreira de executivo em uma empresa nos Estados Unidos para empreender. Quando você cria uma empresa o elemento mais crítico é o timing da sua decisão – e muitas vezes, sem notar, eu estava empreendendo no timing errado. Naquela época, a empresa que criei estava prestes a receber investimento do Citibank – aí estourou a bolha da internet. Fiquei perdido, sem perspectivas e sem os outros sócios. Mesmo assim continuei com a empresa, expandi, recebi investimento e vendi o negócio para uma empresa do México.
Em 2008, eu decidi empreender novamente, só que aí veio a crise financeira global e eu voltei pra vida de executivo, desta vez no Brasil. Fiz isso por um tempo para me capitalizar e saí para criar outra empresa – mesmo com a esposa grávida. O meu novo negócio veio a partir de um insight em uma cafeteria de aeroporto, quando a caixa me pediu moedas para facilitar o troco. No Brasil esse era um problema recorrente e por isso criei a máquina da CataMoeda, que hoje é responsável apenas por 10% da Cata Company.
Para empreender, a experiência de vida vale muito mais do que qualquer currículo acadêmico. Mas estatisticamente é muito difícil ganhar a vida empreendendo – se quer ter dinheiro, vire executivo. O importante é ter um propósito e seguir trabalhando em busca dele”.
#2 “Não é preciso entender de programação para criar um negócio na área de tecnologia” – Guilherme Reitz, cofundador da Axado – startup criada em 2012 e vendida em 2016 para o Mercado Livre – e CEO da Yungas
“Quando eu e o meu sócio Leandro começamos, não sabíamos nada de tecnologia, nem desse vocabulário das startups. Somos administradores e tínhamos um projeto na área de logística, queríamos ser o Buscapé deste mercado. Só que não sabíamos – e eu até hoje não sei – ler uma linha de código. Não é preciso entender de programação para criar uma empresa de TI, mas cometemos um grande erro no começo. Contratamos um programador, mas tivemos que refazer o código do zero. Terceirizamos com uma fábrica de software, mas a empresa não teve compromisso em criar um código de qualidade. Isso gerou um aprendizado: jamais terceirize a área chave de sua empresa.
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Outro aprendizado foi controlar a expectativa, ainda mais se o empreendedor é ansioso. Participamos de um programa de seleção do Buscapé, estávamos confiantes que poderíamos ganhar o prêmio de R$ 1 milhão mas não passamos pra fase seguinte. Vai uma distância enorme entre um possível cliente gostar e efetivamente pagar pela solução que você desenvolveu. Foi super difícil no começo, mas canalizamos a energia para desenvolver o produto e em menos de um ano depois, numa negociação com um fundo de venture capital nossa empresa foi avaliada em R$ 5 milhões – muito mais do que o prêmio do Buscapé. Alguns males podem virar um grande aprendizado.”
#3 “A imperfeição é muito boa. Quando tudo é muito certo, polido, perde a graça” – Gabriela Tamura, cofundadora e diretora da WeGov
“Desde pequena aprendi a lutar por recursos. Tinha oito irmãos, trabalhava desde pequena, muitas vezes em três turnos. Tive a ideia de empreender quando notei que havia uma oportunidade de ensinar o setor público a usar redes sociais. Mesmo na família, me desencorajavam, pois diziam que papel dos governos não era entender de redes sociais mas sim de licitação. Mesmo assim eu e o André, meu marido, fizemos um primeiro evento, há cinco anos e foi um fracasso, não tínhamos experiência. Porém, isso serviu para começarmos a construir uma comunidade interessada no tema – a Embrapa nos pediu um manual de referência para uso de redes sociais e nós criamos.
O legal de ser um dos primeiros a atuar num certo mercado é poder construir a partir do zero. Eu e meu marido pegamos o dinheiro do casamento, abrimos uma empresa e fizemos vários eventos gratuitos, com grana do nosso bolso, para levar a ideia de inovação no setor público. Achávamos que daria um evento para 400 pessoas mas foram 30, outro fracasso. Mesmo assim, vi que era isso mesmo que a gente queria. A imperfeição é muito boa – quando você tem tudo certinho, polido, perde a graça.
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A nossa empresa teve um primeiro ano muito bom, em 2015, depois um ano muito ruim, quase desistimos, mas hoje estamos rodando um programa que foi patrocinado pela Softplan e que está em quatro estados do país. Sucesso pra mim é acordar todo dia com vontade de trabalhar e ter liberdade pra deixar e fazer outras coisas. As decisões difíceis me ajudaram muito mais a crescer.
#4 “É preciso crescer de forma planejada – mas monte uma estrutura de RH desde o começo. Erro de contratação sai muito caro” – Rada Martini, fundador da SocialBase e investidor anjo
“Eu vim da área de comunicação, onde comecei a trabalhar cedo. Fui pra tecnologia em 2004 por causa do Jaime de Paula, fundador da Neoway, de onde saí em 2011 para fundar a SocialBase, que desenvolve redes sociais corporativas. No começo, venci uma competição de startups em Santa Catarina e fui confiante a São Paulo disputar a final, que valeria um período de aceleração no Vale do Silício. Não passei pra semifinal, mas mesmo desmotivado pelo resultado, fui a outro evento na cidade, tomei coragem para falar com um executivo e disse que gostaria muito de passar um tempo em San Francisco. Enviei a ele meu projeto, fui selecionado e apanhei muito dos americanos durante a aceleração na Plug & Play. Foi bom, porque a vida é uma montanha russa. Você tem alguns anos muito bons, depois pode perder um grande cliente e ter que demitir pessoas. Me desgastou muito mas me fez aprender a crescer de maneira planejada.
Não sou desenvolvedor e cometi alguns erros básicos de produto. Paguei um preço alto por isso por querer fazer as coisas muito rápido, é preciso validar o seu produto com mais tempo e não fizemos isso da maneira correta. Se eu voltasse lá atrás, dedicaria pelo menos uns seis meses nesta fase. Outro erro que percebi foi ter demorado demais para montar uma estrutura de Recursos Humanos, e isso que nosso produto era voltado para os departamentos de RH. O que faz uma empresa é mercado, produto e time – por isso, tem que investir desde o começo no RH de sua empresa. Erro de contratação sai muito caro.
#5 “Não abandonem a ideia, estudem e sejam persistentes – mas fiquem atentos às pulgas na orelha” – Théo Orosco, cofundador e CEO da Exact Sales
“Sou designer e administrador, fissurado em processos mas não sou programador. No começo, tinha uma empresa de serviços na área de design industrial, não equilibrava vida pessoal e fiquei doente. Mas então comecei a estudar um processo de vendas pra Welle Laser e prototipei – isso fez a empresa ser a startup que mais cresceu no Brasil, passou de um faturamento de R$ 1,6 milhão para R$ 10 milhões. Eu relutava em ter uma empresa, queria prestar consultoria e usar um software como apoio. A primeira lição que aprendi empreendendo é que não precisa ter produto pronto, é preciso resolver uma dor de quem pode ser seu cliente. Eu comecei vendendo uma planilha que dava pau, mas era um processo que gerava venda, tinha case, histórico e isso ajudou a conseguir o primeiro investimento de capital de risco.
Começamos numa sala de 30m2 com a visão de contratar rápido e, se preciso, demitir rápido. Meu objetivo era ser como o Eric Santos, fundador da Resultados Digitais. Até que crescemos ao ponto de a Exact Sales pegar a sala da RD no Celta quando eles se mudaram – hoje temos um grupo de empreendedores que sempre se reúne para jantar e trocar ideias.
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Um aprendizado que tive era ficar atento às pulgas na orelha: a empresa ia muito bem, aparecia em capa de revista, mas por pouco não falimos por erros de um ex-diretor financeiro. Quase ficamos sem caixa. Tinha impressão que alguma coisa estava errada e conseguimos resolver a tempo. Problemas e negativas de clientes sempre nos fizeram crescer. O recado que deixo é tenha calma, dê um passo pra trás, reduza se necessário. Em suma, não abandonem a ideia, sigam com ela, estudem e sejam persistentes. No meu caso, a teimosia e a crença que é importante prototipar sempre me ajudaram”.
#6 “O importante é que todos tenham a mesma vontade de crescer” – André Krummenauer, cofundador e COO/CFO da Involves
“Comecei a pensar na probabilidade de empreender em 2008, quando estava na faculdade. Desde o começo pensava em um modelo de negócio com receita recorrente, embora não fizesse ideia de que produto ia vender. Começamos como uma fábrica de software e, como éramos em seis sócios, cada um ganhava em média R$ 400 por mês – enquanto isso, muitos colegas de faculdade recém-formados estavam indo para São Paulo fazer trainee em grandes empresas e ganhavam bem mais.
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O mais importante, quando você empreende, é a vontade de crescer. Nós tínhamos três dos seis sócios trabalhando em tempo integral e os demais mantinham um outro emprego. Combinamos que todos deviam estar 100% envolvidos no projeto e eles pediram demissão ao mesmo tempo. Fomos para uma salinha no Kobrasol, em São José, e fazíamos de tudo um pouco, vendíamos link de internet para os vizinhos (um modelo de receita recorrente, como sempre queríamos), produção de sites… eu mesmo cheguei a percorrer todas as lojas da avenida central do Kobrasol, preparei 52 propostas, fiz um funil de vendas, mas não consegui vender nada. Tentamos dez produtos – aplicativos para o Twitter, rede social para futebol, solução para gerenciar parque de impressoras, software para agendamento de consultas online – mas só ‘acertamos’ com o décimo primeiro, uma solução para gerenciamento de equipes de trade marketing, que é nosso principal produto hoje. Não tem bala de prata. O segredo é a persistência”.
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