Este 2020 acelerou o suporte on-line para vendas (e-commerce), transformando a relação das pessoas com marcas, produtos e serviços de uma forma que não se via desde a Revolução Industrial.
[27.11.2020]
Por Alexandre Adoglio*
Ainda ficamos assombrados quando o interfone toca e alguém do outro lado nos informa que um produto chegou, às vezes nos pegando de surpresa e nos fazendo indagar sobre o que seria, ou quem comprou. Fato é que este ano de 2020 acelerou o suporte on-line para vendas (e-commerce) transformando a relação das pessoas com marcas, produtos e serviços de uma forma que não se via desde a Revolução Industrial. Não estar on-line pode significar a extinção de muitos negócios e marcas, pois além da barreira física que os “infinitos fechamentos” causaram no fluxo de clientes temos a democratização veloz dos serviços e ferramentas online, pulverizando as mais diversas formas de oferta, venda e entrega.
Ainda um pouco antes da pandemia, um movimento forte de integração da operação de vendas ocorria pelo mundo, em uma tentativa de normatizar e colocar todos na mesma página evolucionária. O Phygital nasce bem maior do que uma simples bussword e passa a ser uma vertente do mercado online que integra variadas ferramentas, estratégias e conceitos sob a mesma jornada de compra, com o objetivo de tornar a experiência de usuário mais fluída e, lógico, alavancar as vendas.
Uma das primeiras marcas a apostar forte no modelo foi a Nespresso, que desde 2015 já integrava de alguma forma suas lojas físicas com a experiência digital. Nesta, os clientes selecionam suas embalagens de café nas prateleiras e as colocam em um grande recipiente acoplado a um totem. O valor total a ser pago é exibido diretamente, graças ao uso de chips conectados que identificam o cliente via IoT, Internet das Coisas.
Os clientes podem então comprar, pagar e sair com seu café sem a necessidade de um vendedor ou caixa. Os funcionários estão lá apenas para oferecer conselhos sobre a melhor escolha, como sommeliers de café, o que melhora a experiência do cliente em todo processo.
Fluidez semelhante já encontramos na Cooper, cooperativa de compras de Blumenau, que em 2017 trouxe a mesma solução, aqui nomeada self-checkouts, tornando-se pioneira do setor supermercadista com esta implantação. A ideia foi oferecer um conjunto de tecnologias e serviços para dar mais comodidade e proporcionar uma nova experiência de compras aos clientes, provendo também economia na mão de obra do supermercadista.
FIM DO COMÉRCIO TRADICIONAL?
Embora o e-commerce esteja crescendo rapidamente, ele representava somente 12% do total das vendas no varejo em todo o mundo antes da pandemia. Mesmo que essa proporção tenha acelerado bastante nos últimos meses, as lojas físicas continuam sendo o método de compra preferido, devido a necessidade humana de interação ao vivo, motivo pelo qual não aguentamos ficar tanto tempo presos em casa. No entanto, o digital oferece grandes vantagens para as lojas tradicionais, ao aumentar o ritmo e melhorar a experiência do cliente na loja com novas tecnologias digitais.
Físico e digital são, portanto, complementares e não opostos.
Estamos vivendo na era digital e não é mais considerado bizarro comprar todos os tipos de produtos na internet. É por isso que damos tanta importância à experiência digital do cliente. De acordo com dados da edição 2020 do estudo anual de comércio eletrônico 2020 da IAB Espanha, 72% dos usuários da Internet compram online. No entanto, a chave está em unir as vendas online e físicas: 52% dos entrevistados compram nos dois canais e prevêem que 78% deles o farão mesmo após a pandemia, enquanto apenas 13% comprarão apenas em lojas físicas e 9% apenas compre online.
E O CORONAVÍRUS?
A pandemia COVID-19 inevitavelmente acelerou as mudanças nos hábitos de consumo de todos e fez com que as compras digitais crescessem. Apesar disso, muitos de nós sentimos falta de interagir com os vendedores e do serviço personalizado que temos ao entrar em uma loja, e não estamos prontos para desistir disso. É diante dessa dualidade, que o conceito de phygital ganha ainda mais força, tendo como principal objetivo unir o melhor do e-commerce e do varejo físico. Um dos pioneiros neste mercado, Stan Kubinski do estúdio Bergmeye de Boston, USA, afirma:
“As experiências Phygital requerem colaboração metódica entre todos os fornecedores, engenheiros, estrategistas de conteúdo, designers e especialistas em varejo e devem ter como objetivo elevar a experiência humana por meio da inovação digital.”
Nas lojas do “futuro de hoje” existem câmeras inteligentes capazes de reconhecer os artigos que os clientes param na frente (para lhes oferecer anúncios relevantes), identificando quais produtos são colocados em cestos ou carrinhos (sem a necessidade de chip ou carrinho conectado). Melhor ainda, algumas lojas estão levando a experiência mais longe, permitindo que os clientes saiam e sejam automaticamente debitados por suas compras sem passar pelo caixa. Este feito tecnológico é possível graças ao uso de inteligência artificial (IA) para reconhecer os clientes que entram e saem da loja phygital.
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DADOS OU MORTE
Uma startup pioneira no entendimento do phygital é a AVI Brasil, integrante do Grupo Vex de Blumenau, que além das soluções em IoT oferece também sistemas para análise em tempo real do varejo físico e instrumentos para gestão de publicidade cognitiva, que provê o entendimento de perfil dos consumidores que estão comprando, como idade, gênero e faixa etária. A proposta é oferecer ao mercado uma combinação eficiente de Hardware e Software que entrega todas as métricas do negócio através de dashboards, aplicativo e wearables, analisando os dados e dispondo de relatórios completos e previsões de parâmetros através de IA (inteligência artificial), possibilitando tomar decisões mais assertivas de forma rápida.
Uma outra solução que desponta no atual cenário é a Hiper de Brusque, que já integra toda experiência de gestão do varejo tanto no físico como no online, possibilitando ao empreendedor construir estratégias phygital sem precisar operar planilhas de controle de estoque, faturamento ou fiscal. Funcionalidade também inovadora para o pequeno varejo é o catálogo digital, já integrado com outros marketplaces como Mercado Livre, e maquininha de cartão própria.
PHYGITAL X OMNICHANNEL
Ainda segundo o Google, 63% das compras começam online, porém 49% dos consumidores ainda preferem fazer compras em lojas físicas. Esses dados mostram que as lojas têm muito a ganhar com a oferta de marketing virtual e experiencial. Como aprendemos, o e-commerce não matou necessariamente os varejistas tradicionais, apenas aqueles que oferecem uma experiência ruim ao cliente. Com o surgimento das compras online, os consumidores experimentaram a conveniência e personalização de interagir com uma marca quando e onde desejam. Quando trazem essas expectativas com eles para a loja física, os clientes geralmente vão embora… desapontados.
De acordo com pesquisa apresentada na NRF 2020 (National Retail Federation), os clientes continuam enfatizando que a qualidade e o preço são os fatores mais importantes na hora de comprar um produto. Ao mesmo tempo, a conveniência parece impedir a realização de uma compra, pois 97% dos consumidores disseram não ter comprado algo porque era inconveniente fazê-lo. O marketing phygital está aumentando a experiência que os clientes recebem quando se aventuram em uma loja física e o uso de ferramentas digitais pode fornecer esta conveniência de compra, personalizada e empolgante que eles desejam. Dessa forma, as empresas podem realmente entregar mais valor a um custo menor.
É importante entender que para os consumidores mais jovens a diferença entre as plataformas de varejo físicas e digitais não existe mais. É por isso que uma estratégia phygital vai um passo além da abordagem de marketing omnichannel, conectando e mesclando completamente os mundos online e offline.
IMPLANTAR NÃO É EXECUTAR
Por muitas vezes noto que as empresas aplicam determinados conceitos e ferramentas de forma extremamente leviana, pretendendo que basta estudar o assunto e contratar “por fora” e “em partes” que as soluções por inércia vão rodar sozinhas. Já vivenciei isto com marketing digital, e-commerce e em processos de transformação digital, tendo cases de sucesso somente onde os princípios totais dos conceitos foram aplicados. Quem não lembra daquele CRM ou ERP que contrataram na firma e demorou dois anos para ser implantado? Pois é, são exemplos de implantação “por fora”.
Adotar uma estratégia de varejo phygital não é apenas uma estratégia de marketing. Ela começa mudando a maneira como você encara a jornada do cliente. Para oferecer suporte a uma jornada não sequencial de consumo, na qual os clientes alternam entre os pontos de contato online e na loja, as empresas precisam incorporar dados digitais e físicos em seus sistemas de CRM.
O objetivo é tornar tão fácil e sem esforço para o consumidor se envolver com a marca no mundo físico quanto no online.
As empresas precisam estar procurando maneiras de incorporar automação, inteligência artificial, realidade aumentada e outras tecnologias digitais em showrooms que conectam os reinos físico e digital e levam a experiência do cliente para o próximo nível.
Uma loja de tijolo não é mais um lugar onde as pessoas vão comprar, mas sim experimentar, jogar, conectar e se divertir. Se os clientes quiserem apenas comprar um item, eles podem fazer isso facilmente online. Em uma estratégia phygital, a loja física torna-se um parque de diversões de experiências sensoriais e digitais para divulgar a marca e seus produtos.
Como este artigo é uma pesquisa inicial sobre o conceito, e tem somente o intuito de abrir uma porta na mente das pessoas, vou detalhar os processos recomendados para implantação do phygital segundo alguns especialistas:
A) Os 3 “eus”
Phygital se concentra em tornar os “três eus” uma realidade: imediatismo, imersão e interação. Aqui está o que cada um envolve:
Imediato: trabalha para garantir que as coisas aconteçam no momento exato.
Imersão: o usuário faz parte da experiência.
Interação: A geração de comunicação é necessária para ativar a parte mais física e emocional do processo de compra.
B) Tudo velho é novo outra vez.
As empresas de varejo estão particularmente interessadas em aderir ao movimento phygital. Projetar experiências integradas com arquitetura física tem sido uma maneira de dar vida a um setor que, de outra forma, está lutando para se recuperar de gigantes do comércio eletrônico como a Amazon. Para atrair os compradores a visitar uma loja física, a loja deve oferecer uma experiência extraordinária, desde sua localização, visual merchandising, atendimento, sons e aromas.
C) Conteúdo é tudo
Como já sabemos como gurus de conteúdo, as palavras desempenham um fator importante em como nos relacionamos com qualquer coisa: pessoas, lugares ou coisas. E, embora belos sons e imagens por meio de gráficos e tecnologia sejam parte das experiências phygital, o conteúdo é igualmente essencial para gerar engajamento do consumidor.
O conteúdo não é apenas uma representação da mensagem e visão de uma marca, mas também seu relacionamento com seus clientes, pois quando um conteúdo assertivo é criado online e offline, ótimas e inestimáveis experiências para o cliente também estão sendo criadas. Um cliente pode ser atraído para sua loja física por mensagens divertidas que viu online ou pode ser compelido a aprender mais depois de ficar impressionado com a experiência perfeita que teve na loja física;
D) Levante as âncoras
Existia uma piada interna entre os profissionais de marketing sobre o tal dos 4 Ps (Produto, Promoção, Ponto e Preço), de que na verdade estes Ps seriam só sobre PONTO. Com o phygital esta barreira desaparece, pois a estratégia é da conveniência, você precisa estar aonde o seu cliente está. Quiosques, eventos, feiras, lojas pop-up, tudo é válido para promover uma experiência fluída e diversificada, que complemente a experiência online no mundo real.
Por fim vamos dar uma olhada em exemplos de empresas de varejo e outros setores que adotaram uma estratégia phygital:
Ao repensar de sua experiência de compra, a Amazon lançou uma série de lojas Amazon Go nos Estados Unidos, onde por meio de um app os clientes podem comprar o que precisam sem ter que pagar. Com um carrinho virtual conectado à conta do cliente na Amazon, os clientes e produtos são automaticamente identificados e cobrados na conta quando saem. Sem check-out, sem filas.
Pelos showrooms espalhados pelo mundo, os fãs da marca podem se perder em um playground de experiências. A abordagem phygital é alegre, mas etérea, centrada em torno do mundo de “rosa brilhante” aonde os clientes podem brincar com a maquiagem, tirar selfies em seus abundantes – e estéticos – espelhos e se conectar com a marca de uma forma física que normalmente não está disponível em seus canais online.
OCEAN MEDALLION TECHNOLOGY (Princess Cruises)
Para capitalizar a experiência de marketing phygital, a Princess Cruises relacionou a tecnologia Ocean Medallion (foto acima), um pingente do tamanho de um quarto que pode ser usado como uma pulseira, colar ou guardado no bolso. Este dispositivo vestível complementar eleva experiência do hóspede nos cruzeiros, aprimorando as interações entre os convidados e a tripulação, eliminando pontos de atrito e permitindo que o entretenimento interativo ofereça um alto nível de serviço e atenção personalizada em grande escala.
Um dos primeiro conceitos phygital foi a Nike ID em Nova York. O consumidor escolhe a personalização e o design do tênis pelo online e finaliza na loja, oferecendo uma satisfação imediata, pois podem levar o produto para casa, ou até mesmo usar na saída da loja. Isso resulta em uma experiência e um produto únicos que não podem ser duplicados ou replicados por ninguém.
Por fim, para uma boa implantação do phygital é necessário muito mais do que comprar as melhores ferramentas e contratar aquele consultor top. É, antes de tudo, mudar o mindset de como fazer seu produto chegar ao cliente.
* ALEXANDRE ADOGLIO é CMO na Sonica e empreendedor digital.
Escreve semanalmente sobre Cultura Digital para o SC Inova.
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