Conectividade: ecossistemas de inovação precisam ser mais “amigos da internet”

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Conectividade: ecossistemas de inovação precisam ser mais “amigos da internet”

O 5G exigirá pelo menos cinco vezes mais antenas em relação ao que existe hoje, então é urgente acelerar a ampliação das redes móveis.

O 5G exigirá pelo menos cinco vezes mais antenas em relação ao que existe hoje, então é urgente acelerar a ampliação das redes móveis. Foto:  Frederik Lipfert /Unsplash


[26.10.2021] 


Por Marcus Rocha, empreendedor e colunista do SC Inova. Escreve quinzenalmente sobre ambientes e ecossistemas de inovação

Este texto continua as ideias do artigo anterior, que falou sobre os problemas da infraestrutura básica das redes de telecomunicações nas cidades, em especial as fibras óticas nos postes, que hoje representam um gargalo inibidor da inovação no Brasil. Sem conectividade de qualidade, todo o ecossistema de inovação sofre.

Há muita expectativa em relação à chegada do 5G no Brasil. No entanto, não se pode esquecer que o país ainda tem deficiências significativas em relação à cobertura de telefonia móvel e também de internet 3G e 4G. Segundo a Abrintel, o Brasil possui uma proporção média de uma antena de telefonia móvel para cada 2.300 habitantes, número bem longe do ideal, que seria de 1.500 pessoas por antena. O 5G exigirá pelo menos 5 vezes mais antenas em relação ao que existe hoje, então é urgente acelerar a ampliação das redes móveis.

Um dos principais entraves nesse cenário está relacionado às diferentes leis desenvolvidas em cada cidade para regulamentar a instalação das antenas para a telefonia celular, chamadas de Estações Rádio Base (ERB). Como não há um modelo geral nacional, várias cidades criaram seus próprios processos de autorização para antenas, enquanto outras cidades sequer possuem legislação nesse sentido, principalmente as de pequeno porte. Como o Brasil tem 5.570 municípios, essa falta de um padrão mínimo cria um cenário extremamente complexo para as empresas operadoras de telecomunicações, o que impacta diretamente as tarifas e a própria cobertura e qualidade dos serviços.

Muitas cidades ainda criaram processos de instalação de ERBs excessivamente complexos e burocráticos, inibindo a expansão das redes de telecomunicações sem fio. Como a inclusão digital no Brasil se deu por meio dos smartphones, mais portáteis e mais baratos que os computadores, a disponibilidade de sinal 3G e 4G em escala nacional é fundamental para que a conectividade seja algo efetivamente acessível para todos.

Para demonstrar o cenário atual das barreiras para a implantação das infraestruturas de telecomunicações nas cidades, o Conexis Brasil Digital, entidade que reúne e representa as empresas de telecomunicações e conectividade, criou o Ranking das Cidades Amigas da Internet. A partir de critérios relacionados a legislação, burocracia, prazo e efetividade para a implantação de infraestrutura de telecom nos 100 maiores municípios brasileiros, criou-se esse ranking.

Na edição de 2021 destaca-se Uberlândia (MG), que foi a 1ª colocada no geral. Porto Alegre foi a 1ª entre as capitais estaduais. Algumas cidades melhoraram suas legislações e/ou processos de autorização para as operadoras de telecomunicações, com destaque para Brasília (DF), Londrina (PR) e Palmas (TO), que avançaram 88, 78 e 44 posições, respectivamente. Entre as capitais, Teresina (PI), Manaus (AM), Florianópolis (SC) e Belo Horizonte (MG) são as piores em termos de regulamentação para a instalação de infraestruturas de conectividade.

Florianópolis apresenta uma situação interessante. Apesar de estar em uma posição ruim no ranking das capitais “amigas da internet”, possui uma das melhores coberturas de 4G do país, com 99,65% dos moradores cobertos pelo sinal móvel de internet. Não há um estudo específico para explicar essa situação, mas pode-se entender que possivelmente a evolução do ecossistema de inovação e das empresas de base tecnológica no município atraiu investimentos em telecomunicações no passado. 

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No entanto, é urgente modernizar a legislação e os processos de implantação de redes de telecomunicações na cidade para garantir a sustentabilidade do seu próprio ecossistema de inovação e, nesse sentido, é necessária a aprovação e sanção do Projeto de Lei Complementar Municipal nº 1.784 de 2019, que está em estágio avançado de tramitação.

Boa parte dos municípios que editaram suas leis no passado ainda consideram o paradigma de grandes torres para a instalação das ERBs. Essas instalações, realmente, oferecem um impacto visual e ambiental grande. No entanto, as instalações nos topos dos prédios, os biosites (antenas compactas, parecidas com postes comuns, que se confundem com o ambiente urbano), e os minisites (para ambientes externos, similares a roteadores WiFi), na maior parte das cidades são tratados com o mesmo peso burocrático das grandes torres. 

Portanto, há uma urgência na atualização das leis à luz das novas tecnologias.

Antenas 5G são compactas e discretas, afetando muito pouco a paisagem urbana. (Crédito: Tom Banse, NW News Network)

Há algumas boas notícias no horizonte para acelerar a instalação de antenas. Em 2020 algumas medidas foram publicadas pelo Governo Federal que ajudam a agilizar o processo. Com a clara não obediência dos municípios em relação ao prazo de 60 dias para autorizar a implantação de novas antenas, previsto na lei nº 13.116 de 2015, que estabelece normas gerais para implantação e compartilhamento da infraestrutura de telecomunicações, o decreto 10.480/2020 criou o “silêncio positivo”, dizendo o seguinte no seu Art. 13: “Na hipótese de não haver decisão do órgão ou da entidade competente após o encerramento do prazo estabelecido no § 1º do art. 7º da Lei nº 13.116, de 2015 a pessoa física ou jurídica requerente ficará autorizada a realizar a instalação em conformidade com as condições do requerimento apresentado e observada a legislação municipal, estadual, distrital e federal“.

Essa autorização tácita pela falta de resposta do poder público local certamente pode acelerar a implantação de infraestruturas. No entanto, as licenças podem ser cassadas posteriormente caso seja detectada alguma irregularidade e, considerando a já mencionada complexidade das diferentes leis e processos burocráticos de cada cidade, ainda se tem um ambiente de insegurança jurídica nesse ponto.

Recentemente a Anatel realizou alguns movimentos para orientar os municípios a criarem ou atualizarem suas leis para a instalação das antenas, baseando-se em um padrão mais uniforme. Para tanto, criou uma página com orientações para os poderes executivo e legislativo municipal, incluindo uma minuta de projeto de lei como referência, desenvolvida em parceria com o Conexis, Sindicato Nacional das Empresas de Telecomunicações.

A iniciativa é louvável, mas não resolve a situação, pois os municípios possuem planos diretores diferentes e têm total liberdade para criarem suas próprias regras específicas.

Mesmo com avanços, para mudar esse cenário em nível local é necessário que todos os atores dos ecossistemas de inovação se envolvam no assunto. A manutenção dos atuais gargalos, junto com o ritmo crescente do aumento da demanda por serviços de telecomunicações, tende a criar uma situação que pode travar e inibir o desenvolvimento econômico local e, junto com isso, causar bloqueios a diversas iniciativas para a inovação, especialmente aquelas orientadas às cidades inteligentes, assunto que está em alta hoje.

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