[Cultura Digital] Tik Tok, Black Lives Matter e Sonic: a relevância dos movimentos na internet

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[Cultura Digital] Tik Tok, Black Lives Matter e Sonic: a relevância dos movimentos na internet

Alguns fatos, ações e produtos irradiam de maneira tão forte que ficamos sem entender muito como o processo se desenvolveu. É a mesma regra de uma epidemia.

Alguns fatos, ações e produtos irradiam de maneira tão forte que ficamos sem entender muito como o processo se desenvolveu. É a mesma regra de uma epidemia.


[19.06.2020]

Por Alexandre Adoglio*

Em meados de 2019 a Paramount Pictures se deparou com uma onda de críticas após o lançamento do teaser trailer para o filme Sonic, live-action do homônimo game da Sega. Em uma série de tweets, irados vários fãs do porco espinho se disseram revoltados com a aparência que deram ao bicho nas sequências do filme, principalmente na interação com os atores de carne e osso.

Dentre os usuários, alguns artistas propuseram por conta própria como o personagem deveria ser, de forma mais fiel ao original dos games e desenhos, como @EdwardPun1, que comparou as imagens do personagem do filme a uma criação sua mais fiel ao original.

A comoção foi tamanha que a Paramount Pictures, estúdio responsável, se posicionou rapidamente e prontificou-se a repensar o filme. O que de fato ocorreu, com fontes afirmando investimentos adicionais de U$ 35 milhões de dólares e prorrogando em mais de três meses o lançamento oficial, que ocorreu somente em 2020 sendo um grande sucesso de bilheteria já garantindo uma sequência. No comparativo entre os trailers antes/depois temos uma noção da acertada decisão de mudança e o quanto isso colaborou para levar mais fãs ao cinema.

Estratégia de Marketing ou um exemplo clássico de teste A/B?

Há muito os movimentos populares traduzem a ânsia humana por mudanças, um mundo mais justo, igualitário e até com uma certa utopia certo X errado.

Tik Tok por exemplo é o novo queridinho app de interação social, com seus mais de 5 milhões de usuários e presente nos smartphones dos mais variados tipos em vários países. A empresa chinesa já passou alguns apuros, processos por vazamento de dados, redução no alcance de conteúdo “pouco atraente” e banimento em países por conteúdo pornográfico

Muitos seguidores da plataforma apontam estas ocorrências como uma perseguição ao app devido o mesmo não ser de origem norte-americana. Porém, no início de 2020, o Tik Tok se viu em um problema ainda mais sério, quando uma mobilização de usuários no Reddit acusou a rede social de encorajar atos ilegais após um de seus influencers propagar sua tendência a violência contra mulher, causando uma revolta internacional que culminou em uma ação em massa de usuários, rebaixando suas notas, diminuindo a classificação do TikTok na Play Store do Google de 4,6 para 2 em poucos dias.

ADESÃO ÀS TECNOLOGIAS DIGITAIS IMPULSIONAM EFEITO DOMINÓ EM MOBILIZAÇÕES

Atualmente a mobilização de maior vulto com certeza é Black Lives Matter (BLM), em que um fato corriqueiro de violência policial (sim, corriqueiro) causou enorme comoção nos EUA para depois tomar o mundo de assalto, em um enorme efeito dominó de proporção global. Mas como um acontecimento local e corriqueiro (sim, corriqueiro) em Minneapolis pode influenciar, digamos, um espanhol em Barcelona?

É fato a desigualdade e atual polaridade extremista que vivemos como sociedade, porém um assunto regional tomar tamanha proporção se deve aos efeitos que a adesão das tecnologias está trazendo ao humano comum. Na verdade o movimento BLM começou em 2013, em um outro caso de violência norte-americana, mas só tomou tração quando o mesmo tipo de ocorrência encontrou mobilização nas redes sociais, acendendo um estopim pronto para gerar as chamas. 

A crise do Coronavírus está impactando profundamente a sociedade, sendo os mais prejudicados justamente aquelas pessoas que foram alvo destas injustiças, negros de baixa renda. Bastou um movimento (errado) captado pelo smartphone de uma adolescente e a enorme repercussão se tornou irrefreável, impactando inclusive a legislação norte-americana.

Uma outra movimentação social via apelo online ocorreu nos idos de 2013, quando a sociedade brasileira foi às ruas entoando “Não é só os 20 centavos”, e seu viral #vemprarua, que contou com a força das redes sociais para se alavancar, no que talvez tenha sido a primeira situação nacional em que a TV aberta sentiu na pele as mudanças que a comunicação online causaria no seu modelo de negócio. 

Em um momento pós-Orkut e pré Whatsapp, com ganho de escala do Facebook no Brasil, milhares de pessoas transmitiram ao vivo por todo país as manifestações, gerando uma onda de protestos de norte a sul, pegando a mídia offline completamente desprevenida. Inclusive sensibilizando o criador dos Simpsons, Matt Groening, que desenvolveu um episódio da animação voltado aos protestos. 

A química entre comunicadores, experts e vendedores, como diz Malcolm Gladwell, pode causar impactos profundos na forma como nos divertimos, vivemos e até mesmo nos revoltamos.

E quem não lembra do Mídia Ninja dando furo de reportagem na Globo? Inclusive a prisão de um dos integrantes desta rede, amplamente compartilhada pela população, levou à extensão das manifestações por mais alguns dias, comprovando que a mobilizações online se tornam abrangentes quando o engajamento vai além do simples like.

Em seu livro, O Ponto da Virada, (The Tipping Point, Editora Sextante) Malcolm Gladwell determina quais seriam condições para determinado assunto se propagar de forma rápida em grande escala. Determinadas situações já são passíveis de se propagarem por si só, tanto que muitas campanhas de marketing são desenvolvidas contando com este efeito. Por isso alguns fatos, ações, produtos, irradiam de maneira tão forte que ficamos sem entender muito como o processo se desenvolveu. É a mesma regra de uma epidemia.

No entendimento de Gladwell existem três personas determinantes para um assunto se propagar: os comunicadores, os experts e os vendedores. Atuando junto a estes indivíduos temos um fator de fixação, que geralmente é criado, aliado ao poder do contexto. Como vimos em alguns casos, a química entre estes fatores pode causar impactos profundos no modo como nos divertimos, vivemos e nos revoltamos.


* ALEXANDRE ADOGLIO é CMO na Sonica e empreendedor digital.
Escreve semanalmente sobre
Cultura Digital para o SC Inova.


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