Cidade-berço da tecnologia em SC, região ainda é carente no acesso a capital. “Temos potencial natural para gerar novos negócios”, afirma coordenadora do Núcleo de Inovação da ACIB
A história da inovação tecnológica em Santa Catarina começou no Vale do Itajaí, há quase meio século. Foi no polo têxtil de Blumenau que, no final da década de 1960, alguns dos maiores empresários da região criaram o CETIL (Centro Eletrônico da Indústria Têxtil), um bureau de processamento de dados que se tornou a principal escola local de formação de talentos – e novas empresas – na área de tecnologia desde então.
Mas na era das startups, a cidade pioneira da TI catarinense ainda fica a dever quando se trata de acesso a capital – componente importante para auxiliar o desenvolvimento de novos negócios. Foi o diagnóstico apresentado no Índice de Cidade Empreendedoras 2017 da Endeavor, que colocou Blumenau em 11o. lugar no ranking que avalia 32 municípios brasileiros. “A cidade tem mercado e inovação, mas faltam investimentos de risco em empreendedores locais”, resumiu à época Guilherme Lopes, coordenador da Endeavor em Santa Catarina, nesta reportagem publicada pelo SC Inova.
Na semana passada, um evento organizado pelo Instituto Gene e Prana Inovação e Recursos, com apoio do Núcleo de Inovação da Associação Comercial e Industrial de Blumenau (ACIB) e a Fundação Fritz Muller, entre outros, marcou o início de uma articulação local para criar uma rede de investidores dispostos a capitalizar as startups que estão surgindo na região.
“Temos um potencial natural para gerar novos negócios. O empreendedorismo em Blumenau é muito forte, temos mais de 25 mil CNPJs ativos”, comenta Ilisangela Mais, coordenadora do núcleo de Inovação na Associação Comercial e Industrial de Blumenau (ACIB) e diretora da Prana, empresa especializada em captação de recursos para empresas inovadoras. Ela foi uma das organizadoras da primeira edição do Investor Day, que reuniu cerca de 100 pessoas na Fundação Fritz Muller.
O núcleo de inovação da ACIB começou em 2014 a partir de empreendedores locais de startups e passou por um novo planejamento no final do ano passado. “Sempre apoiamos os movimentos que aconteciam na cidade, mas em vez de abraçar todas as iniciativas de inovação, entendemos que faria mais sentido escolher as startups como nosso foco”, explica a coordenadora. Entre as demandas identificadas está o mapeamento das novas empresas e ações de fortalecimento junto a investidores: “quando menos se espera encontramos uma startup local faturando meio milhão de reais e já com investidor”.
O foco nos novos negócios se deve, segundo Ilisangela, às particularidades do ecossistema local: “temos empreendedores qualificados, mas como são jovens, eles têm dificuldade em encontrar as pessoas certas para buscar recursos. Os investidores locais tem um perfil mais convencional, acostumados aos modelos mais antigos de planos de negócios e indicadores como Ebitda, o que não faz muito sentido para uma empresa iniciante. Nosso propósito é dar ferramentas aos investidores, para que se sintam mais à vontade nesse ambiente das startups”.
Uma das empresas destaque neste cenário na cidade, a Pague Veloz, aproveitou o Investor Day para realizar seu tradicional debate “PV Talks” e apresentar as novidades que a equipe viu durante missão técnica ao Vale do Silício, em fevereiro. Com foco em soluções financeiras (intermediação de pagamentos e recebimentos via cartão de crédito e boleto bancário), a empresa fundada em 2013 triplicou o número de usuários nos últimos 12 meses – hoje são cerca de 7 mil pessoas utilizando a plataforma.
A programação do Investor Day contou com um workshop exclusivo para investidores – do qual participaram 60 pessoas, de cidades próximas e também norte do estado e Grande Florianópolis – e uma apresentação de cinco startups (de Blumenau, Brusque, Florianópolis e Criciúma) selecionadas entre mais de 20 que se inscreveram. Eram projetos de várias áreas e estágios de maturidade diferente – de soluções para o varejo e saúde até aplicações corporativas e pessoais. Em média, as startups buscavam aportes entre R$ 300 mil e R$ 500 mil. De acordo com a organização, 25 investidores demonstraram interesse nas empresas que se apresentaram no evento.
O próximo passo, afirma a coordenadora do núcleo de Inovação, é dar apoio para que este namoro inicial vire casamento. “Queremos gerar negócios e isso significa recursos para as startups crescerem, mais inovação para as grandes empresas e desenvolver massa crítica para as pessoas entenderem jargões e questões técnicas, como legislação para investimento de risco, segurança jurídica. Nosso objetivo é fortalecer o ecossistema local desenvolvendo essa ponta que faltava, a do investidor”, comenta.
“Não somos uma iniciativa isolada. Estamos interagindo sistematicamente com outras redes para compartilhamento de projetos”, afirma Ilisangela Mais, coordenadora do núcleo de Inovação da ACIB
Segundo o Tech Report 2015 divulgado pela Associação Catarinense de Tecnologia, a região do Vale do Itajaí representa 25% do faturamento do setor em Santa Catarina (cerca de R$ 3 bilhões/ano, em dados da época do estudo), concentra mais de 1,4 mil empreendedores e emprega cerca de 10 mil colaboradores. Em 2015, apresentou o segundo maior crescimento entre os principais polos do país com relação a novas vagas de trabalho – 3% de expansão, atrás apenas de Florianópolis.
“Não há uma cultura de investimento em startups aqui na região. Muitos acabam entrando por indicação de amigos que já investem, mas falta um canal estruturado que permita uma conexão mais direta entre os empreendedores e os investidores”, detalha Ilisangela, que tem articulado com outras iniciativas semelhantes, como a 100 Open Startups, Rede de Investidores Anjo de Santa Catarina e a Anjos do Brasil, por exemplo. “Não somos uma iniciativa isolada. Estamos interagindo sistematicamente com outras redes para compartilhamento de projetos”.
O evento, na avaliação dela, mostrou que existe demanda de investidores para conhecer novos projetos e que há expectativa da cidade para a realização de encontros como esse. “Fizemos o primeiro furo na represa e acreditamos que a partir de agora podemos romper o muro que separa a visão antiga da indústria para que a inovação e a tecnologia local possam se desenvolver mais”, resume.
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