O modelo mental de tomada de decisões, baseado nas experiências passadas dos gestores, parece não funcionar mais, tamanha a velocidade das mudanças. / Ilustração: Getty Images
[27.04.2021]
Por Marcus Rocha, CEO do 2Grow Habitat de Inovação.
Escreve quinzenalmente sobre ambientes e ecossistemas de inovação.
Nunca se falou tanto sobre inovação. Porém, é importante descobrir os motivos por trás desse fenômeno para não considerá-lo apenas um mero modismo. Percebendo um aumento significativo na velocidade das mudanças e da complexidade do ambiente de negócios, que começava a se tornar global, Michael Porter lançou em 1985 o famoso livro “Vantagem Competitiva”. O conceito é quase auto-explicativo: demonstra que há uma competitividade/concorrência entre as empresas e que, por isso, precisam buscar elementos únicos ou escassos que as tornem mais competitivas, conquistando mais clientes e negócios.
Com a consolidação dos mercados globais, a concorrência entre as empresas passou a ter dimensões mundiais. Assim, a busca pela vantagem competitiva por meio do contínuo aprimoramento ou do desenvolvimento de produtos ou serviços passou a ser acelerada de forma quase exponencial. Inovar passou a ser algo fundamental para todas as empresas, independentemente do seu porte.
Outro motivo importante para a inovação diz respeito à velocidade das mudanças pelas quais o mundo e os mercados estão passando. O livro “No Ordinary Disruption”, de Dobbs, Woetzel e Manyika, faz a provocação de que o modelo mental de tomada de decisões, baseado nas experiências passadas dos gestores, parece não funcionar mais, tamanha a velocidade das mudanças. São quatro forças que provocam isso: a mudança da sede das maiores empresas do mundo para países emergentes; a velocidade de adoção de novas tecnologias; o envelhecimento da população; e o aumento da complexidade das rotas comerciais. Somam-se a essas forças tendências como a servicerização – a tendência de tudo se tornar serviços – e a desintermediação – a eliminação de intermediários nas cadeias produtivas – e vemos a força da “ameaça dos produtos substitutos”, também proposta por Michael Porter, mais ativa do que nunca.
Percebe-se que inovação não é uma moda passageira. É algo fundamental para a vantagem competitiva das empresas, especialmente para as pequenas e médias, pois quem não inovar será selecionado – uma espécie de “Darwinismo econômico”-, seja pelas grandes empresas que fazem imensos investimentos em inovação, ou pelas startups que se tornam scale-ups, crescem rápido e “atropelam” mercados.
Nesse cenário há um perigo maior para empresas que se encontram no meio de cadeias de valor longas ou complexas, que ainda comercializam produtos com pouco ou nenhum serviço agregado, ou que operam em setores em constante evolução tecnológica. É importante lembrar que tecnologia não é apenas TIC (tecnologia da informação e da comunicação), mas também materiais, equipamentos, substâncias, processos e toda outra forma de conhecimento aplicado com valor agregado.
Boa parte das empresas de pequeno ou médio porte, e talvez até algumas maiores, se encaixam nas situações aqui apresentadas e que pelo bem de sua própria existência precisam inovar mais do que nunca. Percebe-se que a maioria desses negócios possuem práticas consolidadas de inovação, com o desenvolvimento e a melhoria de processos, produtos ou serviços, caso contrário provavelmente não estariam mais operando. No entanto, a maior parte dessas empresas ainda inova de forma mais fechada, interna.
Com a pandemia do Covid-19 um termo que passou a ser frequentemente utilizado no mundo dos negócios é a “aceleração”. Para acelerar a inovação é necessário que as empresas cada vez mais se abram para o ambiente externo. Para ganhar velocidade e reduzir riscos na inovação, as empresas estabelecidas precisam evoluir as práticas de desenvolvimento ou aprimoramento de produtos ou serviços, ampliando suas iniciativas de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). É necessário trabalhar a inovação não apenas internamente, mas também por meio de parcerias com universidades, institutos de pesquisa, empresas menores (startups ou não), etc., modelo que foi chamado de “inovação aberta” por Henry Chesbrough, em 2003.
Importante salientar que nenhuma das ideias e práticas apresentadas até o momento são novas, mas muitas empresas ainda não as percebem ou praticam. Um dos principais motivos é a necessidade de uma forte mudança cultural e de modelos mentais fundamentais nas práticas dos negócios. Quanto mais forte a mudança, maiores as percepções de medos e riscos, questões naturais aos seres humanos, inclusive aos gestores de empresas.
TER PARTE DE UM PROJETO OU SER PROPRIETÁRIO DE TODO O RISCO?
Pesquisas sobre inovação aberta relatam que o principal medo dos gestores diz respeito a questões relacionadas a revelar segredos ou fraquezas da empresa para o ambiente externo. Nota-se nessa mentalidade uma falsa percepção de que compartilhar conhecimento sobre problemas ou oportunidades de negócios com parceiros é algo negativo, esquecendo que atualmente é mais importante implantar uma ideia viável na forma de um produto/serviço inovador do que apenas ter a melhor ideia de todas, protegida, mas sem a velocidade para implantá-la antes que os concorrentes.
Com parceiros bons e confiáveis, junto com alguns dispositivos práticos de proteção à propriedade intelectual – termo de confidencialidade, por exemplo – é possível dar a segurança necessária para a inovação aberta. Porém, é necessário acima de tudo compreender que hoje o time-to-market – tempo para ter uma solução colocada no mercado – é muito mais importante do que uma superproteção das informações compartilhadas.
Outro medo comum das empresas que não adotaram a inovação aberta é o compartilhamento da propriedade do que está sendo criado. Equipes internas envolvidas nas atividades internas de P&D costumam ver como ameaça a produção de inovações que não sejam criadas totalmente dentro da empresa. Para superar esse medo é fundamental mudar o modelo mental, da solução de problemas “dentro de casa”, para encontrar soluções com ajuda de especialistas, aumentando o conjunto de competências, a capacidade criativa e, assim, a velocidade para criar inovações.
Além disso, é preciso compreender que é mais importante ser dono de parte de algo com valor e que rapidamente será levado ao mercado, do que querer ter a propriedade total de algo incerto.
O medo de errar também é relevante, e se soma aos demais medos, pois o erro na inovação frequentemente causa impactos mercadológicos e financeiros importantes na empresa. Essa é uma mudança cultural complexa, que visa aprender com os erros, para que eles não se repitam, do que punir quem errou. Além disso, é necessário criar mecanismos para “errar rápido”, economizando tempo e recursos. Nesse sentido, a inovação aberta traz uma série de vantagens, principalmente a possibilidade de distribuir diferentes iniciativas, com diferentes parceiros, integrados às equipes da empresa. Então o erro em uma iniciativa não faz com que todas atividades de inovação sejam paralisadas, e os impactos financeiros também são diluídos, reduzindo os riscos inerentes ao processo.
Importante perceber que todos esses medos são superáveis a partir de ações concretas.
Além disso, o medo maior dos gestores deve estar relacionado à sobrevivência da empresa por não acelerar a inovação, o que pode servir como incentivo para a adoção da forma aberta de inovar. Capacitar as equipes, buscar conhecimento externo por meio de consultorias, contratações ou parcerias, integrar ecossistemas de inovação, visitar empresas que já praticam inovação aberta, são algumas dentre várias ações que podem e devem ser realizadas pelas empresas que ainda não adotaram esse modelo. Tudo isso precisa estar conectado com uma visão estratégica, almejando resultados que virão no médio e longo prazo, dando sustentabilidade aos negócios e à empresa como um todo. Portanto, é fundamental que as ações e a superação de medos sejam iniciadas o quanto antes, ou pelo menos antes que os concorrentes o façam.
LEIA TAMBÉM:
SIGA NOSSAS REDES