Desafios da saúde do futuro: “mudar o mindset do setor e tornar a digitalização mais acessível”

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Desafios da saúde do futuro: “mudar o mindset do setor e tornar a digitalização mais acessível”

Para Diogenes Silva, médico e CEO da Anestech, o uso de dados e a telemedicina geram tendências como desospitalização e tratamentos clínicos em domicílio.

Diagnóstico é do médico anestesiologista Diogenes Silva (foto), CEO da healthtech catarinense Anestech. Para ele, o uso intensivo de dados e a telemedicina geram novas tendências: desospitalização e tratamentos clínicos em domicílio. 


[FLORIANÓPOLIS, 09.12.2020]

Redação SC Inova, scinova@scinova.com.br 

Uma sociedade 5.0 é aquela na qual tecnologias como Big Data, Inteligência Artificial e Internet das Coisas (IoT) são usadas para criar soluções com foco nas necessidades humanas – especialmente na área da saúde. O maior desafio, porém, é a universalização da saúde digital, o que demandaria “mudar o mindset de todo um setor”, comenta o médico anestesiologista e CEO da Anestech Innovation Rising, Diogenes Silva.

A startup, que desenvolve tecnologia e inteligência de dados perioperatórios, promoveu no final de novembro um evento digital – o Anestesia 4.0 – para debater as tendências deste mercado, utilização de soluções inovadoras e cases. Em resumo, ainda que a inteligência artificial seja um caminho sem volta para o segmento de saúde, sua aplicação ainda está muito distante da realidade de profissionais e pacientes.

Em termos de negócios, a plataforma de business intelligence em nuvem e aplicações mobile para salas de cirurgia desenvolvida pela empresa vai bem: em 2020 a empresa cresceu 277%, somando 2 mil anestesiologistas e mais de 1,2 mil instituições atendidas no Brasil e no exterior. A Anestech já passou pelo programa Scale-up Endeavor e é um das healthtechs catarinenses aceleradas no Eretz.bio, braço de desenvolvimento de startups do Hospital Albert Einstein.  

“Temos mais de meio milhão de registros anestésicos muito bem parametrizados e uma parte deles serve para o aprendizado de máquina (Machine Learning), formando uma consciência situacional artificial que estará pronta a ajudar o anestesiologista a não deixar passar batido detalhes importantes ou ajudar nas informações necessárias para um ato anestésico mais seguro e confortável”, explica Diogenes.  

Nesta entrevista para o SC Inova, o médico e empreendedor detalha um pouco do cenário de inovação na saúde, o que é preciso mudar para ampliar o atendimento digital e as perspectivas para empresas de tecnologia neste setor.


SC INOVA – A digitalização é um caminho sem volta na medicina?

DIOGENES SILVA – Sim, sem dúvida. A medicina incorpora novas tecnologias desde sempre. Um exemplo é a invenção do estetoscópio, uma inovação de René Laennec de 1818 e, para a época, alta tecnologia prontamente adotada pela maioria dos médicos. Isso se repete com pulmões de aço, tomografia e a própria anestesia. Portanto, a incorporação constante de novas tecnologias para prestar atenção à saúde das pessoas é um hábito na medicina 

Assim como o mercado financeiro que hoje é 100% digital, o cuidado com a saúde das pessoas vai tornar-se também 100% digital e já está próximo disso, com enormes vantagens para todos os envolvidos, mas principalmente em eficiência ao tratamento do paciente e sustentabilidade econômica.


SC INOVA – O que falta para uma universalização do uso da tecnologia na área de saúde? O que precisa ser mudado?

DIOGENES SILVA – Encontramos resistência em três frentes e todas elas calcadas no que é mais moroso e resistente à transformação digital: a cultura. Primeiro, há a resistência da classe de prestadores de serviço em saúde que, como toda a classe, tende a entrar em uma zona de conforto e afastar-se da inovação, ou criticar e combater antes de entender os benefícios ao paciente e à sua própria rotina. 

O CEO da Anestech durante o evento anual (e agora online) da empresa: “a melhor maneira de contornar essas resistências à tecnologia é com um sólido ecossistema inovador”

Em segundo lugar, a resistência dos órgãos reguladores, que não possuem em seu DNA a vocação por inovação, pelo contrário. A Telemedicina foi barrada e mal-interpretada pelos órgãos reguladores e acabou se tornando uma prática corriqueira na atenção à saúde na atualidade. Por fim, o próprio mercado, com players consolidados que resistem às novidades com um ímpeto cego de manutenção do status quo, sem se conectar com inovações e novas tendências com medo ou ressentimento de estar perdendo negócios.

A melhor maneira de contornar essas resistências é com um sólido ecossistema inovador, promovendo a digitalização da saúde de maneira descentralizada, acessível, mais eficiente e que coloque o paciente no centro do processo, e não o produto ou o profissional de saúde.

SC INOVA – Em uma cenário global, como está o Brasil no desenvolvimento e uso de tecnologia para saúde? 

DIOGENES SILVA – Nosso maior problema é também nossa maior vantagem. O Brasil é visto como um mercado de saúde complexo, fechado, altamente regulamentado e ainda atrasado do ponto de vista de conceitos atuais como o impacto de remuneração baseado em performance e valor e não em volume de atendimentos. 

A visão externa é que temos ainda desafios muito básicos a serem resolvidos, como a simples digitalização de prontuários e eliminação do papel, ou a construção de infraestrutura para isso ser possível. Apesar de players internacionais não enxergarem a inovação brasileira em saúde como competitiva por causa dessas características, para os empreendedores brasileiros é uma oportunidade gigantesca, com mais de 200 milhões de vidas.


SC INOVA – Quais as principais tendências? E no que você aposta?

DIOGENES SILVA – Acredito muito em um futuro com acesso à saúde mais universalizado e com melhores desfechos, com tratamentos personalizados e profissionais de saúde trabalhando de maneira mais integrada a partir da interoperabilidade de dados. As principais tendências são a desospitalização e tratamentos clínicos em domicílio, telemedicina, pacientes com mais opções de escolhas para sua saúde e a quebra de fronteiras e barreiras para atenção à saúde. 

Eu aposto na importância dos dados, o aprendizado de máquina e a capacidade preditiva, onde as informações da vida de uma pessoa em conjunto com os da atenção à sua saúde podem prever ocorrências e problemas permitindo que profissionais de saúde ajam de maneira precoce, potencializando os conceitos de saúde primária.

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