Após um período de alta no mercado de venture capital no Brasil, como captar recursos em um cenário de extrema incerteza e volatilidade? Tema foi debatido entre investidores-anjo e gestores de fundos de seed e venture capital durante o Funding Talks. / Foto: Agência Brasil
[CURITIBA/FLORIANÓPOLIS, 20.03.2020]
Por Fabrício U. Rodrigues, editor SC Inova scinova@scinova.com.br
Em tempos de pandemia global, o assunto que mais interessa, no curtíssimo prazo, é a preocupação com a saúde da população e, no ambiente corporativo, a ordem da vez é também segurar o caixa ao máximo (“cash is king” é o novo mantra) para tentar superar o momento mais complexo da história recente na economia global.
Mas pensando um pouco além, quais são a partir deste momento as condições para que empresas inovadoras, que demandam capital externo, consigam captar investimentos de risco para desenvolver suas soluções?
“A maioria dos fundos de venture capital no Brasil, em diversos estágios, acabou de fechar captação. Ou seja, há muito dinheiro em caixa para aportes, mas isso não para amanhã e sim para os próximos três, quatro anos… A tomada de decisão dos fundos será cada vez mais cética a partir desse cenário”, avalia Lucas de Lima, CEO e cofundador do Caravela Capital, durante o Funding Talks, evento que reuniu empreendedores, investidores-anjo e fundos com atuação no mercado de tecnologia do Sul do país, no dia 12 de março, na sede da aceleradora Jupter, em Curitiba. O Caravela, por exemplo, foi criado há poucos meses e pretende investir R$ 75 milhões nos próximos anos em startups com atuação na região Sul do Brasil.
Mariana Foresti, do fundo Honey Island Capital, que já investiu em seis startups – entre elas as joinvilenses Transfeera e Treasy – avalia a possibilidade de resguardar recursos para apoiar as empresas do portfólio em follow-ons em vez de ampliar o número de investidas. “Não dá pra parar e achar que não terá mais capital no mercado. Contudo, a barra deverá ficar mais alta para quem busca novos investimentos. O tempo e o esforço para levantar essa captação será maior”.
Outra recomendação às startups é revisar o forecast (previsão de receitas) e, consequentemente, seu valuation. “Há quem chegue dizendo que vai crescer 200% ao ano, mas tem que rever tudo isso. Segurem caixa, reduzam despesas, a gestão tem que ser muito mais apurada para sobreviver a esse cenário”, comenta Renan Schaefer, diretor de Novos Negócios e Parcerias da fintech A55, que financia empresas com modelo de receita recorrente.
CENÁRIO DE VOLATILIDADE E MUDANÇA COMPLETA DE ROTA
O ano de 2020 começou com a certeza de que os investimentos em renda fixa no país – afetados pela redução sequencial da taxa Selic, hoje em 3,75% – migrariam para opções multimercado e, em parte, para capital de risco e fomento a startups. Mas tudo mudou em poucas semanas, com quedas bruscas na Bolsa e novas perspectivas a quem tem capital:
“Tivemos um 2019 foi atípico, com bolsa crescendo mais de 30%. Mas com os efeitos do coronavírus no mercado e os papéis em baixa, você tem novas opções de investimento que podem fazer mais sentido, como comprar ações da Petrobras a R$ 12, em vez de deixar recurso alocado de cinco a sete anos numa startup”, pondera Felipe Abelha, da Trivèlla M3, gestora que atua com foco em empresas de maior porte, responsável pelo aporte recente de R$ 15 milhões na AMCom, de Blumenau.
“Nós estávamos em um momento de abundância com bolsa ‘bombando’, overdose de capital de risco, valuations irreais, e ao mesmo tempo um cenário de recessão, com empresários em dificuldade de fluxo de caixa”, compara Thiago Ayres, integrante do grupo de investidores-anjo Curitiba Angels. Ele analisa que o choque atual “é um movimento de correção. Se a startup souber enxugar a proposta e buscar onde está o capital real, a tendência é crescer depois de corrigir. Invariavelmente, para o investidor haverá outras opções mas para quem busca capital vai ficar, de novo, mais difícil”, resume.
“O Covid-19 acelerou uma mudança drástica de maneira sem precedentes na historia moderna e ninguém nessa geração viu algo semelhante ao que estamos passando”, diz Bruno Dequech Ceschin, cofundador da aceleradora Jupter.
O grande desafio às empresas neste período, é entender como fazer vendas de maneira digital e como se lidar financeiramente com um ciclo de vendas que pode ser duas a três vezes mais longo, em média, do que acontecia antes da pandemia. Mas Bruno também ressalta: “a safra de investimento que nasce em tempos de crise são os que geram os melhores retornos”.
O Funding Talks teve realização conjunta entre Jupter, Curitiba Angels, A55, Honey Island Capital, Hotmilk, Trivèlla M3, com apoio do SC Inova, Distrito e curadoria da AWS.
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