Superando o dilema de inovar nos programas entre empresas e startups

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Superando o dilema de inovar nos programas entre empresas e startups

Grandes empresas e startups operam por lógicas diversas, o que demanda instrumentos jurídicos para dar conta dessa complexidade.

Grandes empresas e startups operam por lógicas diversas, com cultura e valores que geralmente não guardam muitas semelhanças – o que demanda instrumentos jurídicos para dar conta dessa complexidade. Foto: QArea Inc. (Unsplash)


[16.02.2022]


Por Rhodrigo Deda, advogado e doutorando em Engenharia de Software; head de Direito Digital e Nova Economia do Marins Bertoldi Advogados

As parcerias entre empresas e startups enfrentam um grande desafio – como tornar possível a colaboração para inovar de forma ágil e, ao mesmo tempo, com a segurança necessária para que sejam bem-sucedidas. Num primeiro olhar, o leitor poderia dizer: “Impossível. Ou se trabalha de modo ágil e inovador, reduzindo controles. Ou de forma lenta e segura, minando a capacidade criativa”.

Esse dilema não é de solução fácil, mas uma diligente gestão de contratos e propriedade intelectual permite resolver os principais obstáculos.

Grandes companhias e empresas nascentes podem firmar parcerias sob vários formatos, como programas de inovação aberta ou compartilhamento e exploração de propriedade intelectual. A inovação aberta, muito popular hoje em dia, é uma modalidade abrangente que cobre vasto número de iniciativas no mercado.

As mais frequentes tratam de programas de desenvolvimento de startups com o fim de resolver problemas específicos e criar soluções inovadoras par o setor em que as empresas atuam. Esses programas geralmente começam com editais de chamamento, as startups selecionadas passam por algumas etapas de desenvolvimento de produto, até aprofundarem a relação com a empresa ou o conjunto de companhias que patrocinam o projeto. Esse aprofundamento pode ocorrer mediante investimento nas startups, aquisição, compartilhamento de propriedade intelectual ou segredos comerciais, entre outras possiblidades.

O problema é que no decorrer da relação entre elas, ocorrem conflitos por conta das diferentes expectativas, interesses e procedimentos adotados. Grandes empresas e startups operam por lógicas diversas, com cultura e valores que geralmente não guardam muitas semelhanças.

Por esse motivo, quando programas de inovação aberta são criados, é necessário o uso de instrumentos jurídicos que deem em conta dessa complexidade. Não se trata de um dilema entre demasiada de formalidade e controles, para agradar as grandes empresas, e informalidade e abertura excessiva, ao gosto das startups.

QUATRO PASSOS PARA RESOLVER O DILEMA 

Geralmente programas de inovação aberta iniciam com acordos mais genéricos ou informais e, na medida em que a relação vai se desenvolvendo, a cada etapa vai se adicionando modalidades de contratos mais específicos e formais. O objetivo, sempre, é que a relação possa fluir com confiança entre as partes. Precisam se sentir confortáveis para colaborar, na medida em que cresce o compromisso entre elas, e, por consequência o investimento em tempo, dinheiro e compartilhamento de segredos comerciais e industriais. 

Como não é fácil fazer isso acontecer, propõe-se a seguinte abordagem em quatro etapas.

1) PROPÓSITO

A primeira delas é a compreensão do propósito do programa de inovação. É preciso responder à pergunta: O que queremos ao final do programa?

A intenção pode ser investir em startups que estão validando o modelo de negócio, ou naquelas que já possuem produto aderente ao negócio da empresa. A ideia pode ser a de realizar aquisições ao final do programa de inovação. Ou, ainda, pode ser compartilhar propriedade intelectual para exploração da startup ou conjuntamente. Os patrocinadores do programa precisam ter o propósito muito claro para que possam concentrar sua atenção em atingi-lo. Essa definição será crucial para realizar o próximo passo.

2) INTERESSES

A segunda etapa é o entendimento dos interesses. Uma vez compreendida a intenção do programa, é preciso compreender o nicho de mercado e avaliar adequadamente os interesses das startups. A pergunta aqui é: Por que as startups irão aderir à nossa iniciativa?

Respondê-la vai permitir alinhar os interesses quando houver a elaboração dos instrumentos contratuais. Um programa que pretende investir em startups precisa se conectar com aquelas que querem receber investimentos. Os interesses precisam ser satisfeitos por empresas e startups, para que atendam às expectativas de todos, atraindo os times mais talentosos do mercado.

3) PROGRAMA DE INOVAÇÃO

A terceira etapa será a de compreender a íntegra do programa de inovação. O objetivo é o de estabelecer quais serão as soluções contratuais jurídicas utilizadas em cada etapa, na medida em que as relações entre empresas e startups forem se aprofundando. A pergunta a ser respondida, neste caso, é: como vai funcionar o programa de inovação?

Muitos deles operam na lógica do funil, começando bastante amplos e vão afunilando, a fim de encontrar os melhores modelos de negócio. Outros já preferem estabelecer um valor que poderá ser investido ao final, optando por startups mais maduras desde o início, mas que passam por análises do modelo de negócio, evoluindo para provas de conceito, trabalhando muito próximo do núcleo das empresas.

Cada programa terá suas necessidades contratuais, que podem envolver editais de chamamento, NDAs, memorandos de entendimento, contratos de investimento, M&A. E cada um deles, uma vez definidos, terão de ser elaborados com base nas premissas do quarto passo a seguir.

4) ANÁLISE DE RISCO

Na quarta etapa, uma vez definidos quais serão os instrumentos jurídicos, para cada um deles recomenda-se a realização de análise de risco, a fim que possam estabelecer dispositivos contratuais e controles adequados, equilibrando a relação entre startups e empresa.

Aqui duas perguntas devem ser respondidas: Quais riscos precisam ser considerados para que o contrato dê segurança às partes? Quais controles, dispositivos ou procedimentos podem ser modulados, a fim de acelerar a inovação? A partir dessas questões é possível fazer a gestão de riscos e elaborar cada um dos instrumentos contratuais.

O dilema agilidade e inovação versus segurança e controle, portanto, pode ser resolvido empregando esta técnica de gestão jurídica de contratos. Requer, é claro, conhecimentos especializados sobre inovação, técnicas para descoberta dos interesses das partes interessadas, análise e a administração de riscos, bem como propriedade intelectual e contratos. Mas, a partir das quatro etapas apresentadas, é perfeitamente possível superar conflitos e apoiar programas de inovação para que sejam bem-sucedidos e lucrativos.

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