“Queremos escalar e crescer, mas as vezes é necessário pisar no freio sem precisar parar ou mesmo diminuir muito a velocidade”
por Marcelo Amorim*
Começo por avisar: este artigo não tem a menor intenção de estabelecer conceitos e muito menos de provar pontos de vista sobre a processo de crescimento e amadurecimento das startups brasileiras em sua jornada. É somente uma visão e reflexão sobre o que tenho visto e participado através de minha atuação como empreendedor, investidor e gestor na área de venture capital.
Sempre que eu participo de reuniões, pitches e eventos onde temos a oportunidade para encontrar e conversar com empreendedores e investidores, o tema da conversa acaba invariavelmente se concentrando nos desafios de uma startup crescer em escala nas diversas fases de seus primeiros anos de vida.
É claro que este é o foco mais imediato e muitas vezes o mais desafiador. Sem um crescimento constante e com velocidade, muitas empresas não conseguem atingir seus objetivos e, mais ainda, não conseguem aproveitar a oportunidade de concretizar a visão que os empreendedores acreditam. A pergunta é: como escalar o meu negócio na velocidade correta e no melhor modelo possível no meu mercado?
É evidente que podemos fazer (e muitos já fizeram) vários livros sobre o desafio de crescer em escala e encontrar o melhor modelo de negócio para uma empresa, mas aqui quero ressaltar um aspecto relevante deste processo e que tenho visto acontecer com muita frequência. Um caso singelo ilustra bem o que às vezes acontece no processo de “escalar” rapidamente uma empresa, um projeto ou até mesmo uma cidade ou família.
Um sitiante no interior de São Paulo era bem conhecido pela sua motivação e vontade de trabalhar. Tinha um pequeno negócio de vendas de frutas para atacadistas direto dos produtores. Basicamente ele comprava diretamente frutas dos produtos de sua região e revenda para atacadistas na Capital. Como ele conhecia bem as margens das frutas, ele concentrou-se em trabalhar com melancia. Tinha uma boa margem, era pouco perecível e havia uma demanda boa durante o ano inteiro.
Conseguiu uma boa “tração” saindo de poucos clientes para dezenas de clientes em menos de seis meses. Neste momento, já com um caminhão maior e dois ajudantes, ele percebeu, de forma empírica, que não conseguia ter os resultados que ele previa quando investiu no caminhão novo e na contratação dos dois funcionários – e continuava sem aproveitar toda a capacidade de carga do novo caminhão.
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Logo, ele viu que a forma de carregar o caminhão que ele mesmo tinha ensinado a sua equipe não estava “otimizando” todo o volume possível da caçamba do caminhão. Além disso, por causa da velocidade e “desarrumação”, muitas vezes as frutas caiam do caminhão e ficavam inúteis. Frequentemente, as frutas ocupavam um espaço maior na caçamba porque eram colocadas sem nenhuma ordem ou prioridade.
Ele percebeu que precisava mudar a forma como os dois ajudantes colocavam as frutas para dentro do caminhão além rearranjar as frutas durante a coleta. Ele foi bem-sucedido nessa mudança, mas ainda tinha outro problema: após algumas coletas, as frutas não estavam empilhadas e organizadas na caçamba. Como ele era um empreendedor muito antenado, ele logo sacou que se, após as coletas maiores, ele desse uma freada brusca no caminhão, as melancias se acomodavam melhor na caçamba e assim ele poderia voltar a colocar mais melancias otimizando o espaço e consequentemente a sua capacidade de vender mais melancias continuando a crescer seu negócio.
Como investidor, eu sou o primeiro a querer um crescimento acelerado mas é importante ter momentos de arrumação para não perder o foco e os objetivos de longo prazo
Esta é uma forma bem humorada de ressaltar que, na execução de um plano de negócios, nós planejamos e queremos escalar bastante nossa empresa. Dedicamos muitos recursos, aceleramos os processos, levantamos capital e pisamos fundo no acelerador. É isto é o que queremos para ver nosso sonho em execução e, em geral, todos (equipe, fundadores, investidores e até mesmo clientes) estão com o mesmo foco.
Como no caso do nosso amigo das melancias, queremos crescer em escala, mas as vezes é necessário dar “um tranco no freio” sem precisar parar ou mesmo diminuir muito a velocidade. Assim as coisas podem se organizar melhor e continuarmos a estrada onde planejamos executar nosso plano.
Como empreendedor e investidor, eu sou o primeiro a querer um crescimento acelerado e a execução do plano onde nós aportamos recursos, mas é importante ter momentos de arrumação onde temos que questionar se o que estamos executando está sendo feito da forma mais otimizada possível e se temos que fazer correções pequenas ou mesmo significativas para não perdermos o foco e os objetivos a longo prazo.
Em algumas ocasiões, faço um comentário com os empreendedores de nossas investidas que não temos que gastar aquilo que foi previsto no plano somente porque faz parte do plano. Se algo não funciona e você já regularmente insistiu por algum tempo, as vezes é melhor e mais indicado “dar uma freada”, analisar como usar melhor os recursos que você tem à disposição e depois pisar novamente no acelerador.
* Marcelo Amorim é investidor e sócio da Bzplan – Investindo em Empresas Inovadoras
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