Por que as smart cities estão falhando em ser human cities — e como corrigir isso antes que a tecnologia nos engula e determine como devemos viver. / Imagem: ChatGPT
[24.06.2025]
Por Jean Vogel, presidente da Câmara de Smart Cities da FIESC e CEO da Ecosystems.Builders
Alguns conceitos de cidades inteligentes prometem resolver os maiores gargalos urbanos com tecnologia: mobilidade autônoma, segurança preditiva, consumo energético otimizado, gestão de resíduos automatizada e conectividade ilimitada.
Mas há um problema emergente e pouco discutido, mas cada vez mais visível: a alienação social e o empobrecimento do espaço público humano. Estamos em busca da construção de sistemas operacionais urbanos eficientes que esquecem da essência da vida urbana: as pessoas.
Eficiência não é sinônimo de bem-estar. Muitas cidades priorizam sensores, digitalização e algoritmos de automação, mas negligenciam algo crucial: o valor do encontro, do imprevisto, do caos criativo das ruas. Ao eliminar fricções urbanas, estamos também eliminando nuances culturais e interações espontâneas que fazem uma cidade viva.
A TECNOLOGIA NÃO ENTENDE AFETO
Quando algoritmos e tecnologias começam a decidir onde e como alocar recursos, corremos o risco de amplificar desigualdades históricas. O que não é medido não é gerenciado, e aquilo que é subjetivo, emocional, comunitário, raramente entra nas planilhas.
E o resultado? Uma cidade que opera como uma máquina, mas que não toca ou conecta as pessoas.
SMART ≠ WISE
Uma cidade pode ser tecnologicamente inteligente e socialmente burra. É aí que entra a necessidade de um novo conceito: cidades sensíveis. Espaços que combinam inteligência digital com inteligência emocional, onde a tecnologia serve às pessoas – não o contrário.
Quer um exemplo? Songdo, Coreia do Sul
Planejada como uma das cidades mais inteligentes do mundo, Songdo tem sensores por toda parte e sistemas integrados de informação. Mas é frequentemente citada como “fria” e “sem alma” por moradores e visitantes. A eficiência não compensou a ausência de vida urbana autêntica. Cafés independentes deram lugar a redes padronizadas, e as ruas, embora limpas e seguras, carecem de vitalidade.
E POR ONDE COMEÇAR?
- Design urbano orientado à empatia: incorporar métricas de bem-estar emocional, pertencimento e diversidade social ao planejamento urbano.
- Infraestrutura para o acaso: criar espaços que estimulem o imprevisível: feiras, praças, cafés e ruas vivas, ao invés de ambientes controlados e previsíveis – como vias com cada vez mais faixas para veículos.
- Tecnologia como meio, não fim: usar tecnologias, IA e big data para ouvir, e não apenas monitorar. Traduzir sentimentos urbanos em decisões políticas e, principalmente, arquitetônicas.
- Governança com escuta ativa: plataformas digitais devem ampliar o diálogo público, não substituí-lo. Democracia sensível precisa de tecnologia com propósito e humildade.
A cidade do futuro não será a mais automatizada e sim aquela que melhor conseguir conectar pessoas, culturas e afetos com o desenvolvimento de negócios.
Cidades verdadeiramente inteligentes serão aquelas que souberem escutar e adaptar a tecnologia ao ritmo humano. Do contrário, corremos o risco de viver em cidades perfeitas, porém vazias e sem alma.
LEIA TAMBÉM:
SIGA NOSSAS REDES