Empreendedor que migrou do marketing para o venture capital, Anderson de Andrade acredita que o ecossistema de inovação está “sincronizado como nunca” – mas é preciso ajudar os donos do capital “tradicional” a entender o mundo das startups.
[FLORIANÓPOLIS, 10.09.2020]
Por Fabrício U. Rodrigues, editor – scinova@scinova.com.br
“Este é o melhor timing para o ambiente de startups”. A aposta é de Anderson de Andrade, empreendedor que começou no mercado de tecnologia, criou uma agência de referência no setor de comunicação e marketing digital, se tornou investidor anjo e hoje é um dos sócios da Invisto, um hub de investimentos criado a partir da fusão da gestora Bzplan e do braço de venture capital da FIR Capital. Recentemente, o grupo anunciou um fundo de R$ 100 milhões para investir negócios inovadores do Sul do Brasil, aportou R$ 1 milhão na startup de logística Equilibrium e entrou na rodada de follow-up à Gofind, de Joinville. (tudo isso noticiado aqui pelo SC Inova).
Na visão de Anderson, o choque provocado pela pandemia – e que de fato segurou os investimentos em startups mundo afora num primeiro momento – “nos jogou à fórceps em um novo momento, uma revolução tecnológica sem precedentes. A Magalu, por exemplo, fez a quinta aquisição de startup agora, e isso é só o começo”.
Anderson começou a empreender no início dos anos 2000, em uma incubadora em Joinville, em um projeto “ponto com” que acabou não vingando mas que se tornou o embrião da A2C, agência de comunicação digital com unidades no Norte de SC e em São Paulo que foi recentemente adquirida pela BriviaDez.
Em quase duas décadas no mercado, ele acompanhou o surgimento de novas metodologias de gestão e negócios, foi também cofundador do Clube de Autores – plataforma pioneira no país para autopublicação de livros – e, desde 2014, começou a atuar como investidor anjo no ecossistema de tecnologia catarinense. Em 2018, entrou na sociedade da BZPlan/FIRCapital, que já tinha um portfólio relevante de startups em Santa Catarina e no Paraná e fazia a gestão de dois fundos de venture capital.
Hoje, recebendo centenas de decks de startups por semana, ele calcula informalmente que o mercado de startups, só na região Sul, tem uma demanda de pelo menos meio bilhão de reais. “Isso para surprir uma demanda que já existe, de boas empresas. O dinheiro está aí, mas o que falta é conhecimento de como operar venture capital de maneira séria e estruturada. São as iniciativas de educação de investidores que vão mudar o mercado. Por isso, o movimento de grupos de investimento anjo que começam a surgir são muito relevantes”, explica Anderson neste papo exclusivo para o SC Inova.
SC INOVA – Por alguns meses, neste ano, deu-se a impressão que a fonte secou para investimentos, em função da pandemia. Vocês também pensaram dessa mesma maneira, mudaram o radar de investimentos ou seguiram com o planejamento?
ANDERSON DE ANDRADE – Março, de fato, foi um mês tenso, olhamos muito para nosso portfólio, mas não paramos, inclusive ampliamos o time para ampliar nosso posicionamento no mercado. Depois começou a ter essa redução nas taxas de juros, o crescimento do número de pessoas físicas na Bolsa de Valores…. o dinheiro não desapareceu. Dentro da estratégia de investimento, o venture capital acabou ganhando força, porque está ligado a inovação, à transformação digital. E começamos a ver novos aportes, o mercado de fusões e aquisições (M&A) crescendo muito também. Nosso portfólio cresceu 27% em receita bruta no primeiro semestre de 2020 em comparação o mesmo período do ano passado.
Percebemos, no Brasil e no mundo, a aceleração de redes e grupos organizados de investidores. Nós temos um gap de capital de risco no país: precisaríamos de algo em torno de R$ 3 a R$ 4 bilhões para startups. Na região Sul, a necessidade é de pelo menos uns R$ 500 milhões. E esse recurso existe, o que falta são projetos para alocação e gestão de recursos. Nosso primeiro fundo, de R$ 100 milhões, já é relevante, mas pode ser que ele esteja muito maior nos próximos anos.
SC INOVA – Recentemente, noticiamos a criação e o crescimento de grupos de investidores-anjo em várias regiões de Santa Catarina. E em todas iniciativas, fala-se que há uma demanda por “educação de investidores” para o mercado de startups. Como é possível agregar o dinheiro da economia tradicional?
ANDERSON DE ANDRADE – As iniciativas de educação de investidores vão mudar o mercado, pois o dinheiro está aí. Hoje a Comissão de Valores Mobiliários permite o investimento de pessoas físicas em startups. E projetos/empresas não faltam, o que que falta é o conhecimento de como operar venture capital de maneira séria e estruturada. Por isso o movimento de grupos tem uma relevância muito grande.
Em 2014 eu decidi estudar para ser investidor anjo. As redes, o ecossistema, não existiam naquela época e os movimentos eram muito isolados. Desde então fiz 25 investimentos em startups que atuam no modelo de software como serviço para o mercado corporativo (B2B), como Simplus, Área Central, Treasy, Transfeera, Organizze, participo da aceleradora Spin, voltada à indústria. Foram sete anos construindo um portfólio e planejando o próximo passo que era estar em uma gestora.
“Nós temos um gap de capital de risco no país: precisaríamos de algo em torno de R$ 3 a R$ 4 bilhões para startups. No Sul, pelo menos uns R$ 500 milhões”.
Nem tudo deu certo, perdi recursos no começo. Mas o caminho para quem quer começar a investir é participar de projetos, fundos ou gestoras com estratégia clara e sérias. A tríade é: liquidez (como o fundo busca condição de saída dos investimentos), rentabilidade (não esperar 10 ou 15 anos para negociar uma venda, às vezes a saída pode ser rápida) e segurança ao escolher uma empresa para investir.
SC INOVA – Como vocês estão buscando startups nesse cenário pós-pandemia? O que chama mais atenção neste novo momento?
ANDERSON DE ANDRADE – Nesse 2020 estamos percebendo uma oferta muito maior de startups. Recebemos centenas de decks semanalmente e temos uma disciplina para dar retorno, filtrando as propostas, avaliando semanalmente e monitorando as informações dessas startups.
Temos um nível educacional muito grande aqui na região. Projetos como o StartupSC e outros aceleraram a maturidade de empreendedores e projetos, todos chegam muito bem preparados para o pitch. E em geral são founders com experiência de mercado, na faixa dos 35, 40 anos. Hoje observamos o conjunto: o potencial do mercado em que a startup atua, a qualidade e a sinergia entre os sócios, por exemplo.
SC INOVA – Ou seja, a competição está mais acirrada do que nunca?
ANDERSON DE ANDRADE – Este é o melhor timing para o ambiente de startups. A pandemia nos jogou à fórceps em um novo momento, uma revolução tecnológica sem precedentes. Há uma sincronização do ecossistema como nunca: a necessidade de gerar empresas velozes, mas com um mínimo de governança adequada ao momento, o empreendedorismo ligado ao venture capital em todas as pontas, novos modelos de investimento (parceria, stock option, vesting). É um grande momento para criação de valor e distribuição de riqueza.
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