Ecossistemas precisam estimular mecanismos de financiamento ao empreendedorismo inovador

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Ecossistemas precisam estimular mecanismos de financiamento ao empreendedorismo inovador

É papel dos ambientes locais de inovação realizar diferentes ações para desenvolver e atrair fundos e outras modalidades de capital empreendedor

É papel dos ambientes locais de inovação realizar diferentes ações para desenvolver e atrair fundos e outras modalidades de capital empreendedor (subvenções, subsídios ou empréstimos). Imagem: Proxyclick (Unsplash)


[18.04.2023]


Por
Marcus Rocha, especialista em Ecossistemas e Habitats de Inovação e Gerente de Inovação e Startups do Sebrae/SC.
Escreve quinzenalmente sobre o tema no SC Inova. 

Este é o artigo número 50 deste colunista no SC Inova. Já são mais de 2 anos de uma parceria muito bem sucedida com o portal, escrevendo sobre os desafios de Ecossistemas, Comunidades e Habitats de Inovação. 

O assunto de hoje é a necessidade de capital para financiar o empreendedorismo inovador nos ecossistemas locais de inovação. 

O empreendedorismo é uma atividade econômica que, em maior ou menor grau, depende de capital. Além da necessidade cotidiana de recursos financeiros para dar suporte às operações das empresas, volta e meia também é necessário buscar mais dinheiro para realizar investimentos que devem proporcionar elementos de vantagem competitiva, de forma a garantir não apenas a sobrevivência, mas principalmente o sucesso dos empreendimentos em relação aos seus concorrentes.

Nesse contexto, o empreendedorismo inovador é totalmente dependente de investimentos. Inicialmente, pela necessidade de desenvolver inovações e, quanto maior o nível de ineditismo do produto ou serviço a ser criado, a tendência é que maior também será a necessidade de recursos financeiros a serem investidos. Posteriormente, considerando os modelos de negócio altamente escaláveis de startups e scale-ups, é necessário novamente investir para proporcionar a expansão dos negócios com a velocidade necessária, para aproveitar ao máximo as oportunidades criadas pelas inovações desenvolvidas.

Paralelamente, para que o ecossistema local de inovação tenha um desenvolvimento sustentado e, idealmente, perene, é necessário também investir em diversas ações mais estruturantes para a promoção do empreendedorismo inovador em geral. Considerando os riscos inerentes aos empreendimentos inovadores – tecnológicos, mercadológicos, regulatórios, etc. – essas ações são fundamentais para gerar um volume inicial grande de ideias de novos negócios, que passam por uma espécie de ‘seleção natural’ por conta dos riscos já citados. Assim, após um determinado período, o ecossistema passa a contar com um volume expressivo de startups e outras empresas inovadoras bem-sucedidas. Ao manter esses serviços ativos, cria-se um fluxo contínuo de empreendedorismo que pode proporcionar a sustentação do ecossistema no longo prazo.

DESENVOLVIMENTO DE REDES, CANAIS DE COMUNICAÇÃO E ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA 

Parte dessas ações estruturantes, em especial eventos de inovação, programas de pesquisa e desenvolvimento tecnológico (P&D) pré-incubadoras, incubadoras, aceleradoras, programas de inovação aberta, entre tantas outras, também precisam ser desenvolvidas sob uma ótica setorial, para reforçar a competitividade dos principais setores econômicos do território do ecossistema. Essas devem ser as diferentes frentes a serem investidas principalmente pelas empresas estabelecidas, a partir de estratégias de inovação aberta

Nota-se que essas diferentes frentes de trabalho precisam atuar de uma forma minimamente integrada, para que o ecossistema local de inovação seja bem-sucedido. Nesse sentido, é fundamental o desenvolvimento de redes, de canais de comunicação, e de estruturas de governança. E, considerando a necessidade de capital para alimentar todas as iniciativas já descritas, tudo isso também deve servir para criar os respectivos mecanismos de financiamento e investimento.

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Quando o ecossistema não está suficientemente desenvolvido, a disponibilidade de recursos financeiros para inovação ocorre de maneira mais individual, o que pulveriza a comunicação das diferentes ofertas, tende a diminuir os valores médios ofertados e, somando esses e outros fatores, dificulta o acesso por quem está buscando capital. Quando as redes do ecossistema se fortalecem, há o caminho para desenvolver mecanismos mais concisos e convergentes com a realidade de cada local.

Um ponto fundamental nisso tudo é a conexão com os planos estratégicos do ecossistema local de inovação, principalmente conectando a oferta de capital com os setores tecnológicos estratégicos, organizados da forma de clusters com governança e portfólio de ações que efetivamente promovam o empreendedorismo inovador. Quando isso acontece, há uma facilidade maior para o desenvolvimento de mecanismos de financiamento aderentes ao respectivo setor, com linhas de crédito ou teses de investimento mais bem definidas e que têm maiores possibilidades de agregar os diferentes atores que possuem recursos disponíveis para a finalidade de financiar a inovação.

INVESTIMENTO EM STARTUPS NÃO É SÓ VIA VENTURE CAPITAL

Apesar de um certo modismo dos empreendimentos inovadores em relação ao venture capital – muitas vezes traduzido como “capital de risco”, mas que este autor prefere chamar de “capital empreendedor” -, os ecossistemas precisam garantir a oferta de outras modalidades de financiamento. Subvenções, subsídios e empréstimos também precisam também fazer parte das opções disponíveis às startups e outros empreendimentos inovadores. 

Os investimentos de “capital empreendedor” para negócios em estágios iniciais de desenvolvimento disponibilizam recursos para a contratação de talentos, desenvolvimento de produtos, além de serem usados para estruturar as áreas de marketing e vendas. Nos estágios mais avançados, fornece o necessário para acelerar a expansão da empresa, aproveitando ao máximo as janelas de oportunidades em diferentes mercados.

Um ponto importante a ser destacado é que os diferentes veículos de investimento de venture capital compreendem, aceitam e, normalmente, gerenciam todos os riscos inerentes ao empreendedorismo inovador. Além disso, esses mecanismos geralmente têm experiência em trabalhar com startups e outras empresas inovadoras, o que significa que, além do dinheiro, também podem fornecer orientação e suporte valiosos para as empresas investidas. Por isso, é papel dos ecossistemas locais de inovação realizar diferentes ações para desenvolver e atrair fundos e outras modalidades de capital empreendedor, cujas teses de investimento precisam estar alinhadas com o plano estratégico do ecossistema, em especial com os desafios dos setores tecnológicos do local.

Também não se pode esquecer da necessidade de investimentos para os estágios iniciais do desenvolvimento das startups, quando os investidores “anjo” entram em cena. Geralmente, são pessoas físicas que investem em startups em estágios iniciais de desenvolvimento, levando não apenas um volume inicial de capital, mas principalmente suas competências, conhecimentos de mercado e networking, que inclusive podem ser tão ou mais importantes que o dinheiro aportado na empresa.

Investimentos de “capital empreendedor” para negócios em estágios iniciais disponibilizam recursos para a contratação de talentos, desenvolvimento de produtos, além de estruturar áreas de marketing e vendas. Foto:  Scott Graham (Unsplash)

Bons investidores anjo podem fazer total diferença no sucesso de uma startup e é por isso que os ecossistemas precisam trabalhar nisso. Primeiro, estimular e capacitar pessoas para se tornarem ‘anjos’ e, em seguida, criar as redes para integrar os investidores com as startups do território.

SETOR PÚBLICO: FONTE PARA INOVAÇÕES

Outra fonte de recursos financeiros nos estágios iniciais das startups pode ser o setor público. Considerando que, durante esses estágios, os riscos são maiores, é compreensível que haja menor oferta de recursos privados. Considerando este fato e também que os investimentos precisam ser feitos por todos os atores dos ecossistemas, o setor público pode disponibilizar recursos por meio de subvenção (o famoso ‘fundo perdido’) ou subsídios para financiar o desenvolvimento de negócios inovadores nas suas fases iniciais, especialmente para transformar ideias em protótipos ou ‘mínimos produtos viáveis’ (MVP). 

Os recursos podem vir de rubricas do orçamento público, de fundos públicos, ou programas de incentivo fiscal, levadas ao ecossistema por meio de editais aderentes às estratégias setoriais do território e com regras claras para os participantes.

Adicionalmente, muitos ecossistemas locais de inovação têm buscado estimular formas alternativas de financiamento para empreendimentos inovadores. Um exemplo são as plataformas de crowdfunding, que permitem que startups e outras empresas inovadoras levantem capital por meio de uma comunidade online de investidores. Esse tipo de mecanismo aumenta a disponibilidade de recursos e, ao mesmo tempo, amplia a base de investidores.

Para a sustentação dos ecossistemas também é necessário garantir capital para financiar os suporte à inovação. Tipicamente, eventos de capacitação, desafios de inovação, pré-incubadoras e incubadoras, entre outros serviços especialmente focados no estímulo ao empreendedorismo inovador e nos primeiros estágios das startups, não buscam lucro e nem participação acionária nos negócios, por diferentes razões. Novamente, os recursos públicos podem ser uma fonte importante para financiar essas iniciativas, mas não devem ser a única fonte. 

Os recursos podem vir de rubricas do orçamento público, de fundos públicos, ou programas de incentivo fiscal

Considerando tanto a abordagem ecossistêmica, quanto a necessidade das diferentes frentes de trabalho da inovação aberta das empresas estabelecidas, é necessário que esses investimentos sejam compartilhados entre os diferentes atores locais. Assim, prefeitura, câmara de vereadores, governo do estado, entidades do Sistema S, universidades, escolas técnicas, empresas e entidades empresariais precisam compartilhar a responsabilidade pela garantia da operação contínua desses serviços, da forma mais equilibrada possível.

Por fim, os ecossistemas locais de inovação também podem oferecer opções de financiamento mais tradicionais, como empréstimos bancários. Importante destacar que, via de regra, startups não possuem garantias patrimoniais para serem oferecidas para dar aval a financiamentos aos agentes financeiros. Portanto, as instituições financeiras precisam buscar formas alternativas de garantir o aval aos empréstimos concedidos às empresas inovadoras, desenvolvendo meios como seguro fiança acessível, garantia a partir de receitas recorrentes, entre outros. Os demais agentes do ecossistema com disponibilidade de capital também podem se reunir para desenvolver fundos de aval, além de capacitar as startups para buscarem linhas de crédito que sejam compatíveis com as suas necessidades e estratégias.

Há muitos outros pontos a serem abordados, mas esses seriam os principais. O tema do financiamento para as diferentes frentes de trabalho em ecossistemas de inovação é muito importante, dada a necessidade intensiva de capital que já foi descrita no início deste artigo. Em resumo, os ecossistemas locais de inovação são fundamentais para promover mecanismos de financiamento para startups e outras empresas inovadoras, bem como para os serviços de suporte à inovação que geram os empreendimentos inovadores. Por meio de uma abordagem colaborativa e multidisciplinar, esses ecossistemas podem fornecer aos empreendedores os recursos necessários para transformar suas ideias em realidade, impulsionando a inovação, o crescimento econômico e social no território, criando um círculo virtuoso que beneficia toda a sociedade local.

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