Numa sociedade saturada por informação e cansada de fake news, o papel do jornalista está se tornando relevante como nunca foi. Estamos vivendo um momento divisor de águas? / Foto: Sérgio Lima/Poder360
[15.02.2021]
Por Alexandre Adoglio, CMO na Sonica e empreendedor digital.
Escreve semanalmente sobre Cultura Digital para o SC Inova
No final do último milênio uma euforia invadia o mundo contemporâneo perante uma inovação que prometia revolucionar a humanidade, a internet. Muito se falava daquilo que seria o futuro da comunicação humana, com tecnologia gerada nas redes militares norte-americanas e uma sequência de iniciativas de governos e empresas para serem os primeiros a se posicionarem perante o mercado.
Na dinâmica desta nova forma de comunicação, o primeiro jornal diário a criar uma versão on-line foi o San Jose Mercury News, em 1994. Como inovações, a publicação permitia que o leitor interagisse com os conteúdos, através de motores de busca e da navegação; de interagir com os jornalistas, via e-mail; e de participar em fóruns de discussão propostos pelo jornal.
Começava ali a sina pela qual o jornalismo, ou digamos a maestria em pautar informação em comunicação, passaria nas muitas transformações de impacto, que muitos consideram “disruptivas” e alguns de “destrutivas”. Mesmo com o estouro desta primeira bolha da internet e tudo, a forma de transmitir notícia passou por uma metamorfose não só da plataforma papel, mas também da concepção e editoração daquilo que chamamos de informação.
DA APURAÇÃO AO APURO
Pelo final do fatídico 2020 a notícia de que a centenária Editora Abril estava fechando sua última gráfica não foi tão surpreendente para quem acompanhou o declínio e fechamento de seus tradicionais periódicos, como ELLE, Boa Forma e Playboy, sendo provavelmente o capítulo final de um modelo de negócio que agonizou devido à resistência da virada pro digital. Tentativas foram feitas, com um departamento digital sendo criado e até um novo braço de marketplace online com o GoBox, porém nunca se fez de fato um esforço para incorporar o online no negócio, como no caso do The New York Times .
A proliferação de portais de notícia, como UOL, IG, Terra, que não só ofereciam conteúdo gratuito como serviços agregados de e-mail e fotos, acabou empurrando jornais e revistas pro limbo, trazendo a análise superficial e rápida como uma avalanche para quem buscava consistência e profundidade. Não ficamos somente com tristeza pelos profissionais demitidos, mas também pela perda gradual da sabedoria, conhecimento e técnica reconhecidos internacionalmente, que não estavam preparados para a revolução causada pela instantaneidade e capilaridade deste novo meio de comunicação.
O EU DISSEMINADOR
Aquela imagem do jornalista solitário, buscador de informações, farejando aquele furo com aquela fonte sigilosa ficou no passado. Hoje todos são disseminadores de informação, pois com uma simples foto ou vídeo pode-se causar uma revolução, como no ocorrido em 2020 em Minneapolis (EUA), onde uma adolescente registrou um policial contendo de forma agressiva o afro-americano George Floyd, viralizando uma informação que causou protestos por todo o mundo, como relatamos aqui na coluna.
MULTIMÍDIA / TRANSMÍDIA
Termo que nasceu junto com nosso glossário do digital, o conteúdo multimídia também veio se transformando com o tempo, desde quando falávamos do suporte para agora algo mais abrangente como o transmídia, aonde uma mesma informação pode ser acessada pela TV, internet, redes sociais e, até, impresso.
Em seu livro, A Vingança dos Analógicos (editora Rocco, 2016), David Sax aponta em seus estudos e viagens como o modelo de negócio do impresso conseguiu não só sobreviver como se reinventar por meio de pequenas publicações de nicho ou regionais, como a Drift sobre cafés e viagens, e a Gay Weeding Magazine sobre, bem, casamentos gay.
Esta nova safra de revistas/tablóides impressos quase sempre nasce pequena e cresce de forma orgânica, com tiragens iniciais de apenas algumas milhares de cópias, o oposto de grandes lançamentos editoriais que torram grandes investimentos em um esquema de distribuição e marketing. Este modelo de pequenas editoras já está sendo copiado pelos tradicionais como Condé Nast e Hearst.
RP NUNCA FOI TÃO RELEVANTE
Derivando desta transformação jornalística, aliada a alta demanda pela produção de conteúdo, vivemos um período onde o contraste entre o editorial e o comercial é por vezes embaçado, surgindo uma nova função da velha profissão de RP (Relações Públicas). Gerados pela necessidade de fonte de informação por parte dos jornalistas, os profissionais de RP passaram a representar desde sempre marcas, instituições, empresas e pessoas, coordenando de forma ativa como e onde informações relevantes de posicionamento deveriam ser estrategicamente alocadas.
Com o advento do jornalismo online, atropelado pela profusão das redes sociais, esta categoria de profissional jornalístico passou a ser fundamental para a estratégia de comunicação das empresas, elevando o papel do antigo jornalista ao protagonismo digital que conduz ao posicionamento desejado. Como no uso extensivo que a NASA faz desta ferramenta temos o portal da agência espacial como um verdadeiro hub voltado a impactar desde o cidadão comum até os profissionais e veículos de comunicação, que estão se preparando para o pouso da Perseverance em Marte no próximo dia 18 de fevereiro, incluindo ali um cronograma regressivo que informa no detalhe cada acontecimento.
Numa sociedade saturada por informação e cansada de fake news, o papel do jornalista está se tornando relevante como nunca foi, visto que somente através de apurada pesquisa e construção linguística podemos ter a certeza que a informação foi devidamente checada e formulada antes de chegar até nós.
Pode soar como uma utopia, mas considero este novo momento da #culturadigital como um divisor de águas, pois nunca precisamos tanto de um farol para nos guiar em meio a tanta (des)informação.
CONHEÇA NOSSO CANAL CULTURA DIGITAL
LEIA TAMBÉM:
SIGA NOSSAS REDES