Como Florianópolis desenvolveu um ecossistema de serviços especializados para o mercado de inovação

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Como Florianópolis desenvolveu um ecossistema de serviços especializados para o mercado de inovação

Empresas que não são de base tecnológica, mas que mergulham no mindset, nas rotinas, terminologias e na cultura de TI (do marketing à contabilidade, jurídico e RH, por exemplo) formam um braço indissociável dos ambientes de inovação. / Foto: Acate/Divulgação


[06.04.2021]


Por Ismael Rogério da Silva*, empreendedor contábil e cofundador da Softcon Contabilidade


*Trecho editado de capítulo do livro Ponte para a Inovação

Em um ecossistema de inovação maduro, coexistem vários outros ecossistemas, de caráter segmentado e especializado, que surgem em função do próprio desenvolvimento do ambiente, formado por uma variedade de atores, de empresas e startups, fundos de capital de risco, incubadoras e aceleradoras, centros de inovação e parques tecnológicos, entre outros.

Um exemplo é o ecossistema de serviços especializados no ambiente de inovação. Empresas que não são de base tecnológica, mas que mergulham no mindset, nas rotinas, terminologias e na cultura de inovação para prestar atividades-chave para o desenvolvimento do ecossistema: serviços de contabilidade, recursos humanos, jurídicos, financeiros, de comunicação e marketing, por exemplo. Negócios que, mesmo que tenham uma atividade-fim completamente distinta, compartilham o mesmo DNA adaptativo, colaborativo, experimental e inovador dos principais players daquele ecossistema em que estão inseridos. 

Esta rede de serviços especializados é um braço indissociável dos ambientes de inovação, como apontam vários pesquisadores e empreendedores. Na figura da tríplice hélice, um ecossistema é basicamente formado pela interconexão entre governo, empresas e academia. Mas à medida que o mercado de inovação e tecnologia foi crescendo e se sofisticando, novos atores começaram a se encaixar neste mosaico, como a sociedade civil e o meio ambiente.

O ecossistema de Santa Catarina, por exemplo, se fortaleceu muito em função dos bons serviços prestados por empresas especializadas em diversas áreas. O entendimento do mercado, das dores das empresas, o estudo das novas tendências, o networking, tudo isso ajudou novos negócios catarinenses a ganharem notoriedade na imprensa nacional e internacional, a fazer melhores deals com investidores, a qualificarem sua entrega de valor, a vender mais e a atrair talentos. Sem esse ecossistema dentro do ecossistema, que alimenta e fortalece o ambiente de inovação, talvez Santa Catarina não tivesse o mesmo destaque e reconhecimento que tem dentro e fora do país.

Uma rede de serviços especializados para o ecossistema, assim como qualquer startup, não nasce pronta. Tampouco surge de um dia para o outro. No caso de Florianópolis, foi preciso o esforço de três gerações de empreendedores, ao longo de mais de 30 anos, para termos esse arranjo entre o setor de tecnologia e essa estrutura de serviços.

A primeira geração empreendedora da TI local começou a surgir entre a segunda metade dos anos 1980 e o início dos anos 1990 – e tinha um fator em comum: grande parte das empresas foi fundada por engenheiros, alguns vindos do setor público e, portanto, sem background de gestão na área privada. 

A partir de meados dos anos 1990, com a consolidação de algumas destas empresas e das primeiras incubadoras em Florianópolis (Celta, ligada à Fundação Certi e o MIDITEC, gerenciada pela Acate com apoio do Sebrae), que tiveram um papel fundamental no suporte às novas empresas com relação às necessidades básicas de serviços especializados.

A partir dos anos 2000, temos um mercado um pouco mais estruturado na região e também uma segunda geração de empresas (mais direcionadas ao desenvolvimento de softwares e não apenas de hardware) e de empreendedores (desta vez, vindos de cursos como Ciências da Computação e Análise de Sistemas). Foi uma era muito mais conectada, em que as referências e o modus operandi do Vale do Silício já eram de conhecimento de vários empreendedores. E essa jornada gerou novas demandas, alavancando a especialização dos serviços. 

Por fim, temos a terceira geração, a das startups que dominaram o cenário de tecnologia na última década. Estes empreendedores não precisavam mais ser “catequizados” com relação à necessidade por serviços especializados, um resultado direto da maturidade do nosso ecossistema: além das incubadoras, surgiam as aceleradoras, que também contam com suporte de profissionais e empresas parceiras em vários segmentos; as oportunidades junto a investidores-anjo e de fundos de investimentos tornou áreas como gestão contábil, financeira e jurídica uma prioridade. Sem transparência e requisitos mínimos de governança corporativa, seria muito mais difícil captar recursos. 

AUTOMATIZAÇÃO DE SERVIÇOS ABRE ESPAÇO PARA PROFISSIONAIS E EMPRESAS ESPECIALIZADOS PARA O MERCADO DE TI

O que estamos assistindo é uma tendência irreversível em direção à automatização de serviços em várias áreas, do financeiro ao contábil e jurídico, por exemplo. O trabalho “convencional”, repetitivo e manual, está sendo rapidamente substituído por plataformas online, de custo acessível a empresas nos mais diversos níveis, o que torna o papel do prestador de serviços especializado em algo muito mais consultivo e estratégico, do que operacional. 

O serviço especializado acaba incorporando, portanto, o que há de mais ágil e moderno utilizado pelo próprio ecossistema de tecnologia. Assim ele não só aprende e se vale de diferenciais de mercado como também se torna um multiplicador destas ferramentas (gestão de processos, automações etc.) para outras empresas e usuários. 

Todo este contexto histórico levou as empresas de tecnologia a entenderem a necessidade de serviços especializados. E elas, ao gerarem esta demanda, também ensinaram a profissionais e empreendedores de outras áreas como se relacionar com o mercado de TI, a ter uma mentalidade ágil, inovadora e colaborativa.

Um círculo virtuoso que gera empregos e fortalece o ecossistema local. 

Este artigo está disponível na íntegra no livro Ponte para Inovação (organizadores: Daniel Leipnitz e Rodrigo Lóssio), ao lado de artigos de 32 autores. Para adquirir e saber mais, acesse ponte.tech