Gestores de PMEs frequentemente acumulam relatórios e dashboards, mas encontram dificuldade em transformar números em decisões ágeis. Neste artigo, apresentamos soluções práticas para que equipes passem da paralisia de análise à performance sustentável. / Foto: Helena Lopes (Unsplash).
[08.07.2025]
Por Eduardo Barbosa, CEO da Brognoli Imóveis e um dos responsáveis pelo Conselho Mudando o Jogo (CMJ) em SC e RS. Escreve semanalmente no SC Inova
“Você mede os indicadores certos ou sofre de paralisia de análise?”
Em um mundo em que dados e resultados se sobrepõem a tudo, gestores de PMEs frequentemente acumulam relatórios e dashboards, mas encontram dificuldade em transformar números em decisões ágeis.
A economia comportamental nos oferece lentes poderosas para entender por que essas armadilhas mentais surgem e como, por meio de indicadores bem desenhados e uma cultura de feedback contínuo, podemos contorná-las.
Neste artigo, vamos explorar três vieses comportamentais comuns – ancoragem, viés do presente e aversão à perda – e propor soluções práticas para que sua equipe passe da paralisia de análise à performance sustentável.
1. ANCORAGEM
O viés de ancoragem faz com que tomemos decisões com base em um valor inicial, ou “âncora”, mesmo que irrelevante. Gestores podem se fixar em metas de vendas estabelecidas em períodos atípicos (por exemplo, em um ano de pico), calibrando orçamentos futuros com base nesse número, sem considerar mudanças de mercado, sazonalidade ou capacidade operacional.
Esse “ponto de partida” pode distorcer projeções, elevar a pressão sobre a equipe e gerar frustrações quando metas inatingíveis são impostas, o mesmo vale para o inverso, metas baixas em momentos de grandes picos.
Solução via KPIs:
- Revisão periódica de metas: ao invés de uma meta anual fixa, estabeleça metas trimestrais recalibradas com base em performance real e indicadores de tendência (CAGR, taxa de conversão mensal).
- Análise de cohort: segmente resultados por grupos de clientes ou períodos específicos; isso dissocia metas passadas de contextos distintos.
- Indicadores de contexto: além de métricas de resultado (ex.: receita), adicione indicadores de processo (ex.: número de propostas enviadas, taxa de follow-up bem-sucedido) para avaliar esforço e não só patamar de vendas.
2. VIÉS DO PRESENTE
O viés do presente nos faz priorizar benefícios imediatos em detrimento de resultados de longo prazo. Em PMEs, isso se traduz na quantidade de “fogo amigo” para resolver problemas urgentes, deixando projetos estratégicos – como treinamento de equipe ou implantação de sistemas – de lado.
O gestor sente a “queimação” dos problemas diários e acaba reagindo, em vez de agir com foco no futuro, prejudicando crescimento e escalabilidade.
Solução via KPIs
- Balanced Scorecard adaptado: combine métricas de curto prazo (fluxo de caixa, lead time de atendimento) com metas de longo prazo (NPS, retenção de clientes, ROI de iniciativas de TI).
- Dashboards de evolução: crie indicadores que mostrem progresso acumulado (por exemplo, % de conclusão de capacitação interna) e os relate semanalmente em reuniões de equipe.
- Orçamento de tempo: reserve “slots” mensais (ex.: 10 % do tempo de cada gestor) exclusivamente para projetos estratégicos; monitore o cumprimento via indicadores de alocação de horas.
3. AVERSÃO À PERDA
Somos psicologicamente mais impactados pelas perdas do que pelos ganhos equivalentes.
Em gestão, isso pode levar a um excesso de conservadorismo: recusa em investir em novas ferramentas, medo de dispensar colaboradores de baixo desempenho ou relutância em ajustar preços mesmo com mercado pressionado. A consequência é estagnação e insatisfação, tanto de clientes quanto de colaboradores.
Solução via KPIs
- Métricas de aprendizado: mais do que medir apenas lucro, inclua indicadores de experimentação, como número de testes de preço realizados ou quantidade de hipóteses validadas em pilotos.
- Quadro de pequenos ganhos: destaque ganhos incrementais (ex.: 2 % de melhoria na eficiência de atendimento) e registre-os em reuniões semanais para equilibrar a percepção de perdas.
- Painel de riscos x oportunidades: crie um indicador que avalie a proporção de iniciativas de mitigação de riscos versus oportunidades capturadas, incentivando a equipe a enxergar ganhos em cada movimento.

COMO INTEGRAR KPIS E CULTURA DE FEEDBACK
- Defina indicadores-chave de resultado (KRIs) alinhados à estratégia: selecione de 3 a 5 KRIs por área (vendas, operação, financeiro e pessoas).
- Associe indicadores de processo (KPIs) que mostrem esforço e progresso: número de treinamentos, aderência a scripts de vendas, tempo médio de resposta.
- Estabeleça rituais de revisão: reuniões quinzenais de performance onde cada gestor apresenta seu progresso, desafios e lições aprendidas.
- Implemente feedback contínuo: ferramentas como pesquisas de clima rápido e reuniões one-on-one mensais ajudam a detectar desvios comportamentais antes que virem problemas maiores.
CULTURA DE FEEDBACK: BASE PARA A MUDANÇA
- Feedback construtivo e regular: treine líderes para dar e receber feedback focado em comportamentos observáveis, não em características pessoais.
- Espaços seguros: promova momentos semanais de compartilhamento de erros e aprendizados em formato “blameless postmortem”, desestimulando a cultura de culpa.
- Reconhecimento de métricas percebidas: celebre conquistas que reforçam a superação de vieses, como equipes que atingem metas de longo prazo mesmo sob pressão de urgência.
PASSO A PASSO PARA IMPLEMENTAÇÃO
- Diagnóstico inicial: mapeie os vieses mais comuns na sua gestão por meio de entrevistas e surveys.
- Seleção de KPIs: escolha indicadores simples, de fácil mensuração e alinhados aos vieses identificados.
- Capacitação de líderes: realize workshops sobre economia comportamental e técnicas de feedback.
- Piloto em uma área: implemente KPIs e rituais de feedback em uma unidade ou região para validar o modelo.
- Escalonamento: após ajustes, expanda para toda a empresa, sempre monitorando métricas de adoção e impacto.
BENEFÍCIOS ESPERADOS
- Decisões mais ágeis: redução na paralisia por excesso de dados.
- Maior engajamento: colaboradores entendem metas e reconhecem resultados.
- Melhoria contínua: feedback regular e métricas de processo aceleram ciclos de aprendizado.
- Resiliência organizacional: equipes capacitadas a enxergar oportunidades mesmo em cenários adversos.
E você, como lida com vieses na sua gestão? Compartilhe nos comentários suas experiências e melhores práticas!
REFERÊNCIAS:
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- ARIELY, Dan. Previsivelmente irracional: as forças ocultas que moldam as nossas decisões. Rio de Janeiro: Campus, 2009.
- THALER, Richard H.; SUNSTEIN, Cass R. Nudge: o empurrão para a escolha certa. Rio de Janeiro: Campus, 2009.
- KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. A estratégia em ação: balanced scorecard. Rio de Janeiro: Campus, 1997.
- PARMENTER, David. Indicadores-chave de desempenho: desenvolvendo, implementando e usando KPIs vencedores. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2016.
- STONE, Douglas; HEEN, Sheila; PATTON, Bruce. Obrigada pelo feedback: a arte e a ciência de receber bem o retorno dos outros. Rio de Janeiro: Sextante, 2015.
- GOLDSMITH, Marshall. O que o trouxe até aqui não o levará adiante: como pessoas bem-sucedidas se tornam ainda mais bem-sucedidas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.
- BUCKINGHAM, Marcus; GOODALL, Ashley. Nove mentiras sobre o trabalho: um guia para líderes que pensam por si mesmos. São Paulo: HBR Brasil, 2021.
- MULLAINATHAN, Sendhil; SHAFIR, Eldar. Escassez: uma nova maneira de pensar a falta de recursos na vida das pessoas e das organizações. São Paulo: Objetiva, 2015.
- BAZERMAN, Max H.; MOORE, Don A. Julgamento nas decisões gerenciais. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
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