[OPINIÃO] Boas práticas de políticas públicas para a promoção da inovação nos municípios

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[OPINIÃO] Boas práticas de políticas públicas para a promoção da inovação nos municípios

As cidades devem implantar políticas para promover inovação. Em Florianópolis , Lei Municipal foi aprovada há 10 anos e sancionada há cinco.

Com ou sem legislação específica, as cidades devem implantar políticas para promover inovação, fator fundamental para a competitividade do setor público e privado. Em Florianópolis (foto), Lei de Inovação foi aprovada há 10 anos mas regulamentada há apenas cinco. / Imagem: Eduardo Zmievski (Unsplash)  


[15.03.2022]


Por Marcus Rocha, empreendedor e colunista SC Inova.
Escreve quinzenalmente sobre ambientes e ecossistemas de inovação  

A partir da Lei Federal de Inovação (Lei 10.973), sancionada em 2004 e atualizada em 2016, os demais níveis da administração pública no poder executivo (Estados e Municípios) passaram a ter um conjunto de diretrizes para também criarem seus mecanismos legais para estabelecer políticas públicas para incentivar o empreendedorismo inovador e a inovação como um todo. Neste ano essa legislação federal completará 18 anos, com muito trabalho ainda a ser feito, especialmente no nível municipal.

Destaca-se que não é obrigatório ter uma lei municipal de inovação para que seja estabelecida uma política local neste sentido. Outros mecanismos que viabilizem a implantação de iniciativas pactuadas com atores das diferentes “hélices” do ecossistema de inovação – iniciativas pública e privada, academia e sociedade civil – também podem ser utilizados. Projetos ou programas formalizados por meio de termos de cooperação ou de colaboração envolvendo esses já mencionados atores podem ser uma alternativa mais ágil e menos “engessada”.

No entanto, é mais comum que tenhamos aqui no Brasil uma preferência por formalizar as políticas na forma de leis. As causas são diversas, talvez seja um traço cultural, ou até mesmo um certo “trauma” causado por mudanças de rumo radicais quando há a troca de poder nas administrações públicas, com planos que são mais voltados à gestão atual, de curto/médio prazo, do que para a cidade no longo termo.

Com isso, a partir dos últimos 10 anos se percebe um movimento concreto, no qual muitas Prefeituras começam efetivamente a discutir, aprovar e implantar suas leis municipais de inovação. Mesmo com algumas diferenças, os mecanismos dessas leis são bastante convergentes. Os mais comuns serão tratados a partir de agora.

Em termos de escopo, quase todas as leis municipais de inovação criam dois vetores para estabelecer seus mecanismos: o incentivo ao desenvolvimento econômico por meio do empreendedorismo inovador; e o incentivo a inovações que beneficiem a administração pública da cidade.

Para o vetor do incentivo ao desenvolvimento econômico por meio do empreendedorismo inovador, primeiro são estabelecidos mecanismos de fomento público à inovação, por meio de rubricas obrigatórias do orçamento municipal, fundo municipal de inovação (também abastecidos pelo orçamento municipal), e/ou programas de isenção ou de incentivo fiscal, a partir de impostos como o ISQN (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza), IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e o ITBI (Imposto sobre Transferência de Bens Imóveis). Para a governança desses mecanismos e da própria política são estabelecidos órgãos de governança e controle, com destaque para o Conselho Municipal de Inovação.

No tocante ao vetor do incentivo à inovação para a administração pública municipal, pode ser prevista a elaboração obrigatória de planos de inovação em todos os órgãos municipais, que devem reservar orçamento para a sua execução. Tal iniciativa é bastante convergente com o Marco Legal das Startups (Lei Complementar Federal 182 de 2021), que dedica seu capítulo VI para estabelecer formas de contratação de soluções inovadoras pelos entes públicos.

Aprovada pela Câmara em 2012, Lei de Inovação de Florianópolis foi sancionada apenas em 2017
Aprovada pela Câmara em 2012, Lei de Inovação de Florianópolis foi regulamentada apenas em 2017. / Foto: Fapesc.

Mais recentemente se percebe que alguns municípios também buscam criar seus “sandboxes”, seja na própria lei de inovação ou de forma separada. Apesar do nome do mecanismo causar alguma confusão com o “sandbox regulatório” do Marco Legal das Startups e que já foi objeto de outro artigo, o objetivo de criar áreas na cidade que são preferenciais para a realização de testes e validações de inovações é muito interessante.

Florianópolis foi uma das primeiras cidades do país que conseguiu aprovar sua lei municipal de inovação em 2012 e, apesar dos quase cinco anos entre a sanção da lei e sua regulamentação (em 2017), também foi uma das pioneiras na sua implantação. Este autor teve a honra e o privilégio de liderar o processo de implantação dos principais mecanismos desta lei, enquanto esteve no cargo de Superintendente Municipal de Ciência, Tecnologia e Inovação, entre janeiro de 2017 e fevereiro de 2021.

A Lei Municipal de Inovação de Florianópolis (Lei Complementar 432 de 2012) é hoje referência para vários outros municípios brasileiros. A sua aplicação trouxe lições valiosas que foram e continuam sendo compartilhadas por diversas pessoas do ecossistema de inovação local que participaram e continuam participando de diferentes iniciativas oriundas desta lei.

Um ponto interessante desta lei é que, já em 2012 previu mecanismos só considerados em outras leis, tais como o sandbox e a compra de soluções inovadoras pela administração pública. O texto do Art. 64 da referida lei demonstra isso, pois engloba ambos os assuntos:

  • Art. 64. A Prefeitura Municipal de Florianópolis, em matéria de seu interesse, poderá contratar, na forma da Lei 8.666 de 1993 e suas alterações, empresa, consórcio de empresas e entidades nacionais de direito privado voltadas para atividades de pesquisa, de reconhecida capacitação tecnológica no setor, visando a realização de atividades de pesquisa e desenvolvimento que envolvam risco tecnológico para solução de problema técnico específico ou obtenção de produto ou processo inovador.

ONDE A LEI DE INOVAÇÃO PODE EVOLUIR?

Obviamente, todas as políticas precisam evoluir e com a lei de inovação de Florianópolis não deve ser diferente. A partir da sua implantação e operação, já puderam ser identificadas diferentes possibilidades de melhorias. Um bom exemplo está na governança, que pode evoluir incluindo atores de outras esferas do ecossistema de inovação no Conselho Municipal de Inovação, com destaque para agentes de fomento (públicos e privados) e o poder legislativo municipal. 

Com isso, também poderia ser revisto o papel do Sistema Municipal de Inovação previsto na Lei, que ficou redundante com o Conselho Municipal de Inovação. Quem sabe unir as duas estruturas pode ser uma boa ideia.

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Outro ponto de melhoria, que inclusive está em fase adiantada de tramitação no Conselho Municipal de Inovação de Florianópolis, é a evolução e a simplificação dos processos do Programa de Incentivo Fiscal à Inovação, por meio de atualização da sua Portaria regulamentadora. Assim que for publicada, com certeza será objeto de artigo neste espaço.

Por fim, considerando que se trata de uma política pública de inovação, também seria importante incluir mecanismos para a promoção da inovação na Câmara de Vereadores. O poder Legislativo Municipal, que tem papel fundamental na análise, aprovação e fiscalização das leis na cidade, pode e deve ser incluído nos mecanismos locais de inovação pública.

O fato é que, com ou sem legislação específica, os municípios devem implantar políticas públicas – conjuntos de ações de longo prazo – para a promoção da inovação. Como a inovação é hoje um fator fundamental para a competitividade das organizações privadas e públicas, é necessário ter uma atenção especial para esse assunto. A partir da efetiva execução dessas políticas, os ecossistemas locais passam a ter ganhos importantes. 

Com o empreendedorismo inovador se gera riqueza, empregos de qualidade, aumento de renda e de arrecadação tributária. E com a inovação na administração pública, maior qualidade e uso mais eficiente dos recursos públicos, permitindo ampliar o impacto positivo dos serviços para todos os que estiverem presentes na cidade. 

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