Um habitat vocacionado tende a “falar a língua” do setor econômico escolhido, sendo mais acolhedor às empresas e suas entidades empresariais. Mas é preciso evitar o modismo ao definir a área de atuação. / Foto: Orion Parque, Lages (Ricardo Wolffenbuttel).
[18.01.2022]
Por Marcus Rocha, empreendedor e colunista SC Inova.
Escreve quinzenalmente sobre ambientes e ecossistemas de inovação
Conforme já foi abordado em artigo anterior, os habitats de inovação são peças-chave para os ecossistemas de inovação. Por definição, são locais que concentram as principais atividades necessárias para a produção de inovações, desde o estímulo a ideias criativas para resolver desafios reais, até os investimentos e incentivos para empreendimentos inovadores. Quando são bem-sucedidos, esses espaços acabam sendo muito importantes para os ecossistemas de inovação onde estão instalados, pois colaboram de forma efetiva para o desenvolvimento econômico, social e urbano.
Umas das principais tipologias de habitat de inovação que tem sido desenvolvido no Brasil é a de Centro de Inovação. Tipicamente, é uma edificação única destinada a receber uma série de operações interdependentes com o propósito de estimular e desenvolver empreendimentos inovadores de forma sistêmica, ou seja, com qualidade e em quantidade.
O modelo proposto por Josep Piqué, que consta no livro II do Guia de Desenvolvimento de Ecossistemas e Centros de Inovação editado pelo Governo de Santa Catarina, traz uma orientação interessante. Ele sugere as principais categorias de serviços que devem ser consideradas (“funções”), exemplificando algumas atividades (“subfunções”) que podem ser implantadas no centro de inovação.
Observando a aplicação prática desse modelo, percebe-se que a função “7 – Especialização Inteligente” deve ser a primeira a ser implantada, pois todas as demais funções e atividades derivam da especialização. Além disso, a especialização dá o foco necessário para aumentar o potencial de sucesso de um centro de inovação.
Pode-se explicar esse argumento partindo do fato que um centro de inovação se torna um ponto de encontro dos atores do ecossistema local de inovação. Considerando o modelo da quádrupla hélice, são pessoas que representam organizações empresariais, acadêmicas, públicas, e da sociedade civil, que frequentam esse espaço.
Portanto, um centro de inovação pode ser especializado em Saúde, Educação, Logística, Mídia, Agronegócio, Fármacos, Têxtil, etc. Como também não se trata de um modelo restrito, a especialização pode ser considerar setores complementares como, por exemplo, Saúde e Fármacos, Agro e Indústria Alimentícia, entre outras combinações que façam sentido.
Uma vez definida a especialização do centro de inovação, é possível trabalhar com mais foco. Considerando que as “matérias-primas” da inovação são as competências das pessoas, se pode buscar instituições de ensino com cursos e linhas de pesquisa que estejam orientadas àquilo que é necessário para inovar na área de especialização escolhida. A presença de pessoas com as competências necessárias para inovar na área de especialização do centro, além do desenvolvimento de programas de capacitação, são fundamentais.
Um centro de inovação especializado também consegue ter um melhor direcionamento para atrair empresas da cadeia produtiva daquele setor escolhido. Aliás, uma reclamação comum de pessoas oriundas de empresas de setores da chamada “economia tradicional” é que se sentem excluídas das iniciativas mais inovadoras, principalmente por causa de uma barreira de comunicação estabelecida pelas diferenças da linguagem falada nesses espaços.
Um centro de inovação especializado tende a “falar a língua” daquele setor econômico escolhido, sendo muito mais acolhedor às respectivas empresas e suas entidades empresariais.
CONEXÃO COM ÓRGÃOS DE GOVERNO
Em relação às organizações governamentais, também há vantagens. De acordo com o setor especializado do centro de inovação, é possível ter a participação de órgãos da administração pública com presença na região, principalmente de nível Municipal e Estadual, que tenham foco no setor escolhido. Com isso, as demandas de inovação do setor público e as necessidades de melhoria ou atualização de políticas públicas acabam ficando mais focadas nos temas setoriais desenvolvidos.
Dessa forma, um espaço que une instituições de ensino, empresas e entidades empresariais, juntamente com organizações governamentais, com o objetivo de produzir inovações para um determinado setor econômico, faz bastante sentido. Primeiro, esses atores possuem um conhecimento muito valioso dos principais problemas e desafios da cadeia produtiva, o que são oportunidades fundamentais para o desenvolvimento de inovação. Segundo, também representam o público mais qualificado para orientar, validar e comprar as inovações desenvolvidas.
É por isso que, a partir da presença de todos esses atores de uma mesma cadeia produtiva especializada, frequentando um centro de inovação que possui atividades como pré-incubadora, incubadora, aceleradora, programa de inovação aberta, fundos de investimentos, missões, programas educacionais, eventos, entre outras, há maiores chances de desenvolver soluções inovadoras de sucesso.
Esse espaço também tende a ser uma fonte de criação de startups e outros empreendimentos inovadores, colaborando de forma mais importante com o desenvolvimento econômico da região onde está instalado.
A partir dessa lógica, parece fazer muito mais sentido que um ecossistema tenha diferentes centros de inovação especializados, ao invés de ter um único centro de inovação generalista. Um exemplo prático disso está no Distrito de Inovação 22@, de Barcelona, que possui 4 diferentes centros de inovação, que lá são chamados apropriadamente de “clusters”, com as seguintes especializações: Mídia; Medicina; Tecnologias da Informação e da Comunicação; e Energia.
Portanto, a especialização pode ser um fator crítico para o sucesso de um centro de inovação. No entanto, devem ser tomados alguns cuidados na escolha do setor econômico a ser priorizado naquele espaço. O primeiro é não se deixar levar pelos modismos do momento, escolhendo setores que podem parecer promissores, mas que não possuem nenhuma identidade com a região, ou seja, não há pessoal capacitado e nem empresas.
Por exemplo, criar um centro de inovação especializado no setor aeroespacial em uma cidade que não possui sequer um aeroporto, ou estabelecer um centro especializado em saúde em um local que não possui nenhum curso superior em medicina, não são opções viáveis.
A escolha do setor econômico de especialização do centro de inovação deve envolver a participação de lideranças do ecossistema local e precisa considerar as vocações econômicas da região, principalmente se for o primeiro espaço do tipo a ser criado no território. Esses setores devem ter sua competitividade reforçada por meio da inovação, e os respectivos centros de inovação devem colaborar com o desenvolvimento econômico da região, a partir de uma perspectiva estratégica e colaborativa.
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