[Diários da IA] Quando a voz se torna interface: o que realmente muda no futuro do trabalho

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[Diários da IA] Quando a voz se torna interface: o que realmente muda no futuro do trabalho

Não é só a forma como falamos com máquinas, mas a capacidade de transformar esse diálogo em decisões claras em um ambiente menos fragmentado

O que se redefine hoje não é apenas a forma como falamos com máquinas, mas a capacidade de transformar esse diálogo em decisões mais claras e um ambiente digital menos fragmentado. / Imagem: ChatGPT/SC Inova


[27.11.2025]

Por Eduardo Barbosa, CEO da Brognoli Imóveis e um dos responsáveis pelo Conselho Mudando o Jogo (CMJ) em SC e RS. Escreve sobre inteligência artificial no ambiente corporativo na série “Diários de IA”.

Durante décadas, a relação entre pessoas e computadores se estruturou em torno do teclado. Essa mediação moldou rotinas, produtividade e até a forma como organizamos o trabalho. Mas essa lógica começa a mudar à medida que a inteligência artificial passa a entender intenções, contexto e linguagem natural — e, com isso, devolve à voz um papel central nas interações digitais.

Um relatório produzido pela Jabra em parceria com pesquisadores da London School of Economics chama atenção para esse movimento. O estudo aponta que, ao mesmo tempo em que nunca nos comunicamos tanto, nunca estivemos tão sobrecarregados por plataformas, notificações e fluxos paralelos. A consequência é conhecida: equipes exaustas, produtividade estagnada e processos que dependem de um ritmo de digitação que já não acompanha a velocidade das decisões.

Nesse cenário, a voz reaparece não como uma tendência futurista, mas como alternativa funcional. Falar, para a maior parte das pessoas, é mais rápido e mais fluido do que digitar. E, quando combinado a agentes inteligentes capazes de interpretar contexto e executar tarefas, esse modo de interação deixa de ser acessório e passa a competir com a própria estrutura do trabalho digital.

O relatório descreve a evolução de sistemas que já não se limitam a responder perguntas, mas que planejam, cruzam dados, acompanham reuniões e coordenam ações internas. A ideia é simples: menos tempo navegando entre telas e mais tempo direcionando as decisões. A transição não acontece de uma vez, mas começa a se consolidar justamente nas atividades que exigem raciocínio, não digitação — como organizar ideias, planejar prioridades ou fazer alinhamentos rápidos. Nessas situações, a fala tende a favorecer a clareza do pensamento, reduzindo o atrito cognitivo que hoje pesa no dia a dia de muitas equipes.

Esse avanço, porém, traz desafios importantes. O estudo mostra que a principal barreira não é tecnológica, mas de confiança: receio de gravação, de monitoramento indevido e de perda de privacidade. Em outras palavras, não basta que a tecnologia funcione; é preciso que as pessoas se sintam seguras para adotá-la. Governança, transparência e políticas de uso serão tão determinantes quanto a qualidade dos modelos de IA.

O PAPEL DO BRASIL E DE SANTA CATARINA

Para países como o Brasil, há um ponto adicional. O país ainda convive com processos manuais, sistemas desconectados e baixa integração de dados. Isso significa que tecnologias baseadas em linguagem natural podem, de fato, reduzir etapas e simplificar rotinas de forma acelerada — mas também que qualquer atraso nessa transição tende a ampliar a distância em relação a mercados mais digitalizados.

Santa Catarina é uma região com potencial para testar esses modelos na prática. O estado reúne densidade de startups, hubs tecnológicos, universidades ativas em pesquisa aplicada e um ambiente empresarial que já trabalha com IA em áreas como saúde, indústria, logística e serviços. Essa combinação cria condições reais para pilotos e validações, algo que o país precisa para transformar tendência em aplicação concreta.

O sentido geral dessa mudança ainda está em construção. Mas os indícios apontam para um cenário em que a voz assume papel mais relevante nas interações de trabalho, não como substituta absoluta do teclado, mas como complemento que reorganiza ritmos, reduz ruídos e redistribui tarefas entre humanos e agentes digitais. 

À medida que essa integração avança, o que se redefine não é apenas a forma como falamos com máquinas, mas a capacidade de transformar esse diálogo em decisões mais claras, processos mais enxutos e um ambiente digital menos fragmentado.