O verdadeiro fosso competitivo não está em acumular mais dados, mas em orquestrar dados dentro de uma arquitetura que habilita crescimento escalável, confiável e resiliente. / Imagem: ChatGPT/SC Inova.
[08.09.2025]
Por Eduardo Barbosa, CEO da Brognoli Imóveis e um dos responsáveis pelo Conselho Mudando o Jogo (CMJ) em SC e RS. Escreve sobre inteligência artificial no ambiente corporativo na série “Diários de IA”.
No ecossistema empresarial, poucas histórias são tão repetidas quanto a de Netflix e Blockbuster. Geralmente ela aparece como um conto simplista: um novato ousado contra um incumbente lento. Mas a verdade é mais profunda — e muito mais útil para quem busca crescimento sustentável.
A Blockbuster não perdeu porque ignorou seus clientes ou porque não tentou se adaptar. O diferencial não foram os dados isolados, mas a arquitetura que os incorporava ao coração da operação.
Crescimento sustentável nasce de arquitetura, não de acúmulo de dados
O ERRO DA BLOCKBUSTER
Muitos contam a narrativa como se a Blockbuster tivesse perdido por lentidão ou arrogância. Mas a verdade é mais sutil: ela tentou se adaptar. Copiou políticas de assinatura, eliminou multas, lançou envelopes vermelhos. À primeira vista, estava emparelhada com a Netflix.
Ainda assim, quebrou.
O motivo? Nunca escapou da gravidade da sua antiga arquitetura. Continuou presa ao inventário local de cada loja, com excesso de alguns títulos e falta de outros. Mesmo com dados em mãos, não conseguiu transformar essa informação em um sistema operacional novo.
A APOSTA DA NETFLIX
Já a Netflix não usava dados como complemento, mas como espinha dorsal de uma nova arquitetura de crescimento. Ao integrar as listas de espera dos clientes a uma logística nacional, conseguiu:
- Prever demanda com mais precisão.
- Redistribuir estoque para onde havia maior necessidade.
- Reduzir ociosidade e aumentar disponibilidade local.
Esse modelo criou um ciclo virtuoso: mais confiabilidade atraía mais clientes, que geravam mais dados, que alimentavam previsões melhores. Um verdadeiro sistema auto-reforçador, difícil de ser copiado sem desmontar toda a lógica da operação.
A lição é clara: o diferencial não foram os dados isolados, mas a arquitetura construída a partir deles.
A FALÁCIA DOS “FOSSOS DE DADOS”
Muitos empresários ainda acreditam que basta acumular dados para construir barreiras competitivas. É a chamada falácia dos “fossos de dados”: imaginar que mais dados significam mais proteção contra concorrência.
O problema é que dados são substituíveis, replicáveis e até compráveis. Sozinhos, não criam vantagem duradoura.
O que cria barreira real é a Arquitetura de Crescimento: sistemas que usam dados para repensar processos, fluxos e decisões de ponta a ponta. É essa engenharia que torna a imitação custosa, porque exige que o concorrente não apenas copie recursos, mas desmonte toda a sua lógica de operação.
O QUE ISSO SIGNIFICA PARA EMPRESÁRIOS E EMPREENDEDORES:
- Dados precisam virar arquitetura: Não basta investir em BI ou dashboards. É preciso redesenhar processos e integrar dados à operação diária, transformando-os em decisões automáticas, previsões e eficiência estrutural.
- Arquitetura é escolha estratégica: Crescimento sem arquitetura é como construir um prédio alto em terreno instável: quanto maior, mais vulnerável. Arquitetura sólida evita que o “peso do crescimento” vire caos.
- Ciclos de feedback são o motor do crescimento sustentável: Quando dados alimentam um sistema que aprende continuamente, cada uso reforça o próximo. Essa retroalimentação gera eficiência cumulativa e vantagem que se amplia com o tempo.
- Mudança exige coragem: Reconfigurar a lógica de negócio não é ajuste incremental. Exige abrir mão de práticas antigas e redesenhar fundamentos. Foi isso que a Blockbuster não conseguiu fazer — e que a Netflix fez com ousadia.
ARQUITETURA DE CRESCIMENTO:
O VERDADEIRO FOSSO
O verdadeiro fosso competitivo não está em acumular mais dados, mas em orquestrar dados dentro de uma arquitetura que habilita crescimento escalável, confiável e resiliente.
Empresas que entendem isso não apenas coletam dados:
- Modelam demanda em vez de apenas reagir.
- Centralizam riscos para ganhar eficiência.
- Adiam decisões até terem maior precisão.
- Criam economias de densidade, onde cada novo cliente aumenta a eficiência do sistema.
Tudo isso não é tecnologia por si só, mas design inteligente da arquitetura.
A provocação final: seus dados hoje são relatórios que envelhecem na gaveta, ou são engrenagens vivas de uma Arquitetura de Crescimento?
Em outras palavras: sua empresa está acumulando petróleo estagnado ou distribuindo energia elétrica que alimenta toda a operação?
No fim, a lição de Netflix e Blockbuster é inequívoca: crescimento sustentável nasce da coragem de reconfigurar a arquitetura do negócio em torno dos dados. O resto é ilusão passageira.
REFERÊNCIAS:
- CHOUDARY, Sangeet Paul. A falácia dos fossos de dados. Plataformas, IA e a economia das Big Tech. 07 set. 2025.
- CHOUDARY, Sangeet Paul. Reshuffle. [S.l.]: Disponível em diversos formatos (capa dura, brochura, áudio e Kindle), 2025.
- MCAFEE, Andrew; BRYNJOLFSSON, Erik. Machine, Platform, Crowd: Harnessing Our Digital Future. New York: W. W. Norton & Company, 2017.
- PORTER, Michael E.; HEPPELMANN, James E. How Smart, Connected Products Are Transforming Companies. Harvard Business Review, Boston, 2015.
- DAVENPORT, Thomas H.; HARRIS, Jeanne G. Competing on Analytics: The New Science of Winning. Boston: Harvard Business School Press, 2007.
- WESTERMAN, George; BONNET, Didier; MCAFEE, Andrew. Leading Digital: Turning Technology into Business Transformation. Boston: Harvard Business Review Press, 2014.
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