Para especialista, a competição global entre as cidades se baseia em três fatores: cultura, educação e negócios. Entenda como referências globais (como o Market Hall de Rotterdam – foto) podem ser aplicadas para o desenvolvimento urbano no Brasil e em Santa Catarina. Crédito: Ruben Hanssen (Unsplash)
[FLORIANÓPOLIS, 31.05.2023]
Por Fabrício Umpierres, editor SC Inova (*com informações da FIESC)
Na vanguardista Holanda – reconhecida pela disrupção nas artes plásticas, no urbanismo e até no futebol contemporâneo – um mercado público tornou-se uma das maiores atrações da cidade portuária de Rotterdam. O Market Hall (foto acima) é um centro cultural, turístico e comercial que mescla – em uma estrutura em forma de ferradura – 96 unidades comerciais no térreo e apartamentos residenciais acima, além de estacionamento subterrâneo. Mas o verdadeiro destaque deste edifício são as enormes pinturas digitais em sua fachada interna – uma espécie de galeria gigante composta por 4.000 painéis individuais.
Na mesma cidade, que foi destruída durante a ocupação alemã na Segunda Guerra Mundial, as “Casas Cubo” (Kubuswoningen) criadas pelo arquiteto Piet Blom desafiam a lógica das construções convencionais com um projeto ousado em que as residências são elevadas e curvas – como se fossem árvores, enquanto o conjunto da edificação representaria uma floresta (ver abaixo).
Estas referências fora da curva foram o ponto de partida, em Florianópolis, de um projeto inédito no país voltado ao desenvolvimento de cidades inteligentes, o MBI em Smart Cities idealizado pela Câmara de Smart Cities da FIESC e oferecido por meio da Academia FIESC de Negócios, que reúne squads de executivos, arquitetos, urbanistas, engenheiros, profissionais de marketing e funcionários de prefeituras de Santa Catarina. A ideia é que este seja um laboratório de ensino, tendências e novos projetos para cidades inteligentes que não foquem apenas em desenvolvimento de tecnologia, mas de soluções práticas aplicáveis pelo setor público e privado.
“Mais do que conectividade, tecnologia e soluções a serviço do cidadão, cidades inteligentes sabem que devem ser competitivas, se manter modernas e atraentes, além de cultivar áreas verdes”, afirmou, durante aula magna do curso, o jornalista Raul Juste Lores, responsável pelo projeto multimídia São Paulo nas Alturas, e que já percorreu o mundo analisando referências em inovação urbana.
Para ele, um caminho para chegar às cidades inteligentes é valorizar a arte. Sim, a arte, não um aplicativo ou um megaprojeto tecnológico. “A competição e a comparação entre as cidades pode ser medida por cultura, educação e negócios. Precisamos do uso criativo das cidades. No Brasil, damos as costas a algumas cidades porque queremos criar algo novo, mas nada acontece. Aqui falta ousadia e vontade de fazer diferente”, provocou o colunista da CBN e ex-correspondente internacional aos participantes.
Não faltam referências – e não apenas na doidona Holanda. Zaragoza, uma cidade espanhola sem lá muitos atrativos (embora fique no meio do caminho entre Madrid e Barcelona) e com população um pouco maior do que Joinville (SC), se reinventou urbanisticamente desde que sediou a Expo 2008, com novos equipamentos (praças, passarelas, uma ponte-pavilhão assinada pela lendária arquiteta Zara Hadid etc). Singapura era um tédio – nas palavras do próprio Raul – até atrair nos últimos 10 anos grandes eventos como a Fórmula-1 e mobilizar uma grande cadeia turística à região.
Para Jean Vogel, presidente da Câmara de Smart Cities da FIESC, a indústria depende de um território desenvolvido, infraestrutura e talentos para se desenvolver. “Cidades inteligentes são plataformas para desenvolvimento de pessoas e negócios. A inovação precisa ser estimulada em todos os cantos da cidade, com sinergia, para a geração dos negócios”, reforçou. O MBI aborda conteúdos como inovação, desenvolvimento territorial, legislação, as dimensões da cidade inteligente e suas áreas de desenvolvimento (educação, saúde, mobilidade, energia, governança, segurança, sustentabilidade, conectividade, entre outras), com a tecnologia como um tópico transversal.
José Eduardo Fiates, diretor de inovação e competitividade da FIESC, relatou experiências observadas na recente missão realizada à Ásia. A delegação catarinense também conheceu o Incheon Free Economic Zone (IFEZ), que é o maior projeto urbano do mundo atualmente. Estão sendo construídas em 120 km² três ilhas que já abrigam a cidade do futuro, com vários sistemas de monitoramento e segurança.
CULTURA RIMA COM NEGÓCIOS
“Qualquer cidade em Santa Catarina, por exemplo, pode se tornar inteligente, o que significa ser atrativa para quem mora, quem trabalha, quem vem visitar. Mas é preciso criar cool factors“. Os “fatores cool” a que ele se refere são aqueles espaços e iniciativas que encantam – voltamos às referências holandesas – e desenvolvem os três itens fundamentais para o desenvolvimento das cidades modernas (e que citamos acima): cultura, educação e negócios.
Em São Paulo, o mercado imobiliário vive uma nova onda de retrofit graças à visão inovadora de alguns empreendedores que estão revitalizando prédios abandonados em áreas degradas e criando moradias descoladas (studios para Airbnb mas também para residências fixas), bares, restaurantes e livrarias que lotam diariamente mesmo que os clientes tenham como vista o inóspito Minhocão.
“Se cidades inteligentes são bem-sucedidas, com qualidade de vida, poucas no Brasil se adequam a essa realidade. É impressionante que tenhamos políticas habitacionais milionárias que não melhoram, de fato, a vida das pessoas”, frisou Raul. Ele citou como exemplo os avanços registrados em Bogotá e Medellín nos anos `1990, quando houve intervenção nas favelas. “Colômbia é mais pobre do que nós e conseguiu transformar suas favelas e o centro de Bogotá”, observou. “Temos que ser muito mais criativos e combater o conservadorismo. As cidades precisam ser ‘chacoalhadas’”, finalizou.
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