Não há melhor ambiente para se obter insights sobre um determinado mercado do que em um evento desse tipo. Mas para aproveitar melhor, é preciso planejamento. Confira aqui algumas técnicas que listamos. / Imagem: Divulgação Startup Summit
[12.08.2024]
Por Giancarlo Proença, diretor executivo da Link Estratégia, CI Director da Software Pricing Partners e LATAM Regional Manager do Bennion Group. Escreve mensalmente sobre Inteligência Competitiva.
Nesta semana Florianópolis recebe empreendedores de todo o Brasil para o Startup Summit 2024. O evento atrai um público formado por startupeiros, investidores, gestores, desenvolvedores, instituições de fomento e suporte, representantes governamentais e mais um monte de pessoas envolvidas no ambiente competitivo de tecnologia e startups.
Esse tipo de evento é uma oportunidade para criar conexões, obter informações (sobre concorrentes, parceiros, fornecedores, possíveis aquisições etc.) e prospectar possíveis clientes. Nos nossos treinamentos de Inteligência Competitiva e de Mercado (IC&M), comparamos eventos desse tipo aos bebedouros que se formam na savana e nos desertos: todas as espécies precisam estar ali e conviver harmonicamente para que se beneficiem da água.
Não há melhor ambiente para se obter insights sobre um determinado mercado do que em um evento desse tipo. Mas para aproveitar melhor, é preciso planejamento. Na área de IC&M, adotamos diversas técnicas para extrair ao máximo a participação dos representantes da empresa.
O primeiro passo é definir os objetivos. O que a empresa busca no evento de que vai participar? E não há nada de errado em ter mais de um objetivo. Digamos que o foco será em prospectar possíveis clientes e em obter mais informações sobre os competidores (quem são os clientes, como estão precificando, que tecnologia estão usando etc).
Com esses objetivos definidos, é preciso saber quem são os alvos, as pessoas que podem ajudar a alcançar esses objetivos. No caso de vendas, precisamos identificar quem toma decisões de compra. É o pessoal de procurement, gestores de TI, C-Level? No caso de informações de competidores, quem tem as informações que buscamos? Clientes que compraram o produto do concorrente vão saber quanto pagam. Fornecedores dos concorrentes podem ter insights sobre que tecnologia os competidores usam. E assim por diante.
Eventos como o Startup Summit são como bebedouros que se formam na savana e nos desertos: todas as espécies precisam estar ali e conviver harmonicamente para que se beneficiem da água.
Uma vez que sabemos quem são nossos alvos – de forma genérica, que posições ocupam e em que empresas trabalham –, é precisar descobrir os nomes dessas pessoas e se estarão presentes no evento. Bases de dados de geração de leads podem ajudar na tarefa. Pesquisar por perfis no LinkedIn também. Para saber se os alvos estarão presentes no evento, vale checar postagens antigas em mídia social. Se estiveram presentes no evento em edições anteriores, as chances de voltarem são grandes.
BUSCANDO O RAPPORT
Agora temos os objetivos, os alvos e sabemos quem estará no evento. O próximo passo é buscar formas de se conectar com essas pessoas. Em IC&M, usamos perfis para identificar a melhor maneira de criar uma relação, o chamado rapport. Pesquisando em mídias sociais, é possível identificar pontos em comum com as pessoas que queremos abordar no evento.
Aí, vale explorar a identificação por meio de relações, background e interesses. Você e o alvo podem estar conectados por relações quando têm conhecidos em comum, trabalham com os mesmos fornecedores, compartilham interesse em um concorrente ou ainda participam dos mesmos grupos institucionais (associações empresariais, sindicatos).
A conexão por meio de background compartilhado é ainda mais forte e costuma render melhores relacionamentos. Vale explorar esse ponto se o você e o alvo têm formação em comum, estudaram na mesma escola ou universidade, trabalharam para a mesma empresa em algum momento ou até mesmo se vêm da mesma cidade ou região.
Um terceiro ponto que também rende boas conexões é se há interesses em comum. Já fiz excelentes conexões com pessoas porque ambos gostamos de viajar de moto, mergulhar ou velejar. Esportes são um ponto a explorar, mas com cuidado porque há quem veja um torcedor de outro time como um adversário natural. Hobbies como cozinha, vinhos, cerveja, pintura, música também são excelentes formas de buscar rapport. Em alguns casos, a vida familiar é um interesse comum que aproxima pessoas (em especial filhos recém-nascidos e animais de estimação).
O importante é que não seja algo forçado e que realmente exista a conexão. Nunca se deve mentir para criar uma conexão. O vínculo precisar ser real para a conexão ser real. Com tempo e experiência, aprende-se a ler as pessoas e entender o quanto cada um gosta de se abrir.
Há vários métodos que usam psicologia para tentar entender como cada pessoa vai responder a determinados estímulos numa conversa. O indicador Myers-Briggs, por exemplo, diz que pessoas com profissões mais técnicas, como engenharia e desenvolvimento, costumam ser mais fechadas e menos propensas a compartilhar e se conectar com outros em assuntos pessoais. Mas isso não é regra. Há muitos engenheiros que adoram falar de seus hobbies e de sua vida fora do trabalho.
Por outro lado, vendedores e gente com formação em ciências humanas tenderiam a se abrir mais e dar importância a fatores pessoais quando conhecem alguém. Também não é regra e há muita gente de humanas que pouco valoriza a vida pessoal quando conversa. O importante é prestar atenção no interlocutor e reagir de acordo. Ouvir muito mais do que falar e deixar o ego fora da equação.
ESTRUTURANDO A CONVERSA
O passo seguinte, depois de criar uma relação com a pessoa, é tentar descobrir o que ela quer dessa relação. As melhores conversas informais, que levam a mais resultados formais, são as que estabelecem uma relação de ganha-ganha. Sabendo o que o interlocutor deseja, podemos tentar ajudá-lo. Quer seja oferecendo uma informação relevante, apresentando alguém, sugerindo uma leitura, curso ou mentoria. Esse ganha-ganha vai fortalecer a conexão já estabelecida com base em relação, background ou interesse.
A forma em que estruturamos a conversa também é importante. Em Inteligência Competitiva e de Mercado, adotamos um formato de ampulheta, com os temas mais gerais, mais abertos, no começo e no fim da conversa. Os tópicos de interesse, em que o foco é maior, ficam no meio da conversa. Isso vale para interações voltadas a coleta de informação e às focadas em prospecção também. Até porque nesse caso você fará uma pré-venda.
Nada de partir para o pitch, vender seu produto ou empresa de forma aberta, na primeira interação. Isso fica para o follow-up, que virá por mensagem, ligação ou reunião mais tarde.
De fato, essa pré-venda não deixa de ser um exercício de obtenção de informações de inteligência. É o momento para tentar descobrir as demandas do prospect, que dificuldades ele ou a empresa estão enfrentando. Se elas coincidirem com as que o seu produto é capaz de solucionar, tanto melhor (mas contenha-se ao falar sobre a maravilha que é seu produto, lembre-se de manter o ego em cheque).
Se seu produto não atende às dores do prospect, você deve oferecer sugestões de outros fornecedores, ferramentas, livros e mentorias que poderão ajudá-lo. Cuidado para não se enganar ao interpretar as dores do prospect e racionalizá-las para encaixar na sua solução. Não é porque vendemos martelos que todos os problemas são pregos.
Outra técnica que usamos muito em IC&M é a de usar afirmações para obter informações e perguntas para conduzir a conversa. Isso funciona da seguinte forma: perguntamos, por exemplo, sobre a cidade de origem de alguém, ou se tem filhos, ou se estudou em determinada universidade. Essas são informações secundárias para nossos objetivos, usadas para criar rapport e manter a conversa fluindo.
Já para saber que demandas a empresa têm, valem comentários do tipo: “Um cliente nosso que cresceu no mesmo ritmo de vocês teve problemas com alto turnover de pessoal de vendas”. Aí é esperar o interlocutor comentar a respeito. Nesse exemplo, o seu produto, digamos, é uma plataforma de RH que ajuda a resolver problemas de alto turnover. No geral, perguntas são percebidas como invasivas, enquanto afirmações geram espaço para comentários do interlocutor.
Há uma série de ferramentas de obtenção de informação usadas pelos profissionais de Inteligência Competitiva e de Mercado que podem ser aplicadas numa conversa informal. Uma dessas ferramentas, o bracketing, por exemplo, consiste em apresentar uma estimativa numérica e esperar que o interlocutor forneça dados mais precisos. Outra, o ceticismo, consiste em questionar levemente uma informação apresentada pelo interlocutor a fim de obter mais detalhes. Para quem está interessado em se aprofundar nessas técnicas, um ótimo livro é Confidential, escrito por John Nolan.
Por fim, uma dica que ajuda na organização de todas essas informações e prospecções é a de escrever relatórios curtos após cada interação. Não custa sair para um lugar tranquilo e digitar meia dúzia de palavras-chave no celular. É bom também fazer um relatório mais detalhado ao final de cada dia. Até porque podem surgir novas perguntas, clientes potenciais e ações que já podem ser postas em prática. A partir daí, é só fazer um bom follow-up e colher os resultados.
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