Não existe “receita de bolo” para o desenvolvimento desses ambientes. Mas pode-se aprender muito com experiências bem-sucedidas que passam por governança e gestão até ações que estimulem “desafios” de inovação. / Foto: StationF, Paris (divulgação)
[09.11.2021]
Por Marcus Rocha, empreendedor e colunista do SC Inova.
Escreve quinzenalmente sobre ambientes e ecossistemas de inovação
A busca por estimular e, de certa forma, sistematizar a produção de inovações, além de proporcionar maior eficácia e eficiência nos processos de desenvolvimento de soluções inovadoras, provocou a criação de diferentes mecanismos interessantes. Entre eles, estão os Habitats de Inovação.
Uma premissa básica da inovação é o fato de que se trata de uma atividade humana e, nesse contexto, um habitat pode ser compreendido como um “local onde algo é geralmente encontrado ou onde alguém se sente em seu ambiente ideal”, de acordo com a Oxford Languages. Ampliando essa definição para a inovação, pode-se inicialmente compreender que se trata de um local onde as pessoas que querem inovar se “sentem em seu ambiente ideal” e que, além disso, serão encontradas inovações nesses espaços.
Segundo o Via Estação Conhecimento, grupo de pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina, habitats de inovação são espaços diferenciados, propícios para que inovações ocorram, pois são locais de compartilhamento de conhecimento e experiências criativas, estimulando networking e parcerias entre os envolvidos.
Esses ambientes ajudam a minimizar os riscos e a maximizar ou acelerar os resultados associados aos negócios ali desenvolvidos, unindo talentos, tecnologias, capital e conhecimentos em um determinado espaço para alavancar o potencial empreendedor de todo o entorno.
Portanto, um Habitat de Inovação é um local que concentra as principais atividades necessárias para a produção de inovações, desde o estímulo a ideias criativas para resolver desafios reais, até os investimentos e incentivos para empreendimentos inovadores. Quando são bem-sucedidos, esses espaços acabam sendo muito importantes para os ecossistemas de inovação onde estão instalados, pois colaboram de forma efetiva para o desenvolvimento econômico, social e urbano.
Esses habitats têm recebido diferentes nomes e possuem diferentes estruturas, todas com a mesma finalidade já descrita. Podem ser chamados de parques (científicos; tecnológicos; científicos e tecnológicos; de Inovação; de Pesquisa), núcleos de inovação tecnológica, centros de inovação, hubs de inovação, entre outras denominações.
Não existe “receita de bolo” para o desenvolvimento de habitats de inovação, mas pode-se aprender muito com experiências bem-sucedidas. Modelos muito interessantes foram criados, como o 22@ de Barcelona, do Station F de Paris, dos Centros de Inovação Acate (CIA), do Porto Digital de Recife, do Cubo, do InovaBra, proporcionando boas referências para a modelagem de habitats para cada localidade.
GOVERNANÇA: PILAR PARA GARANTIR RETORNO DOS INVESTIMENTOS (E DO PROPÓSITO)
A partir desses casos de sucesso, há algumas boas práticas que podem ser destacadas. Primeiro, é importante definir uma Governança para garantir que o habitat cumpra o seu propósito, conforme as definições já expostas. A coordenação precisa ser exercida por uma organização líder no ecossistema local, que precisa garantir que o habitat seja ocupado por operações complementares. Assim, com o sucesso das ações de inovação, criará um movimento natural de ocupação que irá valorizar o espaço. Portanto, é a governança que também garantirá o retorno dos investimentos imobiliários realizados.
Em seguida, é muito importante que seja definida a vocação ou especialização do habitat. Isso é fundamental para que todas as ações que venham a ser desenvolvidas naquele espaço tenham foco e sinergia. Novamente, não há uma regra fixa, mas percebe-se que centros de inovação que priorizam uma ou duas verticais de negócios tendem a avançar de forma mais ágil, com melhores resultados.
Percebe-se que um habitat de inovação precisa ter relacionamento muito próximo com as estratégias de desenvolvimento econômico do ecossistema. Inicialmente devem ser considerados os setores econômicos mais importantes para a região no presente, também considerando aqueles setores que serão relevantes no futuro.
Essa questão da especialização pode ser um desafio para localidades onde seus ecossistemas de inovação ainda não estão maduros, pois novos centros de inovação, focados em um setor específico, podem gerar uma alienação dos atores dos demais setores não atendidos. Uma possível solução para isso, baseada no caso do 22@, é criar um parque ou bairro de inovação, dentro do qual poderão ser instalados vários centros de inovação, cada um com uma vocação bem definida.
Uma vez definida a questão da especialização, é necessário definir o que deve acontecer no habitat para que o empreendedorismo inovador ocorra de forma sistêmica. Pode-se começar por serviços e atividades que estimulem a proposição de desafios de inovação, com a respectiva criação de ideias de negócios inovadores, a serem filtradas e desenvolvidas.
Nesse sentido, são importantes os serviços como coworking, eventos, maratonas de inovação (hackathons), e capacitações, direcionando as ideias e empreendimentos gerados para uma pré-incubadora ou uma incubadora. Nessa fase também é fundamental atrair as empresas e outras organizações relevantes na região, para apoiar esses serviços já mencionados e também desenvolver projetos de inovação dentro do habitat sob uma perspectiva de inovação aberta, seja via interação com startups, ou com outros parceiros como laboratórios de pesquisa, ou Instituições de Ciência e Tecnologia (ICT).
A rotatividade de projetos torna o habitat “oxigenado” pelas novas ideias e iniciativas
Uma vez que o centro de inovação começa a se consolidar, outras atividades naturalmente podem ser agregadas. A presença de fundos de investimento e de aceleradoras de startups cujas teses sejam convergentes com a especialização do espaço torna-se importante, bem como a presença de instituições educacionais com cursos voltados às principais necessidades de competências detectadas para a produção de inovações no local. Fablabs, para a prototipação de hardware, também podem ser bem-vindos.
Outro ponto importante é definir a existência, ou não, de empresas permanentemente residentes no habitat de inovação, uma questão complexa. Claramente, os serviços principais de suporte às atividades de inovação, tais como coworking, pré-incubadora, incubadora, fablab, laboratório de inovação aberta, aceleradora, fundos de investimento, etc. precisam ser residentes permanentes no centro de inovação.
No entanto, startups ou empresas estabelecidas que desejam operar nesse espaço idealmente deveriam ter sua presença temporária, orientada por projetos de inovação. Como o espaço em centros de inovação é escasso, a presença permanente de apenas algumas empresas pode criar uma espécie de “reserva de mercado” que pode gerar conflitos no ecossistema. Além de evitar esse problema, a rotatividade de projetos torna o habitat “oxigenado” pelas novas ideias e iniciativas que constantemente passam a ser executadas no local.
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Mas qual seria uma solução para empresas que queiram estar permanentemente ligadas aos centros de inovação? Em parques ou tecnológicos, os planos urbanísticos precisam prever espaços para essa demanda. E, em centros de inovação, há uma oportunidade interessante para a ocupação de imóveis ao redor, ou a construção de novos equipamentos com essa finalidade, o que pode acontecer de forma organizada, com ganhos para todos os atores do ecossistema.
Com a aceleração da virtualização das relações de trabalho a partir da pandemia da Covid-19, há algumas mudanças que precisarão ser consideradas pelas governanças dos habitats de inovação. Como a inovação é uma atividade intensivamente social e criativa, as interações presenciais continuarão sendo fundamentais, dada a necessidade de alta qualidade de comunicação e interatividade.
Então os espaços físicos daqueles centros de inovação que estão efetivamente cumprindo os seus propósitos continuarão sendo importantes e valorizados. E as tecnologias de comunicação poderão aumentar muito o alcance das atividades dos centros de inovação.
A questão é saber a dosagem do virtual e do presencial, algo que renderá bons conteúdos e experiências no futuro próximo.
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