Criciúma dá a largada para a criação do Vale do Carbono

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Criciúma dá a largada para a criação do Vale do Carbono

Empreendedores do sul catarinense unem forças para estimular novos e inovadores negócios na capital do carvão

Um século após a descoberta do “ouro negro”, empreendedores do sul catarinense unem forças para estimular novos e inovadores negócios na capital do carvão

Há pouco mais de um século, uma pequena cidade no sul de Santa Catarina começava a se valer do potencial econômico de um mineral abundante encravado em seu solo, o carvão. Descoberto no final do século XIX, quando foi fundada a cidade de Criciúma, o carvão era utilizado até então basicamente para aquecer os fornos das ferrarias locais. Na segunda metade da década de 1910, o destino econômico da cidade mudou com a abertura da primeira mina de carvão (1915) e a chegada da linha férrea (1919) que transportaria o “ouro negro” até a região de Laguna, dando impulso para a industrialização do país. Foi o início do ciclo do carvão que fez a cidade, ao longo das décadas seguidas, ganhar relevância econômica até se tornar o maior município do Sul catarinense.

Cem anos depois, em plena era digital, empreendedores locais começam um movimento para estimular uma nova atividade econômica de base tecnológica, mas sem perder as raízes. O projeto de um Vale do Carbono, idealizado por profissionais que atuam em empresas de TI, marketing e design, ganhou um impulso no último sábado, 20 de maio, com a realização do Vale do Carbono Conference, um encontro que reuniu 260 pessoas na sede da Associação Comercial e Industrial de Criciúma (ACIC), com palestras sobre negócios (como criar uma startup, levantar recursos, participar de programas de capacitação e aceleração) e programação, divididas em duas trilhas com o nome dos coletivos – Conexão Startup e Criciúma Dev – que deram início ao conceito do Vale do Carbono.

Foi a partir do ano passado que estes dois grupos independentes começaram a agitar a comunidade de empreendedores, desenvolvedores de software e agências digitais que vem crescendo na região, com encontros regulares. Os primeiros passos começaram com um grupo de amigos, que promoveram no início de 2016 o encontro Criciúma Dev, voltado para os programadores da região e que reuniu 35 pessoas. No meetup seguinte, foram 120. “Não tinha nada aqui na região há pouco mais de um ano. Quem queria discutir sobre tendências de negócios, tecnologias e empreendedorismo tinha que ir pra Porto Alegre ou Florianópolis participar de eventos”, conta Mateus Vicente, um dos organizadores dos encontros do grupo Criciúma Dev.

 

Encontro do Conexão Startup em Criciúma: 30 eventos em poucos meses e expansão para Tubarão e Araranguá / Foto: Divulgação

Enquanto isso, outros empreendedores da cidade, motivados pelo sucesso da edição local do Startup Weekend, davam início ao grupo Conexão Startup, mais focado em gestão e negócios, e começaram a se encontrar semanalmente em uma incubadora. “A ideia era fazer um day after reunindo o pessoal que participou do Startup Weekend e estava cheio de gás para empreender. A partir de outubro, fizemos um calendário semanal e desde então já realizamos mais de 30 encontros”, explica Valmor Rabelo, fundador da incubadora In Site, que abrigou os primeiros eventos. Em pouco mais de seis meses, o Conexão Startup ganhou edições nas outras duas maiores cidades da região sul do estado, Araranguá e Tubarão.  

O crescimento orgânico das duas iniciativas levou Valmor, Mateus, Leandro Benincá, CEO da startup local Organizze, e Rafael Rocha, da consultoria Multiverso, a promover um evento em conjunto para potencializar as diversas iniciativas e encontros que acontecem na região. “A ideia do Vale do Carbono é fazer esse alinhamento com todos que estão construindo o ecossistema de inovação local. Não queremos organizar, centralizar, mas criar uma linha de conexão entre essas atividades, de forma uníssona”, define Valmor.

“O que vai desenvolver as cidades é o vetor de tecnologia e inovação. Por isso, o Vale do Carbono é um olhar respeitando e agradecendo o passado, mas com um olhar para o futuro” – resume Valmor Rabelo, um dos organizadores do encontro.

Inspiração mineira

Do lado dos desenvolvedores, a inspiração está na forma como outra região fértil em minérios desenvolveu seu ambiente de tecnologia: o San Pedro Valley, comunidade de startups que nasceu em Belo Horizonte (MG) e colocou a capital mineira no mapa nacional de inovação e empreendedorismo. “Esse é nosso modelo. Queremos fazer um mapa com as principais startups de Criciúma e das cidades próximas, criar um roteiro para visitas, disponibilizar as vagas, colocar marca nas empresas da região, fazer um núcleo com os fundadores… todo mundo tem várias ideias para darmos sequência, só nos falta tempo”, diz Mateus.

Painel do Criciúma Dev reuniu diversas palestras técnicas durante o Vale do Carbono Conference. / Foto: Fabrício Rodrigues

Diversas startups surgiram na região nos últimos anos, criadas por empreendedores que vieram de grandes empresas locais e que resolveram tocar seus próprios projetos. Foi assim que nasceram negócios que vem crescendo a passadas largas, como Simples Dental, Organizze, Dev In Box, Bee e Portabilis (estas duas, com sede na cidade vizinha Içara).

Entre as próximas ações do grupo está a busca por apoio político para criação de leis que apóiem o desenvolvimento de startups, como as leis de inovação recém sancionadas em cidades como Florianópolis e Tubarão. “Precisamos mostrar a importância dessas empresas como emissoras de ISS para os municípios locais. Todas estão crescendo bastante, mas a classe política ainda não se deu conta disso”, lamenta Mateus.

Carvão do passado e do futuro  

Engenheiro elétrico “de origem analógica”, como se define, Valmor Rabelo percebeu, há quase 10 anos que o futuro da região passava pelo estímulo a novos negócios. Inspirado nas incubadoras que atuavam com sucesso em Florianópolis, trouxe a ideia a Criciúma e inaugurou, em 2010, a In Site, que hoje conta com 11 empresas incubadas e cinco já graduadas. Com o avanço de novas tecnologias e modelos de negócio disruptivos, além da bagagem como empreendedor, sua motivação agora é compartilhar e estimular as novas gerações, sem esquecer das origens da região:

“O carvão nos trouxe até aqui, foi a riqueza que fez com que essa região prosperasse até então. As cidades não podem mais depender de commodities e da extração mineral, mas o carbono pode ser o futuro também, com o uso dos grafenos e das fibras para substituir materiais como o aço. O que vai desenvolver as cidades é o vetor de tecnologia e inovação. Por isso, o Vale do Carbono é um olhar respeitando e agradecendo o passado, mas com um olhar para o futuro”.