[OPINIÃO] Contratação pública de produtos inovadores, novas regras licitatórias e o exemplo pioneiro de SC

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[OPINIÃO] Contratação pública de produtos inovadores, novas regras licitatórias e o exemplo pioneiro de SC

Desde 2020, SC conta com aparato jurídico facilitador de contratações que incentivem a resolução de problemas públicos pelo uso da inovação.

Santa Catarina é exemplo de um primeiro passo no caminho da modernização do aparelho estatal: desde 2020 o estado conta com aparato jurídico facilitador de contratações que incentivem a resolução de problemas públicos pelo uso da inovação. / Foto: Scott Graham (Unsplash)


[07.03.2022]

AUTORES:
Julia Santana Vicente, bacharela em Administração Pública pela (UDESC) e atuante na área de governo eletrônico;
Ellen da Silva Honorato, estudante de Direito pela Univali e de Administração Pública na UDESC; 
Rafael Fernando Bezerra Filho, bacharel em Direito pela Univali

Apesar da onda de modernização do aparelho estatal que ascendeu com constância por meio da promoção de produtos inovadores -principalmente de viés tecnológico- nas últimas décadas, a Lei nº 8.666 de 1993 que regia com exclusividade os procedimentos pertinentes às contratações de produtos e serviços pela Administração Pública até meados do ano de 2021, carecia de dispositivos específicos que normatizassem a contratação destes produtos inovadores. Assim, as poucas menções ao termo “inovação” presentes na lei se referem à margem de preferência para produtos manufaturados e serviços nacionais resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no país. 

As contratações de produtos inovadores até então se davam comumente pela contratação direta por inexigibilidade de licitação em razão da inviabilidade da competição, geralmente ocorrendo pela exclusividade do objeto ou pela falta de concorrentes. Por conseguinte, surgiu a necessidade de em uma futura atualização da norma aprofundar debates sobre aparatos jurídicos mais abrangentes nesse sentido.

DECRETO Nº 842/20 DO ESTADO DE SANTA CATARINA

O estado de Santa Catarina é exemplo de um primeiro passo importante dado no caminho da modernização do aparelho estatal, ao passo que desde 2020 proporciona um aparato jurídico facilitador de contratações que incentivem a resolução de problemas públicos através do uso da inovação em seu significado mais puro:

Novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo e social que resultem em novos produtos, serviços ou processos ou que compreendam a agregação de novas funcionalidades ou características a produto, serviço ou processo já existente que possam resultar em melhorias e em efetivo ganho de qualidade ou desempenho.

O Decreto nº 842/20 dispôs sobre o planejamento da contratação, o documento detalhado das necessidades da demanda com estudo e pareceres técnicos, a menção à matriz de riscos, as condições para o edital de chamamento público, a avaliação e escolha das soluções de relevância pública recebidas, a gestão contratual, bem como as possíveis parcerias tangentes a acordos de cooperação técnica. Definiu-se a Secretaria do Estado da Administração, com contribuição da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável, como o órgão do Poder Executivo responsável por instituir uma Comissão Especial de Análise de Soluções Inovadoras referente aos chamamentos públicos, envolvendo ainda os setores específicos da Diretoria de Tecnologia e Inovação e da Diretoria de Gestão de Licitações e Contratos.

A NOVA LEI DE LICITAÇÕES

Em nível nacional, o novo regramento sobre Licitações e Contratos Administrativos instituído pela Lei nº 14.133 de 2021 traz, além do processo licitatório tradicional, alguns dispositivos que permitem um olhar mais atencioso à contratação de soluções inovadoras. Dentre os fomentos, está a adição da modalidade licitatória do diálogo competitivo.

O diálogo competitivo poderá ser utilizado em compras ou contratações de obras ou serviços, além de concessões de serviços públicos e parcerias público-privadas. Contudo, suas hipóteses de incidência se restringem ao disposto no art. 32 da nova lei, quais sejam: contratações que envolvam inovação técnica ou tecnológica, quando as soluções disponíveis no mercado não satisfazem as necessidades da Administração Pública e/ou quando as especificações técnicas não puderem ser definidas com precisão pela Administração Pública.

Ademais, também se aplica quando a Administração Pública verifica a necessidade de definir e identificar os meios e as alternativas que possam satisfazer suas necessidades, com destaque aos aspectos da solução técnica mais adequada, dos requisitos técnicos aptos a concretizar a solução já definida e a estrutura jurídica ou financeira do contrato.

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A modalidade se divide em duas etapas: o diálogo e a competição. Na primeira, a Administração Pública desenvolve um diálogo com cada licitante no intuito de buscar a solução que resolverá a sua necessidade, ouvindo cada proposta até que seja encontrada a mais adequada, podendo ser mais de uma. Escolhida a solução para a necessidade apontada, abrir-se-á a fase da competição, de forma semelhante à concorrência, onde os licitantes deverão apresentar suas propostas em um prazo de 60 dias, ocasião em que a Administração Pública escolherá a opção  mais vantajosa considerando os critérios estabelecidos no edital.

A nova modalidade agora legitima o contato informal que já acontecia anteriormente entre a Administração Pública e o particular. Em suma, o diálogo competitivo ocorre quando a Administração Pública não possui conhecimento e/ou técnica suficiente para satisfazer determinada necessidade e, por isso, recorre aos particulares para alcançar seu objetivo. Ainda, uma vez que o setor privado contém profissionais qualificados em diversas áreas de atuação, essa alternativa contribui de maneira frutífera à medida que permite que o poder público também possa se manter atualizado com os mais novos recursos disponíveis no mercado.

Com o fim do período de transição legislativa, a partir de abril de 2023, cai por terra o modelo de coexistência de duas normas licitatórias. Com isso, os órgãos da Administração Pública devem se adequar às mudanças promovidas pela regência exclusiva da nova lei nas contratações públicas e se inteirar das tendências advindas deste movimento definitivo. O debate acerca da aceleração da modernização da máquina pública brasileira com vistas à resolução de problemas públicos e automatização de processos por meio da promoção de produtos inovadores e tecnológicos é uma dessas tendências.

Portanto, é de valia estar a par de casos como o de Santa Catarina, que abrem portas e propiciam boas práticas em direção a este caminho.

REFERÊNCIAS:

1. BRASIL, Lei n. 14.133 de 01 de abril. 2021.
Lei de Licitações Contratos Administrativos. Diário Oficial da União, 02 abril. 2021.  Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14133.htm
Acesso em 29 jan. 2023
2. BRASIL, Lei n. 8.666 de 21 de julho de 1993.
Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm  
Acesso em 29 jan. 2023
3. SANTA CATARINA, Decreto nº 842 de 17 de setembro de 2020.
Dispõe sobre o processo de contratação de soluções inovadoras que contribuam com questões de relevância pública para a Administração Pública Estadual Direta e Indireta. Diário Oficial do Estado de Santa Catarina; 18 de setembro de 2020. Disponível em: https://leisestaduais.com.br/sc/decreto-n-842-2020-santa-catarina-dispoe-sobre-o-processo-de-contratacao-de-solucoes-inovadoras-que-contribuam-com-questoes-de-relevancia-publica-para-a-administracao-publica-estadual-direta-e-indireta  
Acesso em 29 jan. 2023.

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