Alex Lima, fundador da Glóbulo e idealizador do Brazilian Makers, grupo que começou em 2018 a conectar empreendedores de SC ao mercado de inovação de Portugal, defende um movimento que una a tecnologia à economia criativa. Foto: Larissa Trentini/Divulgação
Reportagem: Fabrício Rodrigues – scinova@scinova.com.br
A conexão histórica entre Portugal e Santa Catarina – resultado da colonização de algumas cidades do litoral do estado no século XVIII – ganhou um novo capítulo ao longo de 2018 com a aproximação entre empreendedores lusitanos e manezinhos que atuam no setor de tecnologia e inovação.
Um dos primeiros passos foi dado, de maneira bem informal, pela Glóbulo, empresa que atua no reposicionamento de marcas e que gerencia o Sebraelab, coworking de economia criativa em Florianópolis. A ida dos sócios a Lisboa para apresentar o ecossistema local, em meados do ano passado, rendeu uma missão liderada pelo Startup Portugal a Santa Catarina no mês de setembro, uma participação catarinense no mega evento de inovação WebSummit (o maior da Europa, que reuniu mais de 70 mil pessoas na capital portuguesa) e novos contatos entre os empreendedores de lá e cá que devem se fortalecer a partir de 2019.
Para Alex Lima, CEO e fundador da Glóbulo, além da conexão com os lusos, o desafio para o desenvolvimento do ambiente de negócios em Santa Catarina passa por conectar o que acontece no ambiente local de TI à economia criativa: “todo mundo já percebeu ou foi impactado pela transformação digital. Mas o que pouca gente percebeu é que há outra mudança radical no caminho, que é a transformação criativa. Há um enorme potencial nisso para repensarmos a maneira como as novas tecnologias estão mudando o nosso dia a dia”, reflete Alex.
Nesta entrevista para o SC Inova, ele aborda as perspectivas que este ‘namoro’ com o mercado português pode trazer ao estado no longo prazo e destaca, principalmente, a necessidade de desenvolver a importância da criatividade para fazer diferente no ambiente de negócios: “o diferente é o novo ouro”, define.
SC Inova – Vocês criaram a ideia do movimento “Brazilian Makers” para aproximar os empreendedores aqui de Santa Catarina ao mercado de inovação de Portugal. O que podemos esperar dessa conexão, resultados e negócios, para 2019?
Alex Lima – A gente criou essa ideia para apresentar o ecossistema de Santa Catarina pra eles, logo depois a comitiva do Startup Portugal veio aqui e eles conheceram vários empreendedores. Já na nossa segunda ida, durante o Web Summit, em novembro, o objetivo não era mais falar do ecossistema, mas da possibilidade de internacionalização de algumas empresas que se mostraram interessadas nessa conexão. Não é só uma de “vamos fechar negócio agora” mas algo como “entenda o que está acontecendo, quem são as empresas interessadas em internacionalizar se abrirem portas” e foi isso que a gente fez, uma espécie de soft landing.
O resultado vem depois, não queremos vender serviço pontualmente, estamos ainda na sementinha. A construção disso tá sendo bem bacana porque lá é um mundo gigantesco de oportunidade para quem é daqui e vice-versa.
Há interesses de ambas as partes e algumas coisas já estão acontecendo, como um contato entre a Geekhunter (startup que desenvolve plataforma para ajudar empresas a contratar profissionais de TI) e a inglesa Landing Jobs, por exemplo. A bola estava quicando e o Brazilian Makers deu esse primeiro chute.
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SC Inova – Além do interesse entre as empresas, há um apoio formal de governos?
Alex Lima – Não posso falar por parte do governo, mas a embaixada brasileira em Lisboa nos abriu as portas para reuniões, eventos etc. E a gente viu lá no Web Summit como os portugueses levam isso a sério e colocaram como prioridade – o presidente abriu e o primeiro ministro encerrou a programação, eles investiram forte para o evento continuar em Lisboa nos próximos dez anos.
O interessante para os portugueses é que Santa Catarina é uma porta para o mercado latino americano, assim como eles podem ser a conexão catarinense para a Europa. Temos muitas similaridades, além da língua: indústria, população, turismo e agora o mercado de tecnologia, isso foi bem destacado na apresentação feita a eles na Fiesc.
E hoje temos uma aproximação entre o Sebrae e o Startup Portugal, por exemplo, e eles estão presentes no Startup Summit, que acontece aqui em Florianópolis em agosto. O governo deveria se antenar nisso – se tiver a perspicácia de abrir essas portas há um caminho extremamente positivo. O corpo federativo (entidades, associações empresariais) e os empreendedores aqui do estado já começaram esse trabalho de olhar para fora.
SC Inova – Agora além de Portugal, que perspectivas – e desafios – você enxerga para o ambiente de inovação aqui no estado para 2019? Que caminhos seguir para se consolidar dentro e fora do país?
Alex Lima – No TEDx deste ano levantei uma bandeira que acredito bastante. Todo mundo já reconheceu que estamos passando por um momento de transformação digital, com impactos na gestão, produto, venda, o contexto inteiro. Por outro lado há uma transformação que ninguém tá vendo, que é a transformação criativa. Isso dá um outro grau. Alguns desses movimentos já estão acontecendo, em espaços como o Sebraelab, dedicado à economia criativa, a criação do Floripa Conecta nesse ano, que vai nesse sentido também. O poder está na junção da tecnologia com o fator cultural – não basta fazer um app, tem que gerar um engajamento social para que ele funcione, ganhe corpo.
Aqui no Brasil a gente adora falar do Vale do Silício, então vamos pegar a mistura deles, as empresas de tecnologia das garagens à bagagem cultural, a cultura hippie que surgiu lá… em Florianópolis tem umas fagulhas surgindo, podemos juntar a Maratona Cultural com o ambiente tech, pensar modelos de negócio muito diferentes, que possam resolver problemas a partir da transformação criativa.
SC Inova – Você acredita então que há talento reprimido aqui na cidade?
Alex Lima – Muito, muito talento reprimido. E por que? Porque há uma tendência de fazer as coisas da mesma maneira. Não vou mudar o setor do turismo se eu continuar direcionando o dinheiro para as mesmas coisas feitas há 10 anos. Como é que eu vou ter um resultado diferente? Pensando diferente, com ideias transversais.
Voltando a Portugal, por exemplo. Eles foram mais uma vez escolhidos o segundo melhor destino turístico do mundo. Por que não entender o que eles fizeram e pensar aqui com nossos recursos? O mercado de vinhos de Santa Catarina também pode aprender bastante com o de lá.
A questão é: a transformação digital está fazendo com que muitas funções que temos deixem de ser essenciais, e isso acontece numa velocidade absurda – sistemas podem fazer o que eu faço hoje, por exemplo. Ou eu e minha empresa podemos ser pego de surpresa ou então posso buscar outras formas de aprender a me tornar novamente necessário.
SC Inova – O que falta para uma cidade que é relevante em tecnologia ser também uma cidade criativa?
Alex Lima – Repensar processos e modelos de negócio mesclando transformação digital e a transformação criativa é o caminho. É legal levantar a bandeira de “cidade criativa”, mas tem que deixar do discurso pra prática, quebrar o mindset em definitivo, parar de replicar o de sempre, muita coisa tem que ser repensada.
O diferente é o novo ouro. E temos muita gente boa aqui no estado capaz de fazer – e inclusive já está fazendo – o diferente.
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