Evento promovido pelo Ágora Tech Park reuniu cerca de 170 docentes, estudantes e empreendedores para debater como transformar conhecimento acadêmico em soluções reais para a sociedade. / Foto: Divulgação Ágora
[JOINVILLE, 14.05.2025]
Redação SC Inova, scinova@scinova.com.br
Com o objetivo de capacitar pesquisadores e professores universitários a transformar conhecimento científico em soluções com impacto real no mercado, o Ágora Tech Park deu início, na última sexta-feira (09.05), a terceira edição do programa Ágora.Experts. A programação reuniu cerca de 170 participantes — entre docentes, estudantes, empreendedores e especialistas em propriedade intelectual — em uma imersão voltada à transferência de tecnologia e ao fortalecimento de uma cultura de inovação aplicada. O evento contou com apoio da Softville, da Join.Valle e foi viabilizado com recursos da Fapesc.
O programa foi estruturado em duas etapas. A primeira trouxe palestras e debates sobre temas como patentes, direitos autorais, transferência de tecnologia e a estruturação de negócios acadêmicos. Já a segunda fase, marcada para os dias 13 e 14 de junho, terá foco prático, com metodologias voltadas à validação de projetos e à consolidação de competências empreendedoras entre os participantes.
O ponto alto do evento foi a palestra de abertura do ex-ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Paulo Alvim, que compartilhou uma visão ampla e estratégica sobre o papel da ciência brasileira em um cenário global em transformação. “Joinville sempre foi um espaço de inspiração”, afirmou, ao lembrar a trajetória industrial e tecnológica da cidade. Segundo ele, o desafio atual vai além da geração de conhecimento: trata-se de transformá-lo em soluções concretas — e mensuráveis. “O que estamos falando aqui, no fundo, é de inovação: transformar conhecimento em solução, e solução em mercado”, sintetizou. Para Alvim, a ciência brasileira precisa deixar de ser apenas produtora de artigos e assumir o protagonismo como geradora de nota fiscal.
O ex-ministro também chamou atenção para fronteiras tecnológicas e ambientais ainda pouco exploradas, como o espaço e o mar, e defendeu que o Brasil tem uma vantagem comparativa única: sua capacidade de formar capital humano com diversidade, criatividade e capilaridade. “O planeta está no limite. A ciência tem tudo por fazer no campo dos renováveis. O Brasil pode ser o grande gerador de soluções para o hemisfério sul. O norte não vai olhar por nós — esse é o nosso papel”, reforçou, destacando áreas emergentes como a computação quântica, a pesquisa genômica e o uso inteligente da biodiversidade.
DO LABORATÓRIO À STARTUP: TRANSFORMANDO PAPER EM PIB
Logo após a palestra, um painel reuniu trajetórias inspiradoras de quem viveu na prática o desafio de transformar pesquisa em negócio. Participaram a empreendedora e pesquisadora deep tech Márcia Santana, fundadora da DBM Nano, e o professor Giuseppe Pintaude, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), ex-coordenador do campus Curitiba.
Com uma fala direta e provocadora, Márcia compartilhou sua jornada da academia ao empreendedorismo. “Transpusemos os muros da universidade e transformamos paper em PIB”, resumiu. Ex-professora de programas de mestrado da UniSociesc, ela teve seu primeiro projeto rejeitado — experiência que, segundo ela, foi decisiva para buscar o ecossistema de inovação. A partir daí, ingressou no Sinapse da Inovação (atual Centelha) e venceu a primeira edição do programa JEDI, em 2019. Hoje, à frente da DBM Nano, lidera o desenvolvimento de biossensores capazes de identificar H. pylori a partir da saliva, em parceria com a UFPR.
No painel, ela fez um alerta crucial para quem deseja empreender a partir da ciência: “Publicar artigo e registrar patente não caminham juntos. Se você publica antes, perde o direito à patente. Essa conta precisa ser feita”, afirmou, destacando a importância de contar com o suporte de advogados, contadores e especialistas para estruturar negócios inovadores com solidez.

Na sequência, o professor Giuseppe compartilhou os aprendizados de sua atuação à frente da incubadora da UTFPR em Curitiba. “Tive que transformar um ambiente sombrio em um espaço de acolhimento — e isso começa pelo design”, contou. Para ele, o desafio vai além da infraestrutura: é cultural. “Temos que continuar insistindo na cultura do empreendedorismo na universidade. Em um universo de dez mil alunos, hoje apenas uma startup incubada segue com contrato ativo. É pouco. Precisamos avançar na formação orientada a resultados e impacto real.”
PROPRIEDADE INTELECTUAL COMO FERRAMENTA DE TRANSFORMAÇÃO
Encerrando a programação, a palestra Propriedade Intelectual como Ferramenta para Transformar — seguida por um painel temático — trouxe números e reflexões sobre o papel da PI na geração de valor econômico e social. Os especialistas da Luthier, André Gosmann e Fernando Müller, apresentaram uma visão clara e atualizada sobre a importância estratégica do tema: 45% do PIB brasileiro está relacionado a empresas que têm a propriedade intelectual como base, e países que investem nessas ferramentas apresentam 22% a mais de inovação.
“Mesmo com os avanços da inteligência artificial, do outro lado da tecnologia sempre haverá um ser humano”, provocou Fernando, ao destacar que o capital intelectual bem gerido continua sendo um diferencial competitivo essencial. André, por sua vez, apresentou dados que mostram o crescimento consistente da PI no mundo — com aumento anual de 3,6% — e reforçou que proteger descobertas não é privilégio de setores de ponta. “A propriedade intelectual se aplica a todas as áreas. É possível mapear tendências, proteger ideias e transformar pesquisa em solução concreta”, afirmou.
Hidrogênio verde, biomateriais, nanotecnologia e inteligência artificial figuram entre os campos mais promissores. Mas a lição principal foi clara: sem estratégia de proteção, não há inovação que se sustente.
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