Projetos inteligentes e sustentáveis em espaços verdes urbanos podem transformar verdadeiramente as cidades, fazendo com que elas se tornem sistemas vivos de resiliência climática. / Imagem: Divulgação
[18.07.2024]
Por Patricia Akinaga, arquiteta urbanista e Doutora em Paisagem e Ambiente
Recentemente, o Senado aprovou um projeto de lei que determina que todas as cidades do Brasil tenham um planejamento de adaptação às mudanças climáticas, com medidas integradas para mitigar seus impactos. A proposta ganhou força, evidentemente, por conta das fortes chuvas que assolaram o Rio Grande do Sul. E nesse processo de adaptação existe uma peça-chave que é de extrema importância para a construção (e, em alguns casos, reconstrução) de cidades mais resilientes: a arquitetura paisagística.
Mais do que embelezar e melhorar a qualidade visual das cidades, parques, praças e jardins fazem parte da infraestrutura urbana para mitigar o impacto das mudanças climáticas que causam enchentes, ilhas de calor e escassez de água. Isso porque, muito além da estética, o paisagismo se baseia em princípios ecológicos que permitem gerenciar a água de forma eficiente, reduzir as temperaturas urbanas e criar habitats biodiversos.
Pensar em projetos inteligentes e sustentáveis em espaços verdes urbanos pode transformar verdadeiramente as cidades, fazendo com que elas se tornem sistemas vivos de resiliência climática. Por isso, o desenho urbano precisa ser pautado pelas potencialidades e limitações dos recursos naturais, conciliando a ocupação urbana e a natureza através de ferramentas como implantação de infraestrutura verde, hortas comunitárias, jardins de chuva e plantio massivo de árvores. Ou seja, as áreas verdes precisam ser vistas como artefatos de engenharia.
Hoje, muitas cidades têm como modelo de drenagem padrão as superfícies impermeáveis, que escoam a água até os rios ou canais. Como consequência da ausência de permeabilidade, aumento da velocidade do fluxo, e grandes volumes em tempo reduzido, a água acaba acumulando e transbordando, causando alagamentos. Por isso, mais do que pensar em estruturas de condução e contenção, é necessário que sejam incluídas diretrizes claras de um urbanismo que incorpore as áreas verdes de forma estrutural, e não acessória, na legislação urbana municipal – a chamada infraestrutura verde.
Exemplos disso são os bairros ecológicos, que são caracterizados por um comércio diversificado, áreas cívicas e espaços públicos verdes conectados por um sistema viário, uso diversificado do solo, percursos adequados para ciclistas e pedestres e uso de lotes vazios e subutilizados como novas âncoras da infraestrutura.
A IMPORTÂNCIA DE UM PACTO ENTRE A SOCIEDADE
O papel do arquiteto urbanista e paisagista é estratégico na configuração desses projetos, porque é esse profissional que vai não só desenhar toda essa paisagem, mas também alinhar os interesses da população, da iniciativa privada e do poder público. O pacto entre os diversos segmentos da sociedade é fundamental para que os ditos projetos verdes sejam mais do que instrumentos de propaganda, já que, isolados, eles não promovem a transformação necessária para a criação de cidades verdadeiramente resilientes.
Podemos citar alguns exemplos bem sucedidos dessa arquitetura verde, como os jardins de chuva de Portland e Seattle, bem como suas hortas comunitárias; os Corredores Verdes na Colômbia (foto acima), que arborizaram as rotas de 18 ruas e 12 hidrovias, reduzindo o efeito de ilha de calor; e o projeto de reuso da água e alagados construídos do Parque Estadual Jequitibá, que preserva mais de um milhão de metros quadrados de Mata Atlântica.
Por fim, é importante ressaltar que não podemos nos deixar seduzir por uma ideia de sustentabilidade, ela precisa realmente existir na prática e ser acessível a todos. Obras caras com finalidade comercial antes de ambiental – o chamado greenwashing – só servem para satisfazer uma ambição pontual de investir em tecnologia e projetos verdes, sem representar uma abordagem verdadeiramente aplicável em escala e como sistema.
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