Pioneira da TI em Florianópolis apostou em guinada de inovação na gestão e nos processos e espera dobrar o faturamento em cinco anos. / Fotos: Giovanni Bello
Se Florianópolis é hoje um importante polo de empresas de TI – com cerca de 3 mil empresas que faturam R$ 11,4 bilhões ao ano e empregam mais de 47 mil pessoas, segundo o Acate Tech Report – a Dígitro Tecnologia tem uma parcela de responsabilidade. Criada em 1977 por três sócios (os engenheiros José Fernando Xavier Faraco, hoje no Conselho de Administração, Marcos Regueira e Lúcio Prazeres, que depois saíram), foi a primeira empresa privada do setor na Capital, que na época tinha sua economia baseada no serviço público e estava longe de outras cidades catarinenses (leia-se Blumenau e Joinville), que já tinham algumas companhias de base tecnológica.
Desde que criou seu primeiro produto – um placar eletrônico instalado no estádio do Figueirense – a Dígitro, que atua com soluções para telecomunicações corporativas, inteligência, contact center, inteligência e operações, acompanhou diversas transformações no setor de TI: da fase em que o Brasil passou sob uma arcaica lei de reserva de mercado para produtos de informática (1984-1991) até a abertura econômica e a privatização do sistema Telebrás (1998). Este período representou uma guinada de negócios na empresa, com o lançamento, em 1999, de um sistema de inteligência para o setor público, o Guardião. Foi a tecnologia que auxiliou a justiça brasileira a ressarcir os cofres públicos em mais de R$ 40 bilhões nas investigações da Operação Lava Jato.
Mas foi na era das startups e dos modelos de negócio em nuvem que a empresa – com um portfólio de 1,2 mil clientes em diversos países, 440 colaboradores e um faturamento de R$ 98 milhões (2017) – enfrentou um de seus maiores processos de transformação. “Nós éramos uma empresa de engenheiros introspectivos”, comenta Adriano Dias, assessor de Desenvolvimento de Negócios Estratégicos da Dígitro, “mas estamos mudando esse perfil”. Ele se refere à figura low-profile dos três sócios que lideraram a companhia nas últimas décadas: José Fernando, Geraldo Augusto Xavier Faraco e Milton Espíndola, atual CEO.
Nesta época de transformações no cenário corporativo, a Dígitro percebeu que ser uma companhia arraigada em modelos convencionais de gestão poderia custar a competitividade e até mesmo a maneira de pensar a inovação. Desta vez, a mudança não viria por meio de uma tecnologia, mas sim a partir das pessoas, em um processo de “rejuvenescimento”, como diz Adriano. Desde 2016, quando se tornou uma S.A. com capital fechado, a empresa mudou a estrutura organizacional, fundindo áreas comerciais (o que levou a uma redução significativa neste setor), implantando novos processos e buscando um novo perfil de equipe, onde competências como “intraempreendedorismo” e “multidisciplinaridade” seriam requisitos básicos.
“Havia muitas áreas fazendo as mesmas coisas e fizemos algumas fusões internas. Mudamos também a visão de chefia, adotamos algumas premissas de startups, temos bons profissionais trabalhando em home-office e produzindo mais. Isso demanda multidisciplinaridade no capital humano, que antes era estritamente funcional. Sentimos uma rotatividade maior em postos-chave, em lideranças que estavam há muitos anos na empresa mas que não se adaptaram. Os desligamentos foram decorrentes de uma máquina que estava inchada na atividade meio”, resume.
Em 2012, por exemplo, a empresa tinha cerca de 700 colaboradores. Por outro lado, áreas como o desenvolvimento de TI se manteve sem muitos sobressaltos, enquanto outras foram criadas, caso do Customer Success (Sucesso do Cliente), a nova maneira de chamar o conhecido pós-venda. Atualmente, há pelo menos 40 vagas abertas em áreas como Análise de Sistemas, Comercial, Design e Desenvolvimento, entre outras.
“Tínhamos muito a figura do vendedor antigo, que substituímos pelo gestor de contas. O modelo de negócio da Dígitro tem compelido os profissionais a serem mais esse perfil de gerente, um CS, do que simplesmente um vendedor. Tem que manter o cliente satisfeito e a postura do pessoal de campo mudou. Nossa maior reinvenção está sendo na área de marketing e ainda temos uma caminhada longa”, explica o assessor.
Toda essa mudança, que começou em 2016, gerou resultados positivos na empresa ao longo do ano passado: o faturamento cresceu 21% e a expectativa é manter esse ritmo ao longo dos próximos anos. “Nosso principal desafio neste ano é crescer novamente 20% e chegar à receita de R$ 120 milhões. Acredito que este novo motor de crescimento vai nos transformar, em cinco anos, em uma companhia na faixa dos R$ 250 a R$ 300 milhões de faturamento, com foco nas verticais de inteligência e comunicação”, avalia o controller Octávio Carradore.
O plano de transformação da Dígitro passa também pelo ambiente das startups. Mas diferente de outras empresas com o mesmo porte, a ideia não é investir em um programa de corporate venture ou simplesmente fazer aquisições. Segundo Octávio, a empresa começou neste ano a fazer um estudo sobre o ecossistema de TI no país para ter, até o fim do primeiro semestre, um programa interno de inovação: “nós sempre fomos orientados pelo que se produzia em Institutos de Ciência de Tecnologia de universidades, mas agora começamos a aprender com as startups e isso está nos exigindo uma aceleração na gestão e também no conhecimento dessa cultura”.
Na última edição do Brazil Cyber Defence Expo, principal evento sobre defesa cibernética do país, uma startup que atua com blockchain procurou a Dígitro, a partir de uma indicação de um general do Exército, para desenvolver em parceria alguma solução de segurança de dados para a Defesa nacional. “As Forças Armadas, que eram tidas como conservadoras, estão provocando as empresas a apresentar novas soluções de inovação. Nós atuamos neste mercado há 20 anos e temos uma forte relação de confiança com o segmento de Defesa. Agora eles estão nos recomendando startups que sequer conhecíamos na área de segurança cibernética”, explica Adriano, que tem conversado com diversos empreendedores e encontrou algumas inovações que podem agregar novidades ao portfólio da empresa, seja em criptografia para comunicação com satélites, tecnologias para transcrição de áudio e vídeo ou drones para monitoramento em presídios.
Como analisa Adriano, “este ecossistema é muito heterogêneo, mas nosso foco é na carteira de clientes. Estamos atualizando nossa concepção de soluções ao mesmo tempo que podemos contribuir com quem domina muito a tecnologia mas falha na operação – algo que falta por exemplo em alguns fundos de investimento anjo e aceleradoras. Um dos nossos ativos, em termos de novos negócios, é ajudar a desenvolver um projeto completo para o mercado com aplicação dessa tecnologia”.
Alguns exemplos catarinenses são o espelho da Dígitro nesse processo de transformação corporativa: “empresas à nossa volta estão dando um ótimo exemplo de reinvenção como a Senior, em Blumenau, e a Softplan, que é nossa parceira. Estamos trocando ideias em comum para aproveitar nossas experiências no ecossistema”, diz Octávio, que tem estudado também casos de insucesso de empresas maduras que passaram por essa fase de mudanças organizacionais.
“Essa é uma evolução cultural muito comum em empresas com a maturidade da Dígitro, que tem quatro, cinco décadas de atuação. Nessa terceira onda de governança corporativa, voltada à inovação, temos preciso entender o novo ecossistema, as startups. É uma outra batida”, completa o controller.
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