Grupo de alunos e professores da UFSC quer transformar ideias em negócios sustentáveis e inovadores voltados para a economia criativa
Transformar o conhecimento produzido na universidade, mas que está restrito a artigos científicos, em projetos que estimulem a sociedade a empreender e inovar. Este é o propósito que transformou um grupo de pesquisadores e alunos dos mais diferentes cursos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) no VIA – Estação Conhecimento, um coletivo que promove e participa de dezenas de cursos, palestras, incubadoras, redes de empreendedorismo, além de visitas a habitats de inovação dentro e fora do Brasil.
Tudo isso aconteceu em pouco mais de um ano. Neste período, o grupo formado por 31 alunos (15 de graduação, 8 de mestrado e 8 de doutorado, além de professores convidados de outras universidades do país) agitou bastante: o VIA gerencia uma pré-incubadora que desenvolve 20 projetos no centro da Capital, representa a Grande Florianópolis da Rede Global de Empreendedorismo da Endeavor na Grande Florianópolis, participa ativamente do Movimento Traços Urbanos (que reúne dezenas de arquitetos dedicados à revitalização urbana) e da Rede de Monitoramento Cidadão de Florianópolis. Além disso, já participou de inúmeros eventos de empreendedorismo, como o Startup Weekend Gov, pioneiro no Brasil para o desenvolvimento de soluções inovadoras para a gestão pública e produziram duas revistas digitais temáticas, uma sobre ambientes de inovação e outra sobre parques tecnológicos.
“Nós éramos um grupo de pesquisa com foco em ambiente de inovação e empreendedorismo. E dividíamos a mesma angústia: escrevemos artigos maravilhosos, a academia adorou, mas o fim é só esse? Como podemos gerar inovação a partir disso? O conhecimento faz todo sentido para a academia mas muitas vezes não é tangível para a sociedade”, lembra Clarissa Stefani Teixeira, professora do programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento da UFSC e uma das responsáveis pela criação do VIA.
Criação, por sinal, sofrida.
O grupo realizou no início de 2016 de diversas oficinas de design thinking, lideradas por um dos alunos, ao longo de mais de um mês. Não faltaram ideias, dúvidas e tensão. Até que vieram os primeiros insights definitivos, como o conceito de “transformar o conhecimento” e surgiu o nome VIA que, para a professora, “não é uma sigla, é um meio, que representa nosso ideal de conexão, um caminho entre o ensino, a pesquisa e a extensão”. A partir daí, o crescimento foi orgânico, estimulado pelo interesse de alunos e professores em criar participar de novos projetos e envolver a comunidade.
Foi como surgiu, por exemplo, o envolvimento do grupo com o Sapiens CoCreation Lab, co-working e pré-incubadora localizado em um prédio no centro histórico de Florianópolis idealizado para desenvolver projetos de economia criativa e revitalização urbana da região. O projeto do CoCreation Lab nasceu em 2015 por meio de um outro laboratório da UFSC, o LOGO, liderado pelo professor Luiz Salomão Ribas Gomez, que se ausentou do país para fazer um pós-doutorado. Com isso, o VIA assumiu o programa da pré-incubadora, que abre novos editais a cada semestre. Hoje, são 20 projetos das duas primeiras turmas – a próxima abrirá ainda neste ano.
“Queríamos um espaço aberto e colaborativo, que tirasse o ranço de ficar fechado em uma salinha, para criar uma rede de colaboração, capaz de transformar ideias em negócios sustentáveis voltados para economia criativa”, explica a professora Clarissa Teixeira.
Os recursos vêm de projetos para custeio de bolsas aos alunos. Alguns aproveitam o período de férias e eventuais viagens internacionais como estudo, para conhecer parques tecnológicos e ambientes de inovação. Em uma dessas viagens, um grupo de alunos foi conhecer as intervenções urbanas e os projetos sociais em Medellín e Bogotá, na Colômbia.
Uma das principais preocupações do grupo é com o nivelamento de informações e a gestão do conhecimento entre os participantes, que são das mais diversas áreas – ciências contábeis, biblioteconomia, jornalismo, relações internacionais, engenharias etc. A orientação é que toda participação em eventos ou projetos gere algum conhecimento a ser compartilhado. “Somos orientados por resultados. Sempre exigimos um produto final, seja um vídeo, um artigo, um infográfico ou uma entrevista. Não fazemos nada que fica apenas com quem participou daquilo”, reforça a professora.
Natural de Caçapava (RS), Clarissa se impressiona com o crescimento e o engajamento de mentores, empreendedores e pesquisadores envolvidos no ecossistema inovador em Santa Catarina: “é incrível o que está acontecendo em várias cidades, como Chapecó e Joinville, por exemplo. Mas todas as incubadoras e mentores do estado estão conectados pelo WhatsApp. O envolvimento é impressionante. Isso fica muito claro quando marcamos visitas para receber delegações de outros estados ou países, se um não pode, envolve outro e sempre estamos disponíveis. Essa conexão é um diferencial nosso”.
Inovação e revitalização urbana
Cada iniciativa do VIA deve ser liderada por um dos alunos envolvidos no programa, que recebe uma bolsa de auxílio. O CoCreation Lab, por exemplo, é o projeto de Maria Carolina Zanini, mestranda em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia. Ela começou a estudar ambientes de inovação em 2015, na USP e de lá foi para a Universidade Federal de Santa Maria (RS) participar da Agência de Inovação local, responsável por montar um programa de pré-incubação. Formada em Relações Internacionais, ela sentiu na graduação a mesma angústia que levou o grupo de professores a criar o VIA: muita teoria e pouca aplicação prática. Quando conheceu o projeto que estava sendo feito em Florianópolis, se mudou para fazer mestrado na UFSC e participar.
À frente do Sapiens CoCreation Lab, Carolina acompanha os 20 projetos aprovados no edital da pré-incubadora, que envolvem soluções inovadoras voltadas para o turismo, energia, moda, arquitetura e urbanismo, entre outras. Além destes projetos, o VIA tem uma participação importante em uma iniciativa de arquitetos da região que buscavam formas de promover a revitalização urbana de regiões como o centro histórico de Florianópolis, que muitos moradores evitam circular e que comparam a uma mini Cracolândia. “Nosso propósito é a qualificação do espaço público, sempre referenciado com o local e as comunidades. A partir disso, montamos vários grupos de trabalho responsáveis por buscar esta qualificação, para criar o que chamamos de distrito criativo”, explica o arquiteto Giovani Bonetti, um dos idealizadores do Movimento Traços Urbanos.
O VIA foi convidado para mediar a primeira oficina do grupo, em pleno feriado da Proclamação da República, à noite. “Com nossa experiência, ajudamos na condução dos grupos, em levar a eles metodologias inovadoras que conseguimos depois implementar. Ajudamos a construir e a dar sequência ao projeto. Foi um desafio para eles e para nós” ressalta Clarissa, que também é uma das curadoras da iniciativa. “Depois da oficina, o VIA abraçou e está completamente dentro do movimento, participando ativamente dos grupos de trabalho e compartilhando as ferramentas de trabalho e gestão”, resume Bonetti.
O futuro, felizmente, é incerto
Após um ano de intensa atividade, alunos e professores do VIA não sabem dizer com certeza onde pretendem chegar com o projeto. O que, para eles, não chega a ser um problema, já que muitos projetos surgiram ao acaso, por oportunidades, convites e conexões. Como define Clarissa: “nascemos com um objetivo e estamos ganhando uma forma de maneira orgânica. O que queremos é trazer essa cultura de empreendedorismo e inovação que se estuda na academia ser aplicável na prática. Que as pessoas que estão de fora e que não conhecem vejam a universidade de outra forma. Não é o fato de falar difícil que te faz relevante. Isso tem que fazer sentido para a sociedade e atrair as pessoas”.
O VIA em (alguns) números:
- 7 cursos realizados
- Mais de 50 publicações (artigos, congressos, livros)
- 7.232 habitats de inovação mapeados
- 219 posts de blog
- 2 revistas temáticas
- Participação/Apoio aos Startup Weekend Women (2016) e Gov (2017)
- Participação no Hackathon #DesenvolveSC
- VIA em Tour em 20 habitats de inovação em seis países: Brasil, Argentina, Espanha, Portugal, Colômbia e China
- Projetos em andamento: Cocreation Lab, Centro Sapiens, Geração VIA etc.
- Conexão com grupos e coletivos: Movimento Traços Urbanos, Rede GLobal de Empreendedorismo Florianópolis, Rede de Monitoramento Cidadão